Discurso do Presidente da República, Fernando Henrique Cardoso, durante a Convenção Nacional do PSDB

Notícias - 15/06/2002

Meus companheiros e minhas companheiras,

Ao vê-los aqui, ao ouvir os nossos líderes, ao ver agora esse vídeo comemorativo, eu me recordei de outras épocas, épocas talvez menos venturosas, mas épocas, também, muita crença, muita luta e muita confiança. Qual de nós – e muitos que estamos aqui presentes, lá estávamos – há de se esquecer da campanha das Diretas Já com Ulysses Guimarães, com Teotônio, com Franco Montoro, com Tancredo Neves, com o Brasil inteiro gritando por democracia.
E hoje ao vê-los aqui nesta alegria, ao vê-los aqui nesta Brasília querida fiquei pensando: meu Deus! valeu a pena lutar. Nós temos democracia no Brasil, essa democracia que conquistamos nas ruas – e esse nós é um nós plural, não é um nós do PSDB, ele engloba o PMDB, engloba muitos partidos, engloba todos os partidos, engloba todos os brasileiros e todas as brasileiras. Essa democracia que temos hoje foi a condição necessária para que o Brasil pudesse redescobrir a confiança em si mesmo e para que o Brasil pudesse, com muita firmeza, ir um a um eliminando seus graves problemas.
A mim correspondeu, ainda no Governo Itamar Franco e com a ajuda de muita gente, inclusive do Senador José Serra, que aqui está, a mim correspondeu enfrentar naquela época o dragão que devorava tudo, que era a inflação. Hoje, vejo na televisão, leio nos jornais: meu Deus! A inflação deste mês vai ser 0,27% e não 0,22%. Fico pensando: será que os mais jovens se lembram de quando a inflação era de 20% ao mês? Agora, quando chega a 0,27% ao mês, ascende luzinha amarela. Bom para o Brasil. Bom para o Brasil que está vendo este povo, hoje, sem ter que se preocupar com a erosão que seu salário sofria no passado, com a perda diária que a inflação comia.
Talvez os mais jovens nem se recordem disso, mas era assim o Brasil. E nós pusemos o Brasil em ordem. Fomos nós, foi o PSDB, fomos nós que construímos o eixo principal. Mas nunca fomos arrogantes, nunca imaginamos que sozinhos seríamos capazes de fazer isso. Ao contrário, estendemos a mão a todos aqueles de boa vontade, fosse qual tivesse sido a sua posição no passado, que quisesse se juntar a nós para confirmar a democracia e continuar na rota de combate à inflação, à corrupção e ao descalabro financeiro.
E desde a minha primeira eleição lutamos – e não fui eu só, aqui está o Almir Gabriel, aqui está Tasso Jereissati, aqui infelizmente não está entre nós aquele que mais lutou, que foi Mário Covas, mas está na nossa memória, está no nosso sentimento – lutamos juntos para ampliar a aliança que permitiu não apenas que eu ganhasse a eleição, mas que permitiu que eu governasse o Brasil. E eu não governaria se não tivesse ao meu lado o PFL, o PMDB, o PTB, o PPB e vez por outra o PPS, e vez por outra muitos outros partidos. Que bom seria que os brasileiros no Congresso, ao votarem ao invés de se preocuparem em denegrir quem está atualmente exercendo o poder, pensassem no futuro e no Brasil e tivessem apoiado com a mesma energia com que esses partidos apoiaram as medidas saneadoras, que permitem que hoje se diga: nós temos as nossas finanças sob controle.
Esse compromisso não foi meu, foi sendo construído no Brasil. Na reeleição, eu ganhei a reeleição em plena crise e ganhei porque o País sentiu que era sim preciso mudar. E eu mudei, mudei tudo que era difícil de mudar, inclusive o regime cambial. Mas era preciso mudar com segurança, a mudança conduzida por mãos competentes, por mãos que sabiam o que estavam fazendo e não por mãos que acenam assim e dão um passo atrás, não por mãos que dizem uma coisa e votam de outra maneira, por mãos coerentes. E a democracia e a estabilidade da nossa economia requerem hoje que sejamos coerentes.
Estou já no fim do meu segundo mandato. Tenho a satisfação de ver vocês todos aqui comigo e quantos outros mais de muitos partidos e principalmente os milhões sem partido, e principalmente os milhões que pela primeira vez, graças à rede de proteção social, conseguiram ter uma ligação com a sociedade brasileira e começa o combate à exclusão social.
É com a referência nesses milhões que, agora, ao estar prestes a terminar meu segundo mandato, não tenho dúvida nenhuma em dizer ao Brasil: nós precisamos continuar mudando com firmeza, com segurança e mudança com firmeza e com segurança se chama José Serra! (Palmas.) E Serra, porque é preparado, porque é competente, porque conhece o mundo, será capaz de manter a respeitabilidade que o Brasil alcançou no mundo todo. Respeitabilidade porque não mentiu, respeitabilidade porque não escondeu suas misérias, porque disse – e fui eu quem disse – que o País não era pobre, ele era é injusto. E reconhecemos as injustiças e lutamos contra elas, por isso somos respeitados, porque não enganamos, porque não temos uma palavra para fora e outra para dentro. O que se diz aqui é o que eu digo lá fora. E é isso o que Serra fará, porque ele sabe fazer. E ao fazer será ouvido como eu sou. E o Brasil precisa continuar sendo ouvido por todos os povos e por todos os países do mundo, porque o mundo é integrado e se não formos capazes de nos defender, com a nossa convicção e a nossa força própria, por melhores que sejam as nossas intenções perderemos o ritmo da história. E quando pararmos de pedalar, a bicicleta cai. E não vou deixar a bicicleta cair; Serra vai continuar pedalando em nome de todos nós, para que o Brasil continue avançando.
E Serra não é apenas competente, ele demonstrou como Ministro da Saúde a sua perseverança, a sua capacidade de enfrentar uma área difícil, que era a da saúde pública, uma área ingrata, uma área que foi considerada no passado como cemitério dos políticos, que os que lá entravam não saíam senão crucificados, e Serra saiu glorificado como o maior Ministro da Saúde que o Brasil já teve.
Ele teve, sim, seu caminho palmilhado por outros Ministros, como eu disse recentemente, por Carlos Albuquerque e por Jatene, por Alceni Guerra, não se esconde a história, mas ele tomou o caminho percorrido por esses e deu uma velocidade como nunca se tinha tido na saúde pública do Brasil. E tenho orgulho de dizer: fez no meu Governo, como fez o Ministro Paulo Renato na Educação também, como fez o Ministro Raul Jungmann na Reforma Agrária, como fizeram tantos Ministros, porque os Ministros e o Presidente não estão fazendo hoje outra coisa senão, cobrados pela opinião pública e graças à liberdade, fazer com que este País seja mais decente para os seus filhos.
Mas Serra é capaz disso, demonstrou com a sua tenacidade, foi capaz de vencer a guerra das patentes lá fora, foi capaz de vencer a guerra dos genéricos aqui dentro e será capaz de vencer uma progressão cada vez maior de todos os problemas sociais que o Brasil ainda enfrenta. Nada me alegra mais neste fim de Governo do que poder dizer como tenho dito: a estabilidade eu fiz há muitos anos, a mudança em favor dos mais pobres está começando só depois que foi possível botar em ordem o Estado brasileiros, mas ela está começando, o caminho está traçado e Serra vai acelerar essas mudanças sociais no Brasil. E é disso que precisamos, de um homem sério, responsável, competente, respeitado, trabalhador e que tem palavra firme. É coerente, chega e embuste, chega de mudar de pele como se fosse uma mariposa que de repente sai não sabe de onde e esquece de onde saiu. Não, não queremos esquecer nada dos nossos compromissos. Os nossos compromissos hoje são vida prática, não são palavras, não são discursos, não precisamos sair correndo para fazer de conta quê, porque nós somos o que nós somos e nós somos o que o povo brasileiro deseja que nós sejamos.
E quero ver, Serra, quero ver você e quero ver a Mônica, quero ver vocês dois dando continuidade ao que a Ruth e eu fizemos, nós demos o melhor que podíamos de nós próprios para que o Brasil avançasse. Ouvi calado toda sorte de desaforos, ouvi acusações gratuitas e injustas, ouvi infâmias. E ao invés de responder a cada uma delas, pensei o tempo todo no meu compromisso com este povo, nos nossos objetivos comuns e tratei de reunir forças para seguir adiante numa grande caminhada pelo Brasil. E isso vai você fazer agora, Serra, e ao fazer você há de se inspirar não é em mim, é nos que nos fizeram, é no Montoro, é no Mário Covas, é no Ulysses, é no Teotônio, é no Tancredo e é também em todas as suas companhias que aqui estão, é no conjunto de pessoas que aqui está que na verdade é o que dá força à nossa ação, são vocês os militantes que nós nem vemos, cujo nome eu não sei, que muitas vezes não sei nem se são do meu partido, mas que estão firmes. E quando às vezes malgrado a minha vontade fico distante, porque não há condição de o Presidente estar presente, eu não deixo de pensar que a minha palavra, ou a minha caneta, ou os meus atos só têm possibilidade de fazer o Brasil avançar se os próprios brasileiros estiverem lutando pelo que desejam e eles próprios estiverem me obrigando a avançar com eles. Esse é o maior legado da democracia.
E tenho a satisfação agora, ao ver aqui meu companheiro José Serra, companheiros de tantos anos de Chile, de Estados Unidos, de São Paulo, do Brasil inteiro, ao vê-lo aqui e poder dizer a vocês companheiros de partido, como direi amanhã aos eleitores do Brasil: neste homem eu confio, neste homem o Brasil pode confiar, porque ele é competente, ele é coerente, ele é trabalhador e ele vai levar adiante uma mudança com segurança.

E viva o Brasil!

Queria, aqui, deixei para o fim para estar mais perto, lembrar aquele que foi o nosso grande impulsionador, através da Vilma, numa homenagem muito sentida ao grande Sérgio Motta, o nosso Serjão.

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15/06/2002