“Conjuntura difícil exige governo ousado”, artigo de Lúcia Vânia
Parlamentar comenta a necessidade de haver, no Brasil, políticas arranjadas para estimular crescimento industrial
Artigo da senadora Lúcia Vânia (PSDB-GO) publicado na edição de segunda-feira (23) do jornal Diário da Manhã
A conjuntura mundial apresenta-se com uma situação de grande risco para o Brasil. A estagnação europeia é até uma boa notícia frente aos enormes riscos de crise bancária, que está envolvida nas crises fiscais de vários países, com rebatimento sobre os ativos bancários.
Os Estados Unidos seguem numa correta mudança estrutural, apoiada numa nova política industrial, mas que não deve render muito, em termos de crescimento, no curto prazo.
As economias asiáticas não têm o mesmo fôlego do pós-crise de 2008 para funcionar como mola propulsora da recuperação. Ou seja, a hipótese mais otimista é de que o mundo continue quase estagnado no próximo par de anos. Já a pessimista aponta o risco de uma crise de grandes proporções, nucleada nos problemas do Euro.
A política econômica brasileira tem agido contra a crise por meio de diversas medidas, mas as reiteradas quedas da expectativa de evolução do PIB, em 2012, denunciam que a efetividade das medidas parece não estar à altura do tamanho do problema.
Derrubar a taxa de juros é correto. A taxa de juros brasileira passou todo o governo Lula num patamar altíssimo sem a menor necessidade. Evidentemente que no segundo governo FHC ela era mais alta ainda, o que se explica pelas agudas crises havidas na periferia emergente do sistema: primeiro, a Rússia, depois, o sudeste asiático. Logo após, a Argentina, não tão emergente. Por fim, em 2002, a crise de confiança nos contratos, derivada da postura historicamente adotada pelos petistas.
Só que a derrubada da taxa, embora correta, não poderia, no momento em que a medida foi tomada, resultar em efeitos mais eloquentes sobre a economia. Caminhamos, sim, para um PIB medíocre e não será a mudança tardia na taxa de juros que nos salvará. Aliás, enquanto o Brasil prevê crescimento de 2%, a média da América Latina situa-se em 3%.
De outro lado, o governo requenta a política de redução de impostos para ativar o consumo interno. Sempre é bem-vinda a redução, porque a carga tributária brasileira é, sabidamente, excessiva. Mas o caso recente dos automóveis demonstra que o alcance é limitado. Junto com a redução do preço do automóvel, os proprietários de veículos viram a queda de preço dos usados, com a depreciação de seu patrimônio.
Nossa indústria vai mal. A produção da indústria de transformação caiu 1,1%, em maio, na comparação com abril, descontadas as sazonalidades. Mas, comparando os cinco primeiros meses do ano com o mesmo período de 2011, a situação é muito pior, com redução de nada menos que 3,7%. Bens de capital e bens de consumo durável, que têm os maiores impactos sobre a cadeia produtiva, e sobre a geração de rendas, são os setores mais prejudicados com quedas de mais que 10%.
É verdade que o Real desvalorizado produz alguns impactos positivos sobre o nível de atividade de nossa indústria. A concorrência dos importados com a produção nacional passa a ser menos desleal, por um lado. Por outro, as exportações passam a ter preços em Reais mais remuneradores aos nossos produtores.
Cabe lembrar que as dificuldades da concorrência com os importados vão muito além do câmbio e devem ser buscadas no sistema tributário, na ineficiência logística e nos preços de insumos básicos, como a energia elétrica.
As exportações são as maiores beneficiárias de um câmbio mais desvalorizado, mas o impacto também não é tão rápido.
Vale dizer que a crise de 2012 não é a crise de 2008. E os remédios não poderão ser os mesmos. Não vai bastar um ajuste temporário de carga tributária. Não haverá o mesmo efeito que antes numa expansão indiscriminada do crédito público. Não vai continuar explodindo a dívida pública com operações para o BNDES.
O que se deve cobrar do governo neste momento difícil é que enfrente os problemas com medidas estruturais.
É evidente que o PAC não consegue dar conta de nosso atraso na infraestrutura. Não há como manter os preços da energia elétrica num dos mais altos patamares do globo. Não há como continuar com um sistema tributário tão antiprodução.
A crise mundial vai impor ao Brasil o amadurecimento. Depende de nós o quanto de dor será imposta à população. E como aos mais fracos sempre são impostas as maiores perdas, é bom que as mudanças comecem logo.
*Lúcia Vânia é Senadora (PSDB) e jornalista