Entrevistas

“O Brasil melhorou, apesar do Mercadante e do PT“, afirma José Aníbal

O presidenciável do PT, Luiz Inácio Lula da Silva, não foi o único a criticar a entrevista que o deputado Aloizio Mercadante (PT-SP) concedeu ao Estado, na semana passada, defendendo a estabilidade e admitindo que o Brasil melhorou. Assim como o candidato petista, mas por outros motivos, o presidente do PSDB, deputado José Aníbal (SP), também não gostou do que leu. “As declarações foram uma farsa“, considera. “O Brasil melhorou, sim, mas apesar do Mercadante e do PT.“

Para o dirigente tucano, de 54 anos, que disputa com Mercadante uma cadeira no Senado, o PT está “todo travestido“ para atrair o eleitor. “Não é uma convicção, é uma conveniência.“ O problema, diz ele, é que o novo discurso de estabilidade e responsabilidade não combina com a atuação do partido no Congresso e nem com o “populismo irresponsável“ dos governos petistas.

Antes de viajar para uma reclusão no feriado, Aníbal falou aos repórteres Silvio Bressan, Vera Rosa e Conrado Corsalette e lembrou que o PT sempre foi contra as teses defendidas agora por Mercadante, como o impacto do salário mínimo na Previdência e a aposentadoria única. “Passamos oito anos dizendo isso e eles votando contra“, lembrou. “O PT pede que se esqueça o que fizeram, mas não dá, porque é o que eles praticam.“ O PT, entretanto, não é seu único alvo. Aníbal também responsabiliza a direita pelos percalços do candidato governista, o senador José Serra (SP). “Existe uma direita no Brasil que não se conforma com a responsabilidade fiscal“, aponta. A seguir a entrevista:

Estado – Mercadante diz que o Brasil melhorou. Isso é um reconhecimento?

José Aníbal – Não acredito. Achei suas declarações ao Estado uma farsa do começo ao fim. Não corresponde à prática do PT, nem no Parlamento, nem nos governos que ocupa. O Brasil melhorou sim, mas apesar do Mercadante, do conservadorismo do PT, da sua posição sistematicamente anti-reforma e anti-responsabilidade fiscal. O escrito não vale? Votaram contra todas as reformas, encaminharam contra a Lei de Responsabilidade Fiscal. A entrevista dele é vazia, porque o que ele diz não se sustenta, não bate com a realidade. Não precisamos agora de transformistas políticos, que em véspera de eleição vêm manifestar uma identidade que eles não têm de fato. São vendedores de ilusão. Tem um PT que está todo travestido para as eleições, mas isso não vai resistir aos debates da campanha.

Estado – Mas ele defende o Banco Central.

Aníbal – Pode ter havido algum reconhecimento, mas foi na medida certa para atrair o eleitor. Não é uma convicção, é uma conveniência. A primeira resposta dele: tomar decisões que reduzam a nossa vulnerabilidade externa e a nossa fragilidade fiscal. Mas se recusaram, durante oito anos, a votar uma reforma previdenciária. Este ano o déficit do setor público em matéria previdenciária é de R$ 56 bilhões. Agora vem falar que o salário mínimo impacta a Previdência. Passamos oito anos dizendo isso e eles votando contra. Agora defende a aposentadoria única. Quantas vezes falamos isso? E eles votando contra. Defenderam os privilégios da aposentadoria pública com unhas e dentes. Se recusaram até a discutir. Depois, ele fala da dívida externa. A dívida externa do Brasil, setor público, era de U$S 104 bilhões em 1995. Hoje é de US$ 111 bilhões. Ela cresceu US$ 7 bilhões. A dívida externa do setor privado é que passou de US$ 50 para US$ 102 bilhões.

Estado – O sr. não acreditou em nada mesmo?

Aníbal – Nada, não tem coerência nenhuma, apenas um propósito exclusivamente eleitoral e demagógico. E o pior: este personagem (Mercadante) enche a boca para dizer que o governo multiplicou por dez a dívida pública interna. Não tem coragem para dizer que a dívida cresceu porque absorvemos 60% desse débito, que era de Estados e municípios. Repactuamos a dívida por 30 anos, com juros adequados e um limite de comprometimento da receita. Sem isso, Estados e municípios estariam quebrados. Aí ele diz que é a favor da responsabilidade fiscal. Que responsabilidade tem um polítco que critica uma ação crucial para o equilíbrio e a responsabilidade fiscal?

Estado – É a versão petista do “esqueçam o que escrevi“ (frase atribuída ao presidente Fernando Henrique Cardoso)?

Aníbal – O presidente sempre assumiu com clareza que, para fazer as reformas que fizemos, fizemos a aliança que fizemos. O PT pede que se esqueça o que fizeram, mas não dá, porque é o que eles praticam. O PT não tem coerência entre o que faz e o que fala. Recuperamos as contas públicas, tiramos todos os esqueletos dos armários, saneamos todo o sistema financeiro… E eles só gritaram por CPIs.

Estado – O Lula também não gostou da entrevista…

Aníbal – É só ler as entrevistas do Lula para ver que é tudo jogo de cena. Agora, vão esconder o Lula. Por quê? Porque solta o Lula e ele fala: Imposto de Renda de 5% a 50%. Isso mostra que o PT no governo seria soma zero, porque as tendências se anulam. É uma somatória de compromissos corporativos, absolutamente inabilitados para reformar o Estado. O PT é o partido mais contraditório, menos coerente da cena política brasileira hoje. É uma colcha de retalhos. Se o PT tivesse ganho em 1994 ou 1998 o Brasil hoje estaria muito pior. Teriam praticado o mesmo populismo irresponsável do presidente (Fernando) de la Rúa, na Argentina.

Estado – Mercadante diz que o PT já governa para 50 milhões de pessoas.

Aníbal – É, mas pelo menos metade desses 50 milhões não quer mais saber do PT. Veja o que está acontecendo em Ribeirão Preto. Em Campinas, a prefeita é vaiada; no Recife, a administração é ruinosa; e no Rio Grande do Sul o próprio PT desaprovou o governo do PT (nas prévias do partido, o governador Olívio Dutra perdeu para o prefeito de Porto Alegre,Tarso Genro). Na Prefeitura de São Paulo, o PT tirou o subsídio de ônibus e reduziu o porcentual de comprometimento da educação de 30% para 25%. Aí dão a desculpa de que vão investir na pré-escola. Conversa. É porque são incompetentes para fazer o ajuste das contas públicas e têm de fazer caixa pegando o dinheiro da educação. Esta é a verdade, meu Deus do céu! Querem fazer o governo deles de vitrine. Mas que vitrine? É um monte de vidraças!

Estado – Como o sr. está vendo a aproximação de Lula com Orestes Quércia (PMDB)?

Aníbal – No PT hoje vale tudo para tentar ganhar.

Estado – Mas o PSDB não quer a mesma aliança?

Aníbal – Sim, mas o PSDB nunca dissimulou. Sempre trabalhamos para a maior convergência possível. Quantas concessões tivemos de fazer, mas criamos uma condição de governabilidade que esse governo nunca teve.

Estado – Quércia é uma concessão necessária?

Aníbal – O Quércia é do PMDB e a maioria do PMDB nacional quer coligar com o Serra. Esperamos que essa convergência seja ampla e irrestrita. É com o partido, não com pessoas. Precisamos buscar o PMDB inteiro para que o partido se sinta representado por inteiro. Temos muito claro que o fundamental é manter o Brasil e São Paulo no rumo. Não é andar de lado, nem para trás.

Estado – O sr. critica a incoerência do PT, mas as críticas do candidato governista ao governo são coerentes?

Aníbal – Serra já deixou claro seu compromisso com a estabilidade. Agora a discussão é em torno de políticas. E, às vezes, você diverge aqui e acolá. Serra acha que já poderia ter havido uma redução maior nos juros. Eu também acho. O governador de São Paulo também.

Estado – Todos defendem juros menores e os discursos estão muito parecidos.

Aníbal – Os diagnósticos são parecidos porque você compra até pela internet. É sintomático. Serra diz que vai triplicar o efetivo da Polícia Federal e os outros começam a dizer a mesma coisa. Tem muita clonagem de propostas, mas nosso candidato tem a capacidade de convergência, o que permite continuar com reformas e criando uma situação de crescimento sustentado.

Estado – Mas a taxa de desemprego continua muito alta?

Aníbal – De fato, temos uma taxa alta de desemprego e um déficit alto em conta corrente. Hoje conhecemos a situação. Quando assumimos o governo as contas públicas estavam desorganizadas, havia muito mais exclusão social e uma grande dissimulação, por conta da inflação. Foi preciso uma mudança cultural que não está concluída. A proposta de Serra é resgatar o equilíbrio macro-econômico com uma política de comércio exterior forte. Com isso você reduz o déficit em conta corrente e a taxa de juros. Temos também de estimular a inovação tecnológica e ir atrás de mercados novos.

Estado – Esse discurso do Serra não está muito economicista? Não falta emoção?

Aníbal – A emoção que colocamos é o que já estamos fazendo: uma rede de proteção social, que faz com que apareça no jornal a foto de um pai com os dois filhos e ele diz que, às vezes, só tem o dinheiro dos meninos, o dinheiro da bolsa-escola. É para isso que estamos reformando o Estado: produzir serviços com qualidade para a maioria. A partir da estabilidade das contas públicas, estamos aumentado o investimento social de forma responsável. Esse é o grande desafio. E não é com o gogó petista que se resove.

Estado – Ainda assim, a candidatura Serra parece não sair do lugar.

Aníbal – Há uma recusa forte de vários setores em admitir que o PSDB não tem do que se envergonhar. Por isso, nas últimas semanas houve um bombardeio infernal em cima do Serra. Procuram associá-lo a situações não transparentes, numa somatória de leviandades. Falam do Ricardo Sérgio (ex-diretor do Banco do Brasil), mas o Serra não tem relação nenhuma com ele. O próprio Ricardo Sérgio abriu seu sigilo bancário, mas o assunto continua rendendo.

Estado – O sr. atribui isso aos partidos de esquerda?

Aníbal – Não é só a esquerda. Existe uma direita no Brasil que não se conforma com a responsabilidade fiscal, setores empresariais, mídia… O alcóolatra pode parar de beber, mas se você facilitar ele retoma. Há uma certa dificuldade em admitir certas coisas e a mídia acaba repercutindo isso, mas não vão criar constrangimentos. O senador é um homem honrado, com 40 anos de vida pública, patrimônio certo e sabido.

Estado – Mas também há rumores sobre dossiês do governo de São Paulo e da Polícia Federal sobre as prefeituras do PT.

Aníbal – Conversa fiada. Querem se fazer de vítima, mas quem vitima o PT é o próprio PT. E nem precisaria dossiês. Os problemas das prefeituras petistas são visíveis, basta olhar as pesquisas de opinião. Eles dizem que as denúncias com relação ao PT são apuradas. Tem várias que não são e você não vê o PSDB operando em cima disso. Até nos cobram porque não repercutimos as denúncias contra o PT. Não operamos isso, não fazemos política assim, não está no nosso DNA. Ganhamos eleições com ação positiva. Dizem até que somos ruins de propaganda. Propaganda fantasiosa não fizemos mesmo.


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28/04/2014