Bolsa-Escola só para quem precisa

Notícias - 01/10/2001

Segunda-feira passada, dia 24, esta Folha publicou denúncias de fraude na seleção da clientela do Programa Federal Bolsa-Escola. As denúncias envolviam três municípios, dos quais dois já estavam sendo investigados antes que a Folha publicasse as denúncias.

Lançado em fevereiro deste ano e sancionado pelo presidente Fernando Henrique Cardoso em abril, o Programa Bolsa-Escola tornou-se o maior programa de distribuição de renda da história deste país: são R$ 2 bilhões por ano, beneficiando 5,8 milhões de famílias e 10,7 milhões de crianças.

Essas quase 6 milhões de famílias em situação de carência, que inicialmente não passavam de um número nas estatísticas, tiveram de ser individualmente localizadas, avaliadas e cadastradas em milhares de municípios do país. Para realizarmos essa tarefa em tempo hábil, isto é, para que as crianças continuassem na escola já neste ano, recorremos a parcerias com as prefeituras.

Neste, como em outros de seus programas, o Ministério da Educação procura descentralizar a execução de recursos federais, reforçar a autonomia do município e a participação social. Os recursos do Bolsa-Escola não passam por nenhum intermediário. Vão diretamente para o beneficiário final -no caso, as mães. A lei determina que todo o processo de acompanhamento e supervisão do programa seja feito por intermédio de um conselho municipal de educação já estabelecido ou criado para esse fim.

Essa estratégia já mostrou resultados positivos. Em maio, foram homologados 43 municípios. E, depois de quatro meses, temos 3.164 municípios dentro do programa -outros 1.266 estão com processos em andamento no ministério e mais 291 estão com cadastros de famílias no sistema de informações da Caixa Econômica Federal. Dos 840 municípios que ainda não enviaram documentação nem cadastros, um número considerável já mostrou interesse em participar.

Esses números mostram que a quase totalidade dos prefeitos brasileiros entendeu a filosofia do Programa Federal Bolsa-Escola e seu objetivo maior: garantir a presença na escola de todas as crianças com idades de 6 a 15 anos.

É importante que tenhamos pessoas como o vereador Otto Barroso, responsável pela denúncia de fraude no município de Juatuba (MG). O aumento da participação social nas deliberações públicas significa a radicalização da democracia. Certamente surgirão pessoas, atentas como ele, capazes de identificar problemas e denunciá-los, para que possamos solucionar rapidamente, sem beneficiar quem não precisa.

Sabíamos que distorções poderiam ocorrer. Desde julho, o Ministério da Educação vem investigando denúncias de irregularidades na destinação de recursos. Trezentas denúncias chegaram, por meio do telefone 0800-616161, e estão sendo apuradas. Em 30% dos casos, há falta de informação. O maior número de casos é de prefeituras que só cadastram alunos da rede municipal de ensino, apesar de o Bolsa-Escola Federal ser para todas as crianças de 6 a 15 anos que frequentam o ensino fundamental.

Imediatamente após receber uma denúncia formalizada, determinamos o deslocamento de técnicos para investigar. Se há suspeita grave, o primeiro ato é a suspensão temporária do pagamento dos benefícios. Comprovada a irregularidade, determina-se a imediata suspensão dos benefícios, adotando os procedimentos para a recuperação dos valores pagos indevidamente, aplicando multa aos responsáveis ou encaminhando o caso ao Ministério Público.

Entre as penalidades estão a inscrição do município no Cadin (cadastro informativo de créditos não-quitados do setor público federal) e o enquadramento na Lei de Responsabilidade Fiscal, com as penalidades decorrentes. O mais eficaz, porém, é um dispositivo previsto na lei do Bolsa-Escola e presente na lei municipal: o governo federal pode suspender repasses do Fundo de Participação dos Municípios ou do Fundo de Participação dos Estados e do Distrito Federal.

A responsabilidade não será cobrada diretamente da pessoa beneficiada (a mãe ou responsável pela criança), mas do prefeito, o qual, assinando o termo de adesão, se compromete em responder e reembolsar a União nos casos de irregularidades. Conforme o decreto nº 3.813, de 28 de maio de 2001, todos os processos de adesão de municípios ao Bolsa-Escola Federal são auditados quanto ao cadastramento de famílias, homologação dos termos de adesão e concessão dos benefícios. Até o momento, a Secretaria do Bolsa-Escola Federal tem 550 processos em auditoria.

Muitos prefeitos e suas administrações têm feito um enorme esforço para identificar e cadastrar eticamente as pessoas realmente necessitadas. A tarefa não é fácil nem simples. Por isso disponibilizamos técnicos para prefeituras que encontrem dificuldades em atender as exigências do programa.

Não deixaremos de punir os responsáveis por irregularidades, pois lidamos com o futuro das nossas crianças mais necessitadas. E não vamos deixar de cumprir com a responsabilidade perante milhões de famílias que, com o Bolsa-Escola Federal, têm a chance e a esperança de dias melhores para seus filhos.

_______________________________________________________________________________________

Paulo Renato Souza, 55, economista, é ministro da Educação. Foi reitor da Unicamp de 1986 a 1990 e secretário da Educação do Estado de São Paulo (governo Montoro).

X
01/10/2001