“Muitas gotas de suor a mais”, por Juvenal Araújo
Você provavelmente já ouviu falar que o sol é para todos. De fato, é mesmo. Em alguns locais do mundo, ele bate mais forte, em outros, somente ilumina a ponto de deixar o dia claro, não mudando o tempo frio. Em um país tropical e tão desigual como o nosso, o sol também impacta de maneiras diferentes nas vidas das pessoas. Na lavoura, ele bate intensamente e faz o trabalhador suar. No ar condicionado de um escritório, fica bem mais fácil suportar.
O mesmo, provavelmente, você já ouviu dizer sobre o negro e o branco terem as mesmas condições no Brasil, bastando somente que eles se esforcem para chegar lá. Afinal, o Joaquim Barbosa tornou-se Ministro do STF. Luislinda Valois se tornou desembargadora. E outros negros também que conseguiram se dar bem na vida, apesar de não ser nada fácil criar uma numerosa lista.
Qualquer um pode chegar aos mais postos altos pelo mérito e força de vontade, é verdade. Mas experimente perguntar para os que chegaram sobre as dificuldades que tiveram pelo caminho.
Luislinda e Joaquim Barbosa são gênios, seres humanos acima da média e que se esforçaram muito para alcançar postos tão importantes. Posso afirmar com toda certeza: para o negro no Brasil é tudo muito mais difícil. Luislinda teve que ser mais determinada que seus outros companheiros desembargadores, por muitas vezes tentaram fazê-la desistir. Até mesmo seu professor, enquanto ela criança, lhe sugeriu deixar os estudos para cozinhar para os brancos.
Eu também, em toda a minha vida nos momentos onde sonhei alçar voos maiores, tive também que fazer algo a mais. Para ser reconhecido, trabalhava horas a mais, isso para disputar os mesmos postos de outros não negros. Isso nunca me garantiu melhores condições de trabalho, apenas me permitiu condições de igualdade.
O negro precisa de algumas gotas de suor a mais para ter o mesmo reconhecimento do branco. Precisamos sempre provar algo, mostrar valor, competência e mais vontade. Por quê? Não bastaria fazer o mesmo que os outros? Bastaria, mas o racismo por si só já nos deixa atrás dos não negros, e é assim também nas entrevistas de emprego.
Os números refletem a diferença no tratamento. Para cada pessoa que estudou o mesmo tanto (que tenha concluído uma graduação), um negro recebe 67,58 reais enquanto um branco recebe 100. A média salarial de negros é de R$ 3.777,39, enquanto a dos brancos é de R$ 5589,25, quantia 47% maior. As informações são da pesquisa Características Do Emprego Formal da Relação Anual De Informações Sociais (Rais), divulgada em 2014 pelo Ministério do Trabalho.
A ausência de negros nos cargos de alto escalão das grandes empresas contribui para essa realidade. A nossa cultura ainda divide por raças e é contra isso que lutamos. Para mudar este quadro, contamos com cada vez mais pessoas andando ao nosso lado no Tucanafro, se conscientizando e difundindo os dados sobre o racismo no Brasil.
Mais do que isso, precisamos dessas pessoas se interessando pela política e tendo a compreensão que por meio dela seremos capazes de grandes mudanças. Esta transformação é possível, e se torna mais forte à medida em que acreditamos. Todos sairemos ganhando!
* Juvenal Araújo é presidente nacional do Tucanafro.