Os Novos Desafios do PSDB

Notas Oficiais - 09/12/2002

As eleições de 2002 puseram-nos na oposição no plano nacional e à frente do governo em sete estados, além de outros em que fizemos parte da coligação vitoriosa e/ou devemos compor o governo. A nova situação política requer ajustes nas nossas propostas e na nossa forma de atuação. Mais que isso, as transformações estruturais do Brasil, das quais fomos os principais impulsionadores, instigam-nos a rediscutir nosso projeto de país em busca de novos desafios. A clareza da visão estratégica sempre foi um diferencial do PSDB como partido. Atualizar essa visão em sintonia com as novas realidades do Brasil e do mundo é fundamental para garantir a coerência, a pertinência e, em última análise, o êxito das nossas ações, na oposição e no governo, no período que se inicia.

O PSDB como alternativa de poder
Com 71 deputados federais e 12 senadores, além dos 33 milhões de votos do nosso candidato no segundo turno da eleição presidencial, saímos das urnas como uma força congressual de primeira linha e uma alternativa de poder para 2006. Recebemos na eleição nacional um mandato oposicionista que vamos exercer com firmeza, qualificada apenas pelo nosso senso de responsabilidade para com o país.

Fiéis à vontade expressa do eleitorado, seremos rigorosos na cobrança das promessas e na fiscalização das ações do futuro governo. Leais ao Brasil, acima de tudo, seguiremos na defesa das conquistas fundamentais do povo brasileiro pelas quais nos batemos até hoje: a plenitude da democracia; a expressiva redução da pobreza e a promoção da inclusão social; a estabilidade da moeda e a responsabilidade fiscal; a abertura crescente do governo, em todos os níveis, às demandas e à participação organizada da base da sociedade; os fundamentos econômicos, sociais e políticos da integração soberana do nosso país ao mundo globalizado.

A coerência com esses princípios pautará nossas ações no Congresso Nacional e na discussão com a sociedade das políticas do governo.

Como democratas, encaramos a alternância no poder com a tranqüilidade de que é exemplo a transição de governo organizada pelo presidente Fernando Henrique Cardoso. Respeitaremos a legitimidade do mandato do futuro Presidente – não se verão membros do PSDB puxando coro “fora Lula“ sob pretextos fúteis. Não investiremos no impasse entre o Presidente e o Congresso nem na obstrução pura e simples das iniciativas do Executivo. Em contrapartida, exigiremos, com a mesma convicção com que praticamos, respeito à federação, à divisão de poderes, ao devido processo legal e à autonomia dos movimentos sociais, assim como correção e transparência no trato da coisa pública.

Co-responsáveis pelo Plano Real, temos um compromisso inarredável com a estabilidade econômica. Apoiaremos as medidas necessárias para mantê-la, mesmo que circunstancialmente impopulares. Não proporemos benesses insustentáveis para iludir o povo e impor ao governo o ônus de dizer “não“. Com a mesma firmeza, combateremos toda ação ou omissão que ameace os fundamentos da estabilidade ou imponha sacrifícios desproporcionais às camadas mais pobres e vulneráveis da sociedade.

Engajados na democratização efetiva do governo e da própria sociedade, atuaremos para manter e aprofundar os avanços na quantidade e qualidade do gasto social do governo. Propostas que levem adiante a universalização dos serviços essenciais e a focalização do gasto público nos grupos efetivamente mais carentes terão nosso apoio, partam de onde partirem. Da mesma forma, sustentaremos a descentralização administrativa, as parcerias com a sociedade civil, a transparência das informações e o respeito à cidadania, contra qualquer tentativa de instrumentação burocrática, paternalista ou partidária das políticas sociais.

Confiantes no potencial do Brasil diante dos obstáculos e oportunidades da globalização, trabalharemos pelo fortalecimento do consenso interno em torno das posições brasileiras nas arenas de negociação internacional e pelo estreitamento dos laços com nossos vizinhos sul-americanos.

O PSDB no governo
Os sete estados que serão governados pelo PSDB a partir de 2003 somam 46% da população e 52% do PIB brasileiro. Com essa responsabilidade, além da que já compartilhamos com nossos 1.048 prefeitos, não nos limitaremos a fiscalizar, criticar e propor alternativas às políticas do governo federal. O fortalecimento do PSDB perante a sociedade dependerá em larga medida da nossa capacidade de colocar em prática nos planos estadual e local as teses que sustentamos nacionalmente. Para tanto, torna-se indispensável uma ação política coordenada desses segmentos do partido entre si e com a direção partidária.

Do governo federal, não esperamos mais nem menos do que o tratamento correto devido a qualquer governador ou prefeito, de qualquer partido.

Esperamos uma divisão equilibrada dos sacrifícios para manter o ajuste fiscal, de modo que não se desorganizem as finanças da União nem se inviabilizem os estados e municípios. Esse foi o sentido das preocupações já apresentadas pelos governadores do PSDB ao presidente eleito. Os governadores contam com a solidariedade irrestrita do partido, em todos os níveis, para levar a bom termo as negociações em torno dessa pauta.

Sabemos que resta pouco ou nenhum espaço para buscar o equilíbrio fiscal pelo lado das receitas. A reforma tributária não pode aliviar este ou aquele nível de governo ou região à custa dos demais. Nem deve aliviar o setor público à custa de mais aumento da carga tributária total da sociedade. Ela é importante por outra razão: para racionalizar a distribuição da carga tributária, tanto no sentido da eficiência como da eqüidade.

O equilíbrio fiscal duradouro depende de medidas corajosas pelo lado das despesas, preservando os gastos essenciais em políticas sociais, ciência e tecnologia, infra-estrutura e fomento à produção. Entre essas medidas, a mais fundamental e inadiável é a retomada da reforma da previdência, especialmente dos regimes previdenciários dos servidores públicos nos três níveis de governo, cujo desequilíbrio impõe um fardo muito pesado ao conjunto dos contribuintes. O PSDB respaldará as iniciativas de seus governadores e prefeitos para corrigir essas distorções em suas esferas de competência, e espera do novo governo federal propostas condizentes com a extensão e a premência do problema.

A discussão das reformas tributária e previdenciária não deve paralisar, de outra parte, o processo de descentralização das políticas públicas, dando continuidade aos grandes avanços logrados nos últimos anos. Atentos à lição fundamental de Franco Montoro sobre a suplementariedade dos três níveis de governo, trabalharemos para aprofundar e aperfeiçoar o modelo de integração já consagrado pela prática, em que os municípios e estados, nessa ordem, cuidam da execução – especialmente dos programas sociais – e a União da coordenação das ações.

A crise da segurança pública impõe, desde logo, uma articulação cada vez mais estreita entre os novos governos estaduais e o federal. A experiência acumulada nesse setor por muitos de nossos quadros, assim como a responsabilidade pela administração estadual em algumas das áreas urbanas mais assoladas pela criminalidade, aumentam a parcela de responsabilidade do PSDB pela formulação e execução das medidas necessárias, tanto no campo operacional como na revisão da legislação sobre polícias, justiça criminal e sistema penitenciário. Não nos omitiremos diante desse desafio.

Criminalidade não é o único problema crítico nas regiões metropolitanas. Ocupação desordenada do solo, déficit habitacional, precariedade dos transportes de massa, trânsito congestionado, poluição, altos índices de desemprego compõem o quadro das provações cotidianas de milhões de brasileiros que vivem em aglomerações acima de 500.000 habitantes. Para manter uma presença política significativa nessas áreas, o PSDB deve articular seus governadores, prefeitos, quadros técnicos e parlamentares na formulação de propostas de política urbana condizentes com a dimensão dos problemas.

O projeto de país do PSDB
Fomos ponta de lança dos temas “duros“ das reformas empreendidas pelo Brasil nos últimos anos: equilíbrio macroeconômico, ajuste fiscal, abertura comercial, reestruturação industrial, nova articulação de investimentos estatais e privados. Nesse processo, enfrentamos sem hesitação os embates inevitáveis com a oposição às mudanças movida pelo populismo, o estatismo, o corporativismo. Alguns desses temas vão continuar presentes no centro da agenda política: reforma da previdência, elevação da poupança doméstica, integração comercial sustentável, entre outros. O papel de oposição que nos preparamos para assumir plano nacional não implicará – muito ao contrário – a demissão das nossas responsabilidades em relação a essas questões.

Graças, em grande parte, à luta do PSDB, o Brasil conta hoje com aquilo que esteve muito perto de perder no começo da década de 1990: um Estado, um mercado e uma base produtiva capazes de enfrentar os desafios da globalização. Nem tudo é Estado, mercado e produção material, no entanto, no tipo de sociedade que se desenha à nossa frente. Os próprios avanços que impulsionamos permitem avançar mais em relação a outros temas, que são fundamentais para redefinir nosso papel, como partido político, em relação a essa nova sociedade.

Inclusão social e conhecimento – O Brasil deste começo de século XXI enfrenta a imensa tarefa de concluir a erradicação o analfabetismo no sentido estrito e, simultaneamente, atacar a exclusão digital que representa o analfabetismo funcional do futuro. Há um amplo leque de políticas de políticas que o PSDB precisa rever ou formular, de olho nesse desafio: investimentos em ciência e tecnologia; uma estratégia de capacitação em tecnologia da informação condizente com as limitações e vantagens comparativas do Brasil no contexto mundial; penetração do computador nas escolas, começando pelos próprios educadores; acesso e treinamento em TI para os jovens pobres.

Educação de qualidade – Para enfrentar o desafio da inclusão digital, o Brasil precisa consolidar o grande avanço do governo do presidente Fernando Henrique Cardoso que foi a universalização do acesso ao ensino fundamental, continuar ampliando o acesso ao ensino médio e concentrar esforços na elevação da qualidade do ensino em todos os níveis. A universidade – especialmente a universidade pública – tem um papel fundamental nesse processo. O PSDB vai se debruçar sobre uma proposta de reforma do ensino superior que rompa os impasses vigentes sobre escassez de recursos, vantagens funcionais, autonomia de gestão. Em vez de se deter na falta de meios, é preciso que essa discussão ponha foco nas missões da universidade, incluindo com ênfase a formação dos educadores.

Uma nova estratégia de desenvolvimento – O governo do presidente Fernando Henrique Cardoso e várias administrações estaduais e locais do PSDB abriram uma ampla gama de políticas de combate à pobreza e aprenderam a integrá-las com a participação das comunidades locais. O conselho da Comunidade Solidária, ligado à Presidência da República, sistematizou sob o conceito de desenvolvimento local integrado e sustentável – DLIS sua rica experiência de parcerias governo-comunidade nos bolsões de pobreza do país. O PSDB tem a oportunidade de incorporar definitivamente à sua visão o protagonismo das entidades do “terceiro setor“ numa estratégia de desenvolvimento que supere a dicotomia Estado-mercado.

Estes são alguns dos temas que se apresentam ao esforço de repensar nosso projeto de país – esforço que teve início com a elaboração de uma Declaração Programática oferecida pela direção nacional à discussão do partido.

Fizemos muito para mudar para melhor o Brasil desde a fundação do PSDB. O reconhecimento virá, como já veio no crescimento expressivo da votação do partido e no respeito que cerca o presidente Fernando Henrique Cardoso em seu fim de governo. O fortalecimento contínuo do PSDB depende de algo mais: da capacidade de sintonizarmos as aspirações da sociedade brasileira e propor a ela sempre novos caminhos de democracia, desenvolvimento e justiça social no mundo em transformação. Esta é a nossa grande tarefa nos meses e anos à frente.

Comissão Executiva Nacional
Brasília, dezembro de 2002

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09/12/2002