Maior exportadora do Brasil de calçados fecha as portas
Brasília (29 de maio) – A maior e uma das mais tradicionais exportadoras de calçados do país, a Reichert Calçados, com sede em Campo Bom (RS), região metropolitana de Porto Alegre, não resistiu à desvalorização do dólar e decidiu fechar as portas. A empresa, fundada em 1935, destina 100% da produção para o mercado externo, principalmente Estados Unidos, mas deve desativar suas 20 unidades industriais em pelo menos onze municípios do Rio Grande do Sul até o fim de julho ou agosto, o que significará a demissão de 4 mil trabalhadores.
A informação, publicada pelo jornal “NH“, de Novo Hamburgo, centro do pólo calçadista do Estado, foi confirmada pela Reichert mas os diretores não quiseram comentar o assunto. Apenas a agropecuária Campo Bom, com fazendas em Mato Grosso do Sul e Goiás, seguirá em operação.
“Estamos parando toda a produção de calçados“, disse o diretor da Reichert, Ernani Reuter, ao “NH“. “A decisão de parar a fabricação de calçados está tomada“, confirmou o presidente do Sindicato dos Trabalhadores nas Indústrias de Calçados da cidade de Teotônia, Roberto Müller, depois de participar de uma reunião com representantes da unidade local da empresa.
Para o diretor executivo da Associação Brasileira das Indústrias de Calçados (Abicalçados), Rogério Dreyer, o fechamento da Reichert prova que a crise provocada pela valorização do real ante o dólar “passou dos limites“. “Outras empresas já haviam fechado, mas eram de pequeno e médio porte“, comentou. A estimativa da Abicalçados é de 30 mil demissões de uma base de 300 mil trabalhadores do setor em todo o país desde 2005. “A situação é mais do que conhecida pelo governo federal e infelizmente não há nenhuma mudança na política cambial“, diz o diretor executivo do Sindicato das Indústrias de Calçados de Campo Bom, Gilfredo Heckler. O diretor do sindicato dos trabalhadores de Campo Bom, Júlio da Luz, disse que a Reichert se recusava a discutir a crise com os operários. Segundo ele, a recusa ao diálogo foi assim explicada pela diretora de RH da empresa: “ Vocês vão fazer subir o câmbio? Se não vão, não adianta nada nos reunirmos“.
Já o prefeito de Campo Bom, Giovani Batista Felter (PMDB) é enfático. “É um nocaute aplicado pela política cambial. Já vínhamos advertindo sobre a crise há dois ou três anos. Mas faltou sensibilidade em Brasília para uma indústria empregadora intensiva de mão de obra. Não estou preocupado com queda na arrecadação, pois os exportadores não pagam ICMS, mas sim com a crise social“.
Os calçados femininos da Reichert são vendidos no mercado internacional com a marca dos importadores. No ano passado os embarques somaram US$ 85,1 milhões, 15,6% a mais do que em 2005. O montante corresponde a 4,6% das exportações brasileiras do setor e a 6,8% das vendas externas de calçados do Rio Grande do Sul no período.
Não consta que a Reichert tenha atrasado salários em sua história e agora ela garantiu o pagamento integral dos direitos dos funcionários. A produção será mantida somente até que seja concluída a entrega dos últimos pedidos em carteira, o que deve ocorrer em julho. Em Campo Bom, onde fica a matriz, há 850 empregados. Segundo Juarez Flor, tesoureiro do sindicato, os problemas da Reichert eram conhecidos, “mas a surpresa está no rápido desfecho da crise“. Há três semanas, quando o prefeito de Campo Bom decidiu antecipar para o dia 14 de maio o feriado municipal de Corpus Christie, a Reichert acertou com os empregados que este seria um dia de trabalho, a ser compensado mais para o fim do ano. “Com isso, pensávamos que estava cheia de encomendas“, disse Flor.
A Reichert já anunciou ao sindicato de Campo Bom que até 4 de junho – um mês antes da data base para o dissídio coletivo da categoria – haverá a demissão de 75 pessoas das suas duas áreas de modelagem. O sindicato ignorava a intenção de a empresa demitir também na Formas Reichert e no Curtume Reichert. Campo Bom tem 52 mil habitantes e nove mil trabalhadores na sua indústria de calçados.