Discurso do presidente da República, Fernando Henrique Cardoso, na cerimônia de lançamento do “Cartão-Cidadão“ – Rio de Janeiro/RJ

Notícias - 07/06/2002

Olhem, aqui. Um minutinho de silêncio, aqui. Um pouquinho de silêncio.
Hoje, vou inverter aquilo que se faz normalmente. Normalmente, quando o Presidente vai falar, ele se dirige às autoridades. Hoje quero me dirigir, em primeiro lugar, às crianças do “Bolsa Escola“ que estão aqui presentes. A festa é de vocês e de suas famílias.
Mas, também, não quero esquecer que, para que nós possamos – como estamos fazendo – melhorar o Brasil, precisamos de energia jovem. Quero saudar, então, muito especialmente, aos agentes jovens que estão aqui. A festa é de vocês também. A essa gente simpática, gente brasileira, gente corajosa, gente cheia de energia, que faz com que o Brasil avance.
Queria, Prefeito César Maia, saudá-lo muito especialmente. E citando o nome do Prefeito César Maia, estendo a saudação aos Prefeitos aqui presentes, cujos municípios cadastraram as famílias e permitiram que nós, hoje, viéssemos aqui para o começo dessa distribuição do “Cartão Único da Cidadania“.
Quero cumprimentar os parlamentares, aqui presentes, as várias autoridades, os Ministros presentes, o nosso Senador Artur da Távola. Enfim, a todos aqueles que vieram a se juntar a nós, aqui, nesta manhã.
Disse-me, há pouco, o Prefeito César Maia, que faz muito tempo, mas muito tempo mesmo, que nenhum Presidente da República vem aqui, a Campo Grande, vem aqui a Zona Oeste do Rio de Janeiro. Pois estou muito feliz de estar aqui, na Zona Oeste do meu Rio de Janeiro. E fico mais feliz, ainda, ao ver a vibração dessa criançada, ver essa gente jovem, os professores, as mães, os pais, porque nós precisamos acreditar no nosso futuro. E o nosso futuro, o futuro de vocês, depende dessa rapaziada, das meninas e dos meninos de Campo Grande, da Zona Oeste e de todo o Brasil. É com essa força, é com essa vibração, com essa energia observada por todos os lados do Brasil, que nós vamos, pouco a pouco – o que é difícil – mas, pouco a pouco, vamos melhorando o nosso país.
Olhem, tenho visto muita coisa, tenho lido muito jornal, assistido a muita televisão, ouvido muito discurso. E, agora, que estou terminando o meu mandato, já vou poder descansar um pouquinho. Eu leio e vejo, às vezes, dizerem o seguinte: “O Governo FHC – como eles chamam – conseguiu combater a inflação, fez a estabilidade.“ E parece que isso teria sido a marca desse Governo. Não acho bom isso. Se vocês quiserem saber o que acho que conseguimos deixar marcado no Brasil é que, pela primeira vez na nossa História, chegamos aos mais pobres – aos mais pobres, mesmo, nos rincões e locais mais perdidos do Brasil. Não é aqui, em Campo Grande, mas lá no interior do Nordeste, no interior da Amazônia, no coração do Centro-Oeste. Aquelas populações, que não tinham nenhuma condição de ter algum apoio para avançar, começaram a ter esse apoio. O que nós chamamos de rede de proteção social é um conjunto de programas que vão desde quando a mãe começar a gestação, que é Bolsa-Alimentação. Quando a criança nasce, mantém-se essa bolsa até que ela vá para a pré-escola.
E fiquei muito feliz de ver, nos últimos dados do Censo, que já temos 60% das nossas crianças na pré-escola. E depois, quando entram na escola, onde nós já temos 97% das crianças brasileiras, os mais necessitados recebem a Bolsa-Escola.
O Ministro Paulo Renato, que foi o grande propagador dessa Bolsa-Escola, me disse, hoje – e aqui está o Floriano Pesaro, que é jovem também e chefia esse programa – que nós já estamos distribuindo bolsas para 5 milhões e meio de famílias, são 8 milhões e 500 mil crianças brasileiras, cujas famílias recebem um pequeno auxílio, talvez mesmo um pequeníssimo auxílio. Mas esse incentivo à família leva a família a participar, porque leva a família a fazer com que a criança assista a, pelo menos, 85% das aulas que foram ministradas.
Então, essa criança é olhada pela família, que tem um pequeno incentivo do Governo. Do Governo Federal, do Governo Municipal, de mãos dadas, porque nós temos que andar de mãos dadas, para que se faça aquilo de que tanta gente fala, mas que pouca gente faz, a chamada inclusão social. Quer dizer, quem não tinha nenhuma ligação com a sociedade, nenhuma ligação com o Governo, nenhuma ligação com a escola, com o hospital, começa a ter essa ligação.
E, depois, da idade de 16 anos em diante, tem o agente jovem. Mais tarde, quando envelhecer, se nunca tiver contribuído para a Previdência, mas se tiver uma certa idade e a família não tiver recursos, recebe uma prestação de benefícios continuados. E se for do campo e não tiver nunca contribuído, recebe uma aposentadoria. Isso faz com que os mais necessitados comecem a sentir que esse Brasil olha para eles.
Às vezes, eu vejo críticas dizendo: “Ah, os programas do Governo atendem mais aos mais idosos e não aos mais jovens.“ Como se o mais idoso não passasse o recurso para a família. E ao apoiar a família, não apoiasse o mais jovem, a criança. É um engano. Às vezes, eu vejo também gente muito sábia – e eu tenho um medo que me pelo de gente muito sabida – porque, às vezes, eles se equivocam com um ar petulante, uma vontade de parecer que estão dizendo a verdade absoluta. Eu tenho visto gente muito sábia dizer que é preciso focalizar mais para alcançar a pobreza. É verdade. Mas, Prefeitos, o que nós estamos fazendo? Buscando os mais pobres, focalizando os nossos programas naqueles que mais necessitam.
E esse cartão que está aqui é um mecanismo para permitir que se faça um cadastramento geral. Que se possa ver se, realmente, estamos atingindo os mais pobres, para que se possa simplificar para a família, para a mãe de família, para o responsável que, num só cartão, vai poder colher os benefícios vários, dos vários programas que atendem aos mais pobres.
Por isso, retomando o que eu estava dizendo, eu não gostaria que se reconhecesse que esse Governo apenas acabou com a inflação. Isso era meu dever. A inflação arruinava o Brasil. Para acabar com a inflação – os Prefeitos sabem, os Governadores deviam saber também -, é preciso disciplina fiscal, ajuste fiscal, coisas desagradáveis. E o povo também bem entende. Mas não basta acabar com a inflação. Nós mudamos a política social do Brasil. Agora, pela primeira vez na História do Brasil, efetivamente, há um conjunto de programas que apóiam a família, que apóiam os mais pobres, que apóiam os excluídos que apóiam, sem distinção de cor nenhuma, sem distinção de religião ou de partido, sem precisar do pistolão, sem precisar do apoio do vereador, do candidato, do cabo eleitoral. Basta ser nascido no Brasil, cidadão brasileiro, tem o direito de levar seu filho à escola. Esse é o novo Brasil.
Controlar a inflação foi importante para que nós víssemos quanta pobreza havia aqui. Controlar a inflação foi importante para que nós víssemos como o dinheiro era mal gasto. Controlar a inflação foi importante para desnudar, mostrar a corrupção, e combater a corrupção. Mas só vai ser alguma coisa realmente significativa, se nós dermos continuidade aos programas como esse que nós estamos fazendo hoje, para centralização, em um só cartão, das várias ações sociais, e se nós tivermos a capacidade dar as mãos uns aos outros, e deixar de lado pequenas diferenças e entender que a nossa responsabilidade: a minha como Presidente da República, é fazer com que vocês, que são os que mais precisam, sintam, pelo menos, uma esperança. E mais que uma esperança, um caminho. E que esse caminho comece já a ser trilhado.
Não se combate a pobreza, a fome e a miséria simplesmente dando dinheiro. Não! Tem que dar dignidade, tem que fazer com que a pessoa saiba que ela tem o direito de receber. Tem que fazer com que as iniciativas existam. Esses agentes jovens que estão aqui, tão numerosos, são eles, hoje, os portadores da iniciativa. Eles, sim, com essa ação social de solidariedade, combatem a pobreza. Não adiantaria nada fazer programas teóricos e dizer: “Ah, se se pegasse não sei quantos bilhões e se dividisse em pedacinhos, tudo ia melhorar.“ Não! O que vai melhorar é a consciência de cada um, trabalhando e lutando com seu direito, com sua dignidade. Esses são os programas que nós estamos fazendo.
É por isso que eu vim aqui, hoje, à minha terra do Rio de Janeiro, ao nosso Campo Grande, à nossa Zona Oeste, para dizer a vocês: quero é ver vocês na luta pelo Brasil, quero é ver o próprio povo cada vez mais consciente dos seus interesses, quero, sim, é ver um país democrático, um país que luta, um país que sabe que quando o Governo faz, faz porque é obrigação do Governo.
É por isso que termino como comecei, agradecendo a vocês, às crianças de Campo Grande, às crianças da Zona Oeste, aos Prefeitos, aos agentes jovens, às mães de família, a todos aqueles que, juntos, estamos construindo um grande Brasil.
E viva o Brasil!.

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07/06/2002