Discurso do Líder Aécio Neves, por ocasião do lançamento de sua candidatura à Presidência da Câmara dos Deputados

Notícias - 14/02/2001

Companheiros do PSDB, senhoras e senhores.

Estou há 14 anos nesta Casa, mas sob o mandato do destino tenho vivido desde cedo, no convívio diário da vida pública. Entendi logo que o serviço à pátria exige sacrifício, convoca incompreensões e fustiga a alma com emoções pesadas. Porém, nada pode ser mais recompensador do que a consciência do dever cumprido.

Essa recompensa se eleva nesta hora em que recebo dos meus pares a delegação para representá-los nesta importante etapa de nossa vida partidária e parlamentar. Quero neste instante evocar alguns ensinamentos que a vida me proporcionou. Meus avós Tristão da Cunha e Tancredo Neves e meu pai Aécio Cunha, em momentos diferentes e por longos períodos, serviram a esta Casa.

Embora houvesse entre eles diferenças de temperamento e de biografia, em todos houve a mesma disposição de servir, a mesma postura ética, o mesmo amor ao nosso País. E é importante registrar: o mesmo respeito sagrado à democracia representativa, à instituição parlamentar. Foi assim que comecei a conhecer esta Casa.

Esse mesmo respeito, eu o vi em outros eminentes contemporâneos, como Teotônio Vilela, que não se curvou à doença, soube subjugá-la com sua vontade férrea na pregação democrática e dominou a agonia, para transformá-la na proclamação da vida, no chamado para a luta.

Eu o vi em Ulysses Guimarães, a quem a Nação será sempre devedora. A forte imagem de Ulysses é a do pregador enfrentando os cães na via pública; é a do incansável navegador entre as tempestades, a do incontestável líder de líderes.

Eu o vi também na exemplar figura do mais eminente dos fundadores do PSDB, o Governador Franco Montoro. E vejo ainda hoje nos exemplos de ética e coragem do Governador Mário Covas, cujo convívio na Assembléia Constituinte me permitiu compreender ainda melhor a dimensão e a grandeza desta Casa. Reúno nestes nomes a minha reverência a tantos que lutaram e a outros que permanecem em pleno combate pela Nação.

Neste momento em que é imperiosa a necessidade de aprimoramento das nossas instituições democráticas, é necessário repensar o processo de fortalecimento da Câmara dos Deputados, de forma a resgatar a sua missão catalisadora do debate dos grandes temas nacionais que interessam diretamente à cidadania.

Devo reconhecer e ressaltar, porém, o esforço da atual direção desta Casa e especialmente do seu Presidente, meu amigo, Deputado Michel Temer, na busca permanente da valorização de nossa Instituição. Algumas de suas iniciativas já são conquistas definitivas do Parlamento Brasileiro. Como ele mesmo diz “é preciso continuar avançando“, é preciso continuar aprimorando.

Esse aprimoramento do Poder Legislativo exige a renovação de posturas de cada um de nós, de maneira a transmitir à sociedade a certeza de que, ao expressar as aspirações coletivas, a Câmara saberá fazê-lo com transparência e seriedade.

Ao indicar o meu nome como candidato à Presidência da Câmara dos Deputados, o PSDB traçou as linhas fundamentais que servirão para nortear o trabalho da futura mesa diretora desta Casa, cuja composição deverá respeitar a pluralidade da representação partidária.

Quero reafirmar essas diretrizes e fazer delas o compromisso de uma ação, que irá identificar a agenda das aspirações nacionais, transformando o plenário da Câmara na mais elevada tribuna para a discussão daqueles temas que realmente interessam aos brasileiros, identificando-se, então, a solução legislativa aplicável em cada caso. A sociedade, somente ela é quem deverá pautar esta Casa e estabelecer sua agenda.

Aberta às aspirações nacionais, a Presidência proporá a criação de uma Comissão Permanente de Petições nos moldes do que se fez no Parlamento Europeu, com o objetivo de receber e analisar todas as sugestões que nos forem encaminhadas pela sociedade civil, podendo se transformar em projetos de lei a serem submetidos à apreciação parlamentar.

Nossa missão será a de aperfeiçoar os mecanismos de comunicação entre a Câmara e a sociedade, de modo a aumentar a transparência do nosso Poder. Receber e processar seriamente as propostas populares na Comissão de Petições é uma face desse processo. A outra, é dar a conhecer à sociedade os debates e trabalhos da Câmara e de seus parlamentares individualmente. Regionalizar a cobertura da TV e Rádio Câmara será também um instrumento de aproximação desta Casa com seus representados. Limitar a criação das comissões especiais como forma de valorização das Comissões Permanentes e do processo legislativo é uma prioridade que desde já antecipo.

A Presidência proporá medidas destinadas a assegurar e aperfeiçoar o processo de fiscalização do Legislativo na execução do Orçamento, dotando a Casa dos instrumentos para o acompanhamento parlamentar da ação do Poder Executivo. A Presidência defenderá alterações legislativas de reestruturação do Tribunal de Contas da União, de forma a que essa instituição volte a ser o efetivo “braço fiscalizador“ do Legislativo e da sociedade, capaz de inibir as mazelas que ainda ocorrem quando da execução do Orçamento.

Nosso objetivo é dar continuidade e avançar no esforço de transformar a Câmara dos Deputados no poder que se afirma pela transparência de sua atuação, que se fortalece ao expressar as reais aspirações da cidadania e que será respeitado por sua capacidade, cada vez maior, de zelar pela ética e pelo decoro de todos os seus integrantes.

E, nesse contexto, estará inserido o nosso compromisso de defender com todo o vigor necessário a instituição parlamentar, na compreensão de que o Poder Legislativo é o mais importante instrumento para o aprimoramento da Democracia.

A administração que nos propomos fazer, ao lado da nova Mesa Diretora, deverá ter a norteá-la a compreensão de que é a pluralidade desta Casa que faz a sua força e, por isso mesmo, haverá de ser compartilhada por todos que aqui chegaram, independentemente de suas regiões, de suas convicções doutrinárias ou de eventual notoriedade.

Essa postulação que o PSDB apresenta à Casa tem a sustentá-la a prerrogativa regimental tradicionalmente respeitada pela instituição, que garante à maior bancada a indicação do seu Presidente. Porém, mais do que isso, pertenço a um partido que tem projetos, que assumiu graves compromissos com a Nação.

Esses compromissos, que fazem parte do nosso programa partidário, são os de defender a igualdade de oportunidades para todos os brasileiros, lutar pelo desenvolvimento econômico, manter a integridade territorial e a soberania política do País.

Com eles eu me identifiquei sempre, e tenho procurado, em minha atuação parlamentar, que eles se efetivem na ação do Governo. Mas é também compromisso estatutário dos partidos políticos a defesa das instituições do Estado, tal como elas são definidas pela história e pela Constituição.

O Parlamento é a mais alta esfera da soberania popular. Em um Estado democrático, ele é a fonte legitimadora de todos os poderes. Não tem outros limites, que não sejam os da Constituição, na defesa da liberdade e da realização integral dos homens. Mas, como em todas a empresas humanas, os direitos soberanos do povo, dos quais o Parlamento é portador, não se exercem senão com a intransigente determinação dos seus representantes.

Senhoras e senhores,
A vida pública deve ser, e sempre, a combinação dos impulsos da emoção com os mandamentos da razão. A emoção de servir e o legítimo desejo do exercício do poder empurram-nos para as disputas eleitorais, mas o cumprimento dos mandatos recomenda a fria obediência aos textos normativos, o controle dos sentimentos, a conduta ética irrepreensível.

Em suma, o nosso projeto é o de recuperar, para a Câmara dos Deputados, a imagem de um poder afirmativo, porque afirmativo é o povo que representa; de um poder austero, porque sacrificada é a vida do povo; de um poder criativo, porque criativa é a nossa gente; de um poder soberano, para que soberana seja a Nação.

O Parlamento não existe para impor a sua própria vontade aos outros poderes, mas para aferir e assumir a vontade da comunidade nacional, a fim de exigir o seu cumprimento ao Estado como um todo. Este é o meu compromisso, e sei que ele atende também ao espírito democrático e patriótico de nosso partido. Somos, e devemos reafirmar isso, um partido social democrata.

A Social Democracia é a democracia social, ou seja, aquela que vai encontrar na origem desse definitivo ideal republicano o seu programa: o de buscar a plena igualdade dos homens, conferindo-lhes o mais alto título de realização em uma sociedade política, o de cidadãos, condôminos dos bens da Pátria e de seu futuro. Sei que desse mesmo projeto de Nação participam vários outros partidos, como entidades doutrinárias, e parlamentares de todas as demais agremiações políticas nacionais.

A partir desse instante, procurarei, como candidato à Presidência da Câmara dos Deputados, indicado pelo partido majoritário desta Casa, cada um dos demais partidos políticos que aqui estão representados e cada parlamentar individualmente, para juntos discutirmos e elaborarmos uma proposta de gestão em que a ética, a agilidade do processo legislativo e a valorização do mandato parlamentar sejam a base para o reencontro definitivo desta Casa com a sociedade que representa. Em duas semanas esta proposta detalhada será apresentada para avaliação dos senhores parlamentares.

Senhoras e senhores, companheiros de partido,
Encaro esta indicação com a humildade de quem se reconhece intérprete do amadurecimento político do PSDB. De quem não se julga com o direito divino à unção pura e simples.
Sigo Ortega y Gasset: “Nenhum homem que foi, é ou será; foi, é ou será para sempre“. Vivo então cada momento, entendo o caráter transitório de cada função pública. Valorizo a renovação e a abertura, não me julgo com direito automático a coisa nenhuma e aceitarei sempre a soberania do plenário.

Se sou candidato de meu Partido, não serei o representante de nenhuma das organizações políticas na Presidência da Câmara. Serei servidor de todas.

Saberei conciliar altivez e independência com lealdade e coerência. E, para mim, altivez é defender o Parlamento, independência é não ser subserviente, coerência é não negar os passos já caminhados e lealdade não comporta usar o poder para atingir fins menores que o tamanho imenso do respeito à coisa pública, à causa brasileira.

Respeitarei meus adversários. Estes certamente saberão respeitar-me. Lutarei com vigor e em alto nível. Coragem e disposição de luta não são antônimos de respeito à opinião pública e à sensibilidade desta Casa.

Permito-me, por fim, lembrar mais uma vez Teotônio Vilela ao voltar de uma peregrinação por um Brasil profundo, dos seringueiros, dos salineiros, dos vaqueiros e pescadores. Ele disse que havia descoberto uma forte verdade, a de que, neste País, existe uma Pátria. É a esta Pátria que quero servir com a bênção de Deus e a ajuda de todos.

Obrigado.

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14/02/2001