Estudo do BNDES reforça crítica de FHC ao FMI

Notícias - 13/03/2002

Um estudo divulgado há três semanas pelo Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) critica os critérios usados pelo Fundo Monetário Internacional (FMI) para incluir as empresas estatais no cálculo do déficit público. Na segunda-feira, o presidente Fernando Henrique Cardoso atacou as regras do fundo durante a abertura da reunião anual do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID).

Em seu discurso, Fernando Henrique disse que o Brasil já pediu várias vezes ao FMI “esclarecimentos“ sobre essa prática, mas nunca teve uma resposta satisfatória. “Até hoje, as respostas que deram foram como se alguns de nós fôssemos analfabetos“, disse o presidente. “Não somos.“

O trabalho do BNDES sugere que, ao publicar suas estatísticas sobre o setor público, o Banco Central passe a mostrar o que aconteceria com os números se as estatais ficassem fora da conta. Para forçar a comparação, as estatísticas seriam publicadas em dois formatos, um com os critérios do FMI e outro sem incluir as estatais na conta do déficit.

O estudo foi produzido por dois economistas da Área de Assuntos Fiscais e Emprego do BNDES, Beny Palatnik e Ricardo Figueiró Silveira. O chefe da Área de Assuntos Fiscais é o economista José Roberto Afonso, um dos autores da Lei de Responsabilidade Fiscal e um antigo colaborador do ex-ministro José Serra, candidato do PSDB a presidente e um crítico dos critérios do FMI.

O trabalho lembra que esses critérios foram estabelecidos em comum acordo durante as negociações do socorro do FMI ao Brasil depois da crise da Rússia, no fim de 1998. Eles eram os mesmos de acordos anteriores com o Fundo, mas o estudo observa que nada obrigava o Brasil a aceitá-los, fora a “inércia em relação a conceitos empregados nos acordos firmados nos anos 80“.

O estudo mostra que os manuais usados pelo FMI para padronizar o tratamento de questões fiscais e estatísticas do setor público permitem excluir as estatais do cálculo do déficit. A idéia é que, se uma empresa controlada pelo governo tem como se manter em pé sem recorrer o tempo todo aos cofres públicos, não há razão para incluí-la na contabilidade do déficit.

Esse argumento foi incorporado pelas normas da União Européia para as contas nacionais dos países que a integram, consideradas pelo FMI “uma boa prática a ser observada“. No caso do Brasil, a inclusão das estatais na conta do déficit público tornou-se um obstáculo para o endividamento e os investimentos de empresas como as companhias estaduais de saneamento básico.

Os autores do estudo enfatizam que ele não deve ser interpretado como “uma defesa em favor da mudança da metodologia acordada com o FMI“. Mas deixam claro seu ponto de vista: “Hoje em dia, a nítida separação entre as funções de governo e as atividades empresariais das sociedades controladas pelo poder público retira consistência à manutenção desse procedimento.“

A inclusão das empresas estatais na contabilidade do déficit público tem sido decisiva para que o país cumpra as metas de ajuste fiscal acertadas com o FMI em 1998. No ano passado, o superávit primário do setor público atingiu 3,76% do Produto Interno Bruto (PIB), segundo o Banco Central. A contribuição das estatais para esse esforço foi equivalente a 0,94% do PIB.

Veja aqui o estudo do BNDES

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13/03/2002