“Jogo de gente grande”, por Fernando Henrique Cardoso

No carnaval passeei com casais amigos por Florença e vizinhanças. Há mais de meio século, eu, minha mulher Ruth, Bento e Lucia Prado e Arthur Giannotti passeáramos pela mesma região com a fascinação da primeira vez e a energia da juventude. Lá, de onde escrevo este artigo, passamos o 31 de dezembro de 1961
Desta vez, com o mesmo deslumbramento, revi o que pude das cidades toscanas. Em 1961 vivíamos o clima da Guerra Fria — russos e americanos se enfrentavam por procuração, como na “crise dos mísseis” em Cuba — e as marcas da guerra quente estavam presentes na Europa bombardeada. Agora, nem mesmo a eventual tensão belicosa que os dias de Trump deixam entrever assusta o Ocidente. A memória se esfuma: passa-se por um ou outro cemitério americano em solo italiano e só os mais velhos, imagino, ainda se lembram do que foi a luta dos Aliados contra o Eixo totalitário. Em poucos brasileiros ressoam os nomes de Monte Cassino e Monte Castello, marcos do heroísmo dos soldados brasileiros.
É bom, entretanto, não esquecer. Desfrutando o gênio de Masaccio ou o colorido e a perspectiva dos afrescos de Ghirlandaio, a poucos passos um do outro na Santa Maria Novella, é bom darmo-nos conta de que o que o passado construiu pode romper-se e não só na arte. Vale a pena recordar que a História é mãe e madrasta ao mesmo tempo. Os sinais do futuro podem não ser do nosso agrado, mas com eles teremos de nos haver.
Clique aqui para ler a íntegra do artigo de FHC no jornal O Globo.