Ciência e tecnologia têm de estar sempre em pauta
O presidente Fernando Henrique Cardoso deve enviar ao Congresso Nacional, na próxima semana, o projeto de lei que regulamenta a criação de quatro fundos setoriais de pesquisa científica. A partir de janeiro do próximo ano, o Brasil contará com 12 desses fundos que, pela primeira vez na história do país, terão uma fonte estável para ampliar o volume de recursos destinados à ciência e tecnologia, soma que deve totalizar R$ 1,8 bilhão, segundo o presidente da República.
Mais que bem-vinda, a iniciativa é extremamente necessária. Os investimentos feitos pelo governo, universidades e empresas nessa área no Brasil este ano, devem ser pouco superiores ao equivalente a 1% do Produto Interno Bruto (PIB).
A quantia é extremamente modesta se comparada à aplicada por nações industrializadas e por algumas em desenvolvimento, como a Coréia do Sul, que, nos últimos anos, tem avançado com rapidez nesse terreno graças à alocação de recursos em educação, pesquisa e desenvolvimento.
A evolução científica, de fato, é um dos mais importantes insumos para o desenvolvimento econômico e para o bem-estar social. Ciência e tecnologia, como lembrou o ministro Ronaldo Sardenberg, responsável pela área, em entrevista ao Valor esta semana, representam, hoje, o principal fator de agregação de valor à produção, algo de que o Brasil precisa extraordinariamente, entre outras coisas, para dar impulso às suas exportações competindo com outros países emergentes, mas extremamente agressivos, como a Coréia do Sul, para citar apenas um exemplo.
Dada a velocidade do avanço dessas áreas em todo o mundo, acertar o passo com seu desenvolvimento e atualização pode representar, no mínimo, não aprofundar os efeitos do que o presidente Fernando Henrique Cardoso chamou de “globalização assimétrica“ durante a Conferência Nacional de Ciência, Tecnologia e Inovação que se encerra amanhã em Brasília.
O encontro está reunindo cientistas, empresários e representantes do governo com o objetivo de definir os projetos prioritários no âmbito da pesquisa científica no país na próxima década. E está dedicando especial atenção a uma questão crucial para a produção da ciência e tecnologia no Brasil: os modestos investimentos realizados pelas empresas locais, um dos motivos do atraso do país no setor.
Estima-se que as empresas locais respondem por 40% dos gastos com pesquisa e desenvolvimento de produtos. Nos Estados Unidos, além de essa participação ser de 67%, as companhias contam com cientistas em seu quadro de funcionários. Inverter a proporção de investimentos oficiais e privados nessa equação é algo fundamental para o Brasil.
Primeiro, por conta da crônica falta de recursos governamentais. Segundo, pela conhecida e comprovada eficiência constatada a partir da soma de esforços entre a produção de conhecimento e o capital. Essa parceria pode alavancar desenvolvimento e, muitas vezes, resultar no registro de patentes comerciais, capazes de remunerar o investimento realizado na pesquisa e melhoria de produtos – e, possivelmente, alimentar esse circuito.
O Brasil tem exemplos do que essa união de esforços é capaz de fazer. Anos de investimentos governamentais transformaram a Embraer e a Petrobras em ilhas de excelência e referência em suas respectivas áreas. É possível fazer o mesmo com o aporte da iniciativa privada.
O governo está discutindo a reativação de mecanismos de incentivo fiscal para companhias que investirem em pesquisa. Algum estímulo, sem dúvida, é necessário. Mas há que se cuidar para que uma boa idéia não se transforme em um novo sorvedouro dos parcos recursos públicos existentes. Assim como estabelecer prioridades.
Acertadamente, o governo inclui, ao lado das áreas de agronegócios, saúde e aeronáutica o setor de biotecnologia. Estima-se em US$ 2 trilhões o valor patrimonial da biodiversidade brasileira, uma riqueza que exige o cuidado da ciência e pode ser multiplicada pelo desenvolvimento da tecnologia, mas tem sido explorada na clandestinidade.