A realidade que Lula não quer ver
Lula corre o risco de amargar mais uma derrota eleitoral no ano que vem, por atacar genericamente tudo que se fez até aqui nos dois períodos do governo FHC, criticando exatamente um ponto que a sociedade brasileira, em sua maioria, considera vitória expressiva, ou seja, a privatização das telecomunicações. Essa é a opinião de do ex-ministro Luiz Carlos Mendonça de Barros sobre as recentes declarações de Luiz Inácio Lula da Silva, ao comparar todas as privatizações a um estupro.
Imagine, leitor, que um dos exemplos negativos citados por Lula foi exatamente a privatização das telecomunicações, ou seja, aquela que – ao contrário do ocorrido no setor elétrico – produziu resultados concretos incomuns, permitindo ao País dobrar em apenas três anos a infra-estrutura de telefonia fixa brasileira e quintuplicar o número de assinantes celulares.
Quantifiquemos. Nos 36 meses decorridos da privatização da Telebrás, o número de telefones fixos no Brasil passou de 19 milhões para 43 milhões (126% de crescimento). A rede de celulares saltou de 5 milhões para 26 milhões de assinantes (420% de expansão). Os investimentos privados feitos no setor equivalem a cinco vezes o total que o País investiu nos 30 anos anteriores à privatização. Sem falar na democratização do telefone fixo, já que mais de 60% dos beneficiados com a instalação das 24 milhões de novas linhas telefônicas de 1998 para cá foram as classes C, D e E.
US$ 100 bilhões – Lula ainda questiona o valor de privatização da Telebrás, dizendo que a holding foi vendida por “apenas“ US$ 19 bilhões, lembrando que Sérgio Motta tinha avaliado a empresa em mais de US$ 40 bilhões. Na verdade, o preço pago pelos vencedores do leilão da privatização se referia a apenas 19% do capital total, ou seja, à fatia representativa do controle acionário até então em mãos do governo. Essa fatia foi avaliada em pouco mais de US$ 9 bilhões pelas consultorias contratadas.
O governo elevou esse mínimo para US$ 13 bilhões e acabou obtendo no leilãoo equivalente a US$ 19 bilhões (na época, R$ 22,62 bilhões), ou seja, um ágio de 62%. Para que não paire dúvida: o governo vendeu apenas 19% do capital total da Telebrás por US$ 19 bilhões. Logo, por uma regra de três simples chegaremos ao preço real de venda da Telebrás: US$ 100 bilhões.
Eis aí o quadro que o líder petista teima em negar ou não quer ver. E não é por desinformação, pois ele tem tido diversas oportunidades de conhecer os resultados efetivos da privatização das telecomunicações. Seria inconcebível que o monopólio estatal da Telebrás – que não permitiu que o telefone chegasse a mais de 21% dos domicílios brasileiros (contra 52% hoje) – agradasse mais a críticos tão parciais do novo cenário privatizado.
Curiosamente, diante de auditórios radicais, Lula baixa o nível de seu discurso e volta a assustar a classe média, na ilusão de que suas palavras fiquem circunscritas a esses ambientes. É nessas ocasiões que acaba violentando a verdade dos fatos.
Saudade do quê? – O povo, no entanto, é bem mais inteligente do que se pensa. Nesse caso, negar a realidade dos fatos pode ser contraproducente para Lula, afastando-o ainda mais dos cidadãos de classe média que, por mais insatisfeitos que estejam com o governo FHC, recusam o retrocesso aos tempos da Telebrás. E, pensando bem, mesmo para o candidato do PT à Presidência da República seria estranho defender o quadro vigente nos tempos do monopólio estatal.
Confira, leitor:
Uma linha telefônica residencial fixa poderia ainda estar custando R$ 1.117, como no início de 1997 (equivalentes na época a US$ 1.000) em lugar dos R$ 50 atuais.
Crescendo ao ritmo da Telebrás, o Brasil teria hoje no máximo 24 milhões de telefones fixos, ou seja, pouco mais da metade da rede atual. A teledensidade do País não passaria de 13 linhas telefônicas por 100 habitantes, em lugar das 26 atuais.
Sem a duplicação da rede telefônica, o País dificilmente poderia ter os atuais 12 milhões de usuários da Internet. E Web grátis seria algo impensável.
Nem do ponto de vista da criação de empregos, Lula poderia preferir a situação anterior, porque, embora a privatização tenha reduzido o número de empregos nas quatro maiores concessionárias, o número de lugares de trabalho dobrou nos últimos 36 meses, passando de 145 mil para 310 mil, sem incluir aí os empregos indiretos gerados no setor.
Diante desse quadro, como falar em estupro?