João Doria: O Brasil é maior do que Bolsonaro e Lula

Entrevistas - 23/04/2021

Confira alguns dos principais trechos da entrevista do governador de São Paulo aos jornalistas César Felício e Cristiano Romero, do Valor Econômico.

Como o senhor analisa o momento atual da pandemia?
O momento é difícil, de muita cautela, embora tenhamos nas duas últimas semanas obtido melhores resultados em relação à ocupação de leitos primários e de leitos de UTI, o que permitiu sairmos da fase emergencial. Mas ainda a covid exige cuidado e atenção.

No início da crise o senhor imaginava que o país fosse se tornar o epicentro da epidemia mais grave em 100 anos, como chegou a ser?
Já se prenunciava uma crise mais grave quando o presidente Jair Bolsonaro, diante do agravamento da pandemia, dizia que era um resfriadozinho uma gripezinha, algo não importante. Vários ministros dele diziam em março do ano passado que não morreria no Brasil mais de 4 mil pessoas, como se fosse pouco. O resultado é que nós temos 380 mil pessoas mortas no Brasil. Já se apresentava aí um quadro triste de um governo negacionista. Mas não se imaginava que isso se daria de forma tão sórdida, tão distante da proteção à vida. O Brasil se tornou um pária do mundo. Não foi só Bolsonaro, o Brasil se tornou. Sendo o país com o maior número de mortos na média diária e o segundo em número absoluto em mortes, o mundo está fechando as portas para os brasileiros, não só para o governo brasileiro, o que é ainda mais grave.

Por que a vacinação começou só no dia 17 de janeiro?
O Brasil poderia ter começado em novembro. Pela desídia, pela falta de planejamento, pela negação à pandemia e pelos obstáculos criados à vacina do Butantã, só iniciamos no dia 17 de janeiro, mesmo dia em que a Anvisa anunciou a liberação da vacina. A reunião da Anvisa terminou às 15 horas, e iniciamos a vacinação quinze minutos depois de encerrada a reunião. O governo federal finalmente entendeu diante disso que tinha que começar a vacinar e levou uma semana ainda para iniciar, por que não tinha a vacina Astra Zeneca aqui. Importaram às pressas da Índia. As do Butantan estavam prontas desde outubro. O governo negou a vacina do Butantan, na reunião de 21 de outubro do ano passado. Quando o então ministro da Saúde Eduardo Pazuello anunciou a compra de 46 milhões de doses do governo de São Paulo, Bolsonaro disse no dia seguinte, pela manhã, que não permitiria o ingresso dessa vacina. Ele ainda desdenhou, chamou de ‘vachina’. Perdemos outubro, novembro, dezembro e metade do mês de janeiro. Se tivéssemos começado lá atrás, já estaríamos com 60% da população imunizada e salvo milhares de vidas. Um crime cometido contra a população brasileira.

A história vai registrar o protagonismo que o Estado de São Paulo como um todo teve no combate à covid-19. Não surpreende que isso não tenha se convertido em popularidade para o senhor, como apontam diversas pesquisas?
A minha decisão de buscar a vacina não foi para ganhar popularidade. Não estou, com a vacina, em busca de ganhar eleitoralmente vantagens. Não é justo, não é correto, não é adequado. Há a necessidade e o dever de proteger vidas. É estéril este debate. A vacina é para proteger vidas, e não mandatos.

O negacionismo de Bolsonaro se deve ao que, em sua opinião? Razões políticas?
Razões ideológicas e também razões psiquiátricas. Ele deveria ser avaliado por uma junta médica de psiquiatras e psicólogos. Este pensamento tristemente negacionista, que impede de sentir compaixão pelas pessoas…. Isso não é normal, extrapola a questão política. É uma questão de doença, de psicopatia. Nós, nesse momento, temos um presidente da República que é um psicopata. Só não sei avaliar em qual nível, em qual grau. Gostaria muito do parecer da junta médica, para dizer qual é o nível de psicopatia e loucura que tem o presidente do Brasil.

O presidente esticou a corda com os governadores, retardou o processo de vacinação, e de certa forma, tornou necessário medidas de restrição semelhantes ao lockdown, muito antipáticas à população. Isto postura não obrigaria o senhor a mudar seus planos para 2022?
Os meus planos hoje são de fazer boa gestão como governador, priorizando a saúde. É o bom senso de compreender o que é prioridade. Bolsonaro não me esquece, acorda e dorme pensando em mim, é uma obsessão doentia, essa fixação no João Doria e na calça do João Doria, a ‘calça apertada’ do João Doria. Vai ver que ele gosta.

Até o início de março, todos os cenários de 2022 caminhavam para uma polarização entre Bolsonaro de um lado e os candidatos na faixa do centro do outro lado. Com a habilitação de Lula para concorrer, o panorama não mudou? Bolsonaro perde competitividade?
Esta é uma tese. A esta distância da eleição, não é possível uma resposta definitiva. Mas essa tese merece ser avaliada. Hoje, com o ingresso do ex-presidente Lula, abriu-se na verdade um espaço ainda maior, uma avenida democrática para o centro liberal, uma candidatura que possa ser mais agregadora. Você pode construir um projeto amplo de recuperação da saúde, da economia, da proteção ambiental, da proteção social, dos direitos humanos, da imagem internacional, tudo isso com uma visão liberal, de centro. Dialogando, compreendendo o contraditória. Agregando a todas as forças que possam participar da definição de um projeto para o Brasil, deixando a definição de nomes mais para o fim do ano, enquanto isso Lula e Bolsonaro fazem o embate dos extremos.

Neste sentido houve a iniciativa dos candidatos de centro em fazer aquele manifesto. Outros manifestos ainda devem vir? Aquele era em defesa da democracia. Há outras bandeiras que podem empolgar este grupo?
Nós chamamos este grupo de pólo democrático. Ele é composto por Luciano Huck, Luiz Henrique Mandetta, Eduardo Leite, Sergio Moro, Ciro Gomes, João Amoêdo e por mim. Nós nos falamos e dialogamos dentro deste grupo. Estamos dispostos a dar o exemplo de que é possível sublimar diferenças políticas e ideológicas do passado para dar o exemplo a este país, de que é possível fazer política sem ódio, sem embates, sem sermos destrutivos, ao contrario, contribuindo para um projeto e mais adiante ter um nome que possa ser consensuado, pela sua credibilidade e viabilidade, para enfrentar uma duríssima campanha em 2022 contra o Lula e o Bolsonaro.

Nós teremos uma terceira via contagiante, que emocione, que represente a síntese de um povo, e não o fracionamento dele, que impulsione as pessoas, que mostre que o Brasil é maior que Bolsonaro e Lula. Isso é possível, perfeitamente possível.

Leia a ÍNTEGRA da entrevista

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23/04/2021