“A nova (velha) matriz. Por R$ 1,50”, por Carlos Alberto Sardenberg

Acompanhe - 28/01/2016

dinheiro_0*Publicado no jornal O Globo – 28/01/16

Se não for uma frase de Mario Henrique Simonsen, deveria ter sido: “Uma experiência que dá errado várias vezes deve ser repetida até dar certo”. Trata-se de mais uma daquela série de leis que Simonsen foi inventando para caracterizar a burrice brasileira, em particular, e da América Latina, em geral, no manejo das políticas econômicas. Pois está acontecendo outra vez. O governo Dilma reapresenta a “nova (velha) matriz econômica”. As coincidências são notáveis, mas a repetição é bem mixuruca. Em 2012, por exemplo, a presidente Dilma deu uma mexida para valer no setor elétrico e aplicou uma redução de 16% na conta de luz residencial e de 28% para a indústria.

Agora, o máximo que conseguiram foi cortar R$ 1,50 a cada 100kw/h consumidos. E quer saber? Melhor assim. No ano passado, a conta de luz chegou a subir 80% em algumas regiões — 51% na média nacional — para cobrir os buracos causados nos balanços de geradoras e distribuidoras depois daquela baita redução forçada de 2012. Agora, uma derrubadinha de R$ 1,50 não deve causar tanto estrago, não é mesmo? Na política de juros também não tem muito mais o que estragar. No final de 2011, o presidente do BC, Alexandre Tombini, alegou uma piora surpreendente no mundo para iniciar uma forte derrubada da taxa básica de juros. Digamos que foi uma coincidência especial entre essa avaliação e o objetivo que havia sido anunciado por Dilma — chegar a um juro real, descontada a inflação, de 2% ao ano.

Tombini acabava de descobrir que isso era possível. E lá se foi a taxa abaixo, até inéditos 7,25% nominais ao ano, 2% reais, também em 2012, período da queda da conta de luz. E se a tarifa teve de subir de volta — para pagar o rombo do setor — também os juros precisaram voltar escada acima, correndo atrás de uma inflação que disparava. Chegaram a 14,25%, com inflação passando dos 10%. Pois agora em janeiro, Tombini de novo foi surpreendido por um cenário mundial adverso e resolveu suspender a alta de juros que vinha anunciando e aplicando. Não deu para já iniciar a derrubada. Assim, a manutenção da taxa básica em 14,25% — ou seja, o não aumento — foi como o R$ 1,50 de queda na conta de luz. Mesma coisa no quesito concessão de crédito.

Como em 2011/12, o governo Dilma está anunciando a abertura de crédito nos bancos públicos para irrigar alguns setores da economia. Mas se lá atrás a conta era de centenas de bilhões de reais — só o BNDES recebeu R$ 500 bilhões do Tesouro — agora os volumes são quase uma mixaria. O governo fala em R$ 50 bilhões “novos” — de novo, na proporção do R$ 1,50 na conta de luz. Reparem: mesmo quando quer fazer coisa errada, o governo tem pouco espaço. Ele quer voltar aos tempos da “nova (velha) matriz”. Mas topa com enormes limitações — recessão, juros na Lua, inflação idem, rombo nas contas públicas — causadas justamente pela … tal matriz. Simonsen tem razão mais uma vez.

X
28/01/2016