O Brasil agora tem rumo. É preciso mantê-lo

Notícias - 07/01/2002

O que mais me surpreende no Brasil de hoje é como subestimamos os enormes avanços realizados em tão pouco tempo. Pois basta voltarmos para meados da década passada – apenas alguns minutos na história do país – para nos dar conta de quanto progredimos.

O ponto de partida – nunca esqueçamos – foi o fim da inflação devastadora que solapou a economia, os valores e qualquer esperança de maior justiça social no Brasil durante pelo menos duas gerações. Em reconhecimento dessa façanha, elegemos seu principal responsável para a Presidência da República e embarcamos num período de mudanças que está transformando o país.

Para começar, iniciou-se o desmonte de uma economia dominada pelo Estado, com empresas estatais inchadas e ineficientes, regulamentação excessiva que convidava à corrupção, bancos estaduais quebrados a serviço de políticos sem escrúpulos e um sistema previdenciário injusto a caminho da falência.

A estabilidade econômica imediatamente gerou um dramático crescimento do poder aquisitivo do povo, enquanto o fim dos monopólios, a privatização das empresas estatais e a criação de agências reguladoras contribuíram para uma onda de novos investimentos, que por sua vez provocaram um forte aumento de eficiência e concorrência, fechando o círculo virtuoso com a manutenção de preços.

Na frente social, iniciamos o resgate da gigantesca dívida acumulada ao longo dos séculos com a verdadeira revolução na educação, que colocou 97% das crianças entre 7 e 14 anos nas escolas, melhorou os salários dos professores, moralizou e universalizou a distribuição de livros didáticos gratuitos no ensino fundamental e estabeleceu novos parâmetros de qualidade que permitirão elevar significativamente o nível do ensino no decorrer dos próximos anos. Não menos importante, nosso vergonhosamente disfuncional sistema de saúde pública começou a ser reformulado para poder oferecer tratamento e prevenção minimamente aceitáveis à população.

Institucionalmente, também progredimos com a Lei de Responsabilidade Fiscal, que marca o início de uma nova era de transparência e equilíbrio na gestão das finanças públicas também no nível estadual e municipal. Avançamos com a limitação das medidas provisórias. E com o início da indispensável flexibilização da arcaica legislação trabalhista, que não apenas empurra cada vez mais trabalhadores para a “informalidade“, mas também limita a criação de novos empregos sob a proteção da lei e sintonizados com o mundo globalizado, informatizado e mutante em que precisamos competir.

Apesar das aparências em contrário, acredito que a maré da corrupção que inunda o país ao longo das últimas décadas finalmente começou a baixar, desta vez irreversivelmente, graças aos efeitos combinados de uma imprensa vigilante, uma população mais consciente e – em conseqüência – um Congresso que virou “autolimpante“ ao processar e cassar seus próprios frutos podres e acabar com a imunidade parlamentar para crimes comuns.

Obviamente, isso tudo não significa que resolvemos todos os nossos problemas. Apesar de tantos avanços, continuamos com uma vergonhosa desigualdade social que precisa ser reduzida aceleradamente, não apenas porque é moralmente injusta e inaceitável, mas também porque o enorme fosso entre os que têm e os que não têm atrasa o desenvolvimento e contribui inevitavelmente para aumentar a onda de violência que assola o país.

Continuamos, também, sem ter feito a reforma tributária tão essencial para desengessar as finanças públicas, racionalizar o nosso infernalmente complexo e ineficiente emaranhado de impostos e baixar o escandalosamente alto custo do dinheiro, que encarece tudo o que fazemos e consumimos, reduz nossa competitividade internacional e desestimula investimentos produtivos.

Falta ainda a tão desejada, tão necessária e tão obstaculada reforma de nosso sobrecarregado e emperrado sistema judiciário. E a não menos básica reforma política. Nela, a fidelidade partidária estimularia a formação de partidos com identidades definidas, e um sistema eleitoral híbrido de voto distrital e voto proporcional fortaleceria a democracia ao mesmo tempo que baratearia dramaticamente o custo das campanhas eleitorais.

Isso sem falar da cruzada para aumentar nossas exportações, da batalha para recuperar o tempo perdido na capacidade de gerar energia elétrica, da necessidade de melhorarmos – e muito – nossa capacidade de administrar a coisa pública com mais competência e menos desperdícios.

O caminho é longo e as mudanças continuarão sendo mais difíceis e demoradas do que gostaríamos. Mas o essencial é que o Brasil agora tem rumo, perspectivas de melhora contínua, uma população cada vez mais solidária e comprometida com a responsabilidade social e goza de respeito e credibilidade na frente internacional como nunca antes em sua história.

Em outubro deste ano, mais de 100 milhões de brasileiros irão às urnas não apenas para escolher um novo presidente, novos governadores e novos parlamentares, mas também para decidir se pretendemos ou não continuar pelo caminho que leva a uma sociedade mais desenvolvida, mais próspera e mais justa. Faço votos – e confio – que a escolha seja feita com o costumeiro bom senso.

Roberto Civita é presidente do Grupo Abril e editor de VEJA

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07/01/2002