Raquel Lyra: vamos mudar as comunidades a partir das mulheres; é com elas que vamos conversar primeiro
Em entrevista à revista Marrie Claire, a governadora eleita de Pernambuco, Raquel Lyra, fala sobre sua vida familiar, a campanha mais difícil de sua vida e anuncia que a prioridade de seu governo será chegar em quem é o rosto da fome no Brasil: as mulheres pobres.
Confira alguns trechos:
Quais serão as prioridades de seu governo?
A gente precisa mudar as comunidades a partir das mulheres. Vou construir maternidades, dobrar o número de creches de Pernambuco, como fiz em Caruaru, e promover qualificação profissional para as mães lá dentro. Governar é eleger prioridades, e fiz uma escolha: ter um diálogo reto com as mulheres. Se um lugar vai crescer, é porque estamos cuidando delas e de suas crianças. O rosto da fome é o da mulher de periferia, com filho pequeno. E é com elas que vamos conversar primeiro.
Quais serão as propostas para essa mulher?
Primeiro, vamos abrir o programa Mães de Pernambuco, de auxílio de R$ 300 para mulheres com filhos de 0 a 6 anos e que preenchem os requisitos do Auxílio Brasil. Todos os estudos apontam que a gente garante a formação de uma criança do 0 aos 6, do ponto de vista nutricional, pedagógico, sociológico, de estímulos. Essa criança precisa ter comida. Vamos também fazer um programa de empreendedorismo com foco especial para mulheres, com qualificação profissional e acesso a crédito desburocratizado. Para isso, temos que abrir espaço para cuidar das crianças e vamos abrir 60 mil vagas em creches. Nada mais libertador para uma mulher do que garantir que a sua criança esteja em tempo integral na escola, com cinco refeições garantidas, com vacinação, oculista, dentista. Precisamos agir em várias frentes, e a primeira delas é garantir comida na mesa.
Em 2021, uma mulher foi vítima de feminicídio a cada sete horas no Brasil, em média. O que a senhora fará para enfrentar esse problema?
Repressão qualificada e prevenção social. Uma mulher não é vítima de feminicídio de uma hora para outra. Existe uma trajetória. Precisamos de uma rede de proteção. Fortalecer o enfrentamento à violência, o acolhimento das vítimas, a patrulha Maria da Penha, a aproximação dessas mulheres sob medida protetiva. Precisamos garantir rede de qualificação de todos os servidores e conseguir identificar precocemente essas histórias. Uma criança que falta à escola muitas vezes pode ser porque a mãe está sendo vítima de violência. Quando coloca alertas sobre isso e manda alguém visitar a casa, identificamos a violência precocemente. Vamos descentralizar o atendimento, com delegacias que funcionem 24 horas, sete dias por semana, e oferecer acolhimento multiprofissional. É muito mais fácil asfaltar 50 quilômetros do que tirar uma mulher do ciclo de violência. Vou asfaltar também, mas minha prioridade é cuidar delas.
A senhora já passou por algum episódio de violência de gênero?
Nunca sofri violência física, mas todas as outras pode marcar de cima para baixo que gabaritei. Disseram que meu pai ia mandar na eleição, depois que seria meu marido, me negaram legenda para disputar eleição a três dias de fechar a janela partidária – que foi o que o PSB fez comigo. Duvido que fizessem isso com um homem. Eu pontuava mais de 20% quando me candidatei a prefeita pela primeira vez. Na eleição deste ano, até começar de fato, diziam que eu não seria candidata. Que eu não teria coragem de sair da prefeitura, botaram meu nome em pesquisa para o Senado. Eu ligava para jornalista para perguntar por que eles insistiam em dizer que eu não era candidata. E depois diziam: mas podem ser duas mulheres candidatas? Não é muita mulher, não?
Sua chapa é composta por duas mulheres. Foi ideia sua?
A ideia não foi por ela [a vice, Priscila Krause] ser mulher, mas também por ser mulher. Eu podia ter feito uma aliança, aos olhos da política tradicional, mais fácil. Diziam que a gente tinha o mesmo perfil, duas mulheres brancas, que seria melhor agregar com alguém que trouxesse componente x, y ou z, que fosse arrebatador. Falei que não, que ia fazer do jeito que acredito. Não vale tudo para ganhar eleição.