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FHC condena celebração do golpe de 1964

Fernando Henrique Cardoso*

Cinquenta e cinco anos passam depressa. A memória se vai, mas ficam recordações. No dia 13 de março de 1964 eu estava no Rio de Janeiro, na casa do meu pai. À noite fui à Central do Brasil pegar o trem de volta para São Paulo. Meu pai, general reformado e ex-deputado federal, residia no Arpoador, no mesmo prédio em que moravam minha avó e um tio. Lá também morava Carlos Drummond de Andrade. Por Copacabana inteira, passando por Botafogo e pelo Flamengo, havia velas acesas nas sacadas de muitos edifícios: a classe média, especialmente a mais alta, protestava contra Jango Goulart, presidente da República que convocara seus apoiadores a se reunirem naquela noite em comício perto da Central do Brasil, em frente à Praça da República.

Tomei o trem, indiferente ao que acontecia. Por acaso, estavam no trem vários amigos: o José Gregori, que viria a ser ministro da Justiça em meu governo; Plínio de Arruda Sampaio, que fora meu colega de curso primário no colégio Perdizes, em São Paulo, e se tornaria deputado federal constituinte; e o engenheiro Marco Antônio Mastrobuono, futuro marido da filha de Jânio Quadros. No jantar, conversas e discussões. O “golpe” estava no ar: de quem seria? Não chegamos a concluir se dos militares e da “direita”, ou das “forças populares”, com Jango à frente, em favor de vagas reformas. Só sabíamos de uma coisa: viesse do lado que viesse, sofreríamos as consequências…

Na época eu era jovem professor-assistente da Faculdade de Filosofia, tinha 33 anos e assento no Conselho Universitário da USP como representante dos livres-docentes. Pouquíssimos sabiam de minhas relações de família com a vida política. Meu pai se elegera deputado federal pelo PTB em 1954. No governo de Getúlio, um primo de meu pai havia sido governador do Rio e outro, ministro da Guerra, o mesmo cargo ocupado por um tio-avô no início dos anos 1930. No governo de Juscelino um tio havia presidido o Banco do Brasil.

Meu pai e muitos familiares pertenciam à ala nacionalista e eram favoráveis à campanha “O petróleo é nosso”, na qual também me envolvi. Nunca me esquecerei do vidrinho de petróleo baiano colocado numa estante na casa do marechal Horta Barbosa, que eu frequentava quando menino, pois sua filha se casara com um irmão de meu pai.

Eu me interessava sobretudo pela faculdade, na qual me tornei professor em 1953, num ambiente avesso a Vargas e distante dos militares.

Minha participação política até então havia sido fugaz: no começo dos anos 1950 estive próximo da esquerda, do Partidão e do círculo intelectual liderado por Caio Prado Júnior na Revista Brasiliense. Rompi com o PC quando os soviéticos invadiram a Hungria, em 1956. Depois do Relatório Kruchev, da mesma época, agitei bastante contra os dirigentes comunistas. Não simpatizava com o populismo de Jango, embora fosse amigo de seu chefe da Casa Civil, Darcy Ribeiro. Nada disso impediu que a partir de 1964 eu fosse considerado “subversivo” pelos novos donos do poder.

No início dos anos 1960, lutava pela organização da carreira universitária e pela Fapesp. No Conselho Universitário ajudei a derrotar a “oligarquia”: com a ajuda de Hélio Bicudo e Plínio Sampaio, ambos do gabinete do governador Carvalho Pinto, elegemos o professor Ulhôa Cintra reitor da USP. Por isso eu gozava de prestígio em camadas de professores e, sobretudo, de estudantes.

Recordo-me de duas reuniões na Faculdade de Filosofia na noite de 1.º de abril de 1964. Numa tentava acalmar os estudantes, pois não entendia bem o que acontecera e achava precipitado haver manifestações. Na segunda tentava o mesmo com meus colegas professores. Tamanha era a confusão que houve quem propusesse um manifesto contra os militares golpistas que apoiavam Jango… Precisei telefonar para um colega, professor da Medicina, pedindo que viesse em meu socorro, para evitar o protesto contra Jango, que estava sendo deposto.

Em seguida a polícia tentou prender outro professor, Bento Prado, confundindo-o comigo. Tive de me “esconder”, primeiro em casas de amigos, em São Paulo, depois no Guarujá, num apartamento do Thomas Farkas, na companhia de Leôncio Martins Rodrigues. De lá saí para ir a Viracopos, cercado por familiares e amigos, sob a batuta de Maurício Segall, que se informava e sabia dos aeroportos ainda sem listas de subversivos a serem capturados. Voei para Buenos Aires, onde me hospedei no apartamento de um colega sociólogo, José Num, que mais tarde foi ministro da Cultura de Néstor Kirchner. Da Argentina fui para o Chile, carregando comigo os escritos da tese que pretendia defender para conquistar uma cátedra que vagara com a saída de Fernando de Azevedo.

Ruth, minha mulher, ficou em São Paulo. Ela procurou, então, o professor Honório Monteiro, que representava a Faculdade de Direito no Conselho Universitário e era afilhado de sua avó. Eu me dava bem com ele, assim como com meus vizinhos de cadeira no Conselho, representantes da Faculdade de Direito, Luís Eulálio Vidigal e Gama e Silva (que fora ao jantar de comemoração de meu doutorado. Mal sabia eu que, anos depois, ele assinaria o AI-5…). Quando Ruth perguntou ao professor Honório: “O que vai acontecer?”, ele, sabiamente, replicou: “Nada, vai mudar tudo”. Perdi a condição de professor, que só retomaria em outubro de 1968 ao vencer o concurso para a cadeira de Ciência Política. A cátedra durou poucos meses. Em 13 de dezembro, Gama e Silva, então ministro da Justiça, leu o AI-5, que fechou o Congresso, suspendeu o habeas corpus, cassou mandatos, e, como vários professores universitários, fui compulsoriamente aposentado em abril de 1969.

A institucionalidade foi quebrada e minha vida mudou. Recordar faz parte da História. Celebrar, o quê? No meu caso, exílio, processos e perda de cátedra. Rancor? Para quê? Olhar para a frente e manter a democracia é o que conta.

*SOCIÓLOGO, FOI PRESIDENTE DA REPÚBLICA

Publicado originalmente no jornal O Estado de São Paulo neste domingo (07)

“O Brasil tem uma dívida colossal com os autistas”, por Mara Gabrilli

Foto: Senado Federal

Você sabia que a incidência do autismo em crianças é mais comum que a soma dos casos de HIV, câncer e diabetes? Negligenciado no Brasil, o autismo é um distúrbio no desenvolvimento infantil que tem impacto gigantesco na interação social, na comunicação, no aprendizado e na capacidade de adaptação. Embora não tenhamos dados oficiais do IBGE, organizações de atendimento a esse público estimam que tenhamos cerca de 2 milhões de brasileiros com autismo. Muitos sem diagnóstico.

Falamos de brasileiros esquecidos.

Para se ter uma ideia, nos Estados Unidos, pediatras são treinados para identificar os transtornos do espectro autista até os três anos de idade. Aqui, o diagnóstico é feito, em uma média otimista, até os sete anos de vida.

Em 2012, ainda em meu primeiro mandato como deputada, fui designada relatora do projeto de lei 1361/11, que criou uma Política Nacional de Proteção dos Direitos da Pessoa com Transtorno do Espectro Autista, legislação que reconhece legalmente o indivíduo com autismo como uma pessoa com deficiência, colocando-a sob o mesmo guarda chuva de direitos ao qual esse público tem acesso.

Durante a relatoria do texto, pude conhecer de muito perto a dura realidade das famílias envolvidas, que me clamavam por celeridade na tramitação do projeto.

Após alguns meses de discussão pública, apresentamos apenas três emendas para aprimorar o texto original, atendendo assim o clamor de mães e pais que durante a vida inteira só ouviram “nãos!”.

Uma das emendas criou sanção administrativa expressa para o gestor escolar ou autoridade competente, em escola regular, que recusar a matrícula da criança com autismo, punindo com multa de três a vinte salários mínimos. Em caso de reincidência, a punição é a perda do cargo.

Apresentamos também uma emenda acrescentando ao Código Penal o art. 136-A, para tipificar a conduta daquele que aplica qualquer forma de castigo corporal, ofensa psicológica, tratamento cruel ou degradante à criança ou adolescente com deficiência física, sensorial, intelectual ou mental, como forma de correção, disciplina, educação ou a qualquer outro pretexto.

O crime pune com detenção de seis meses a dois anos, observadas as agravantes se do fato resultar lesão corporal de natureza grave (reclusão, de dois a quatro anos), ou se resultar a morte (reclusão, de quatro a doze anos). Aprovado pelo Senado ainda em 2012, tal texto foi sancionado pela presidente Dilma Rousseff no mesmo ano, tornando-se a Lei Berenice Piana, nome de uma mãe guerreira e defensora árdua da causa. A regulamentação, no entanto, só veio dois anos depois, após muita pressão desta hoje senadora e de muitas famílias e associações de todo Brasil. Contudo, mesmo com uma legislação legítima, na prática, o Estado brasileiro ainda deve muito.

Na educação, por exemplo, as barreiras enfrentadas pelas famílias crescem a cada dia nas escolas, que descaradamente continuam a negar a matrícula para esses alunos. Quando aceitam, praticam uma falsa inclusão, recebendo o educando, mas negando recursos necessários para seu aprendizado. Falta ferramentas em sala de aula, além de capacitação e amparo para os professores, e, sobretudo, o direito a ter um acompanhante especializado para apoio às atividades de comunicação, interação social, locomoção, alimentação e cuidados pessoais.

Com objetivo de sanar essa postura do poder público, já reconhecida como crime, na Lei Brasileira de Inclusão da Pessoa com Deficiência (13.146/2015), que também relatei na Câmara dos Deputados, reforçamos a defesa do autista, punindo o gestor que recusa ou cancela matrícula, ou ainda que cobra valores adicionais de um aluno com deficiência. Além de multa, a pena prevê 2 a 5 anos de reclusão, podendo ser agravada em 1/3 em casos em que a infração é cometida contra menores de 18 anos. Tal prerrogativa vale para todas as pessoas com autismo no Brasil e seu cumprimento deve ser perseguido por todos nós. Afinal, a inclusão educacional é uma meta que deve ser perseguida e por qualquer sociedade que busque o avanço.

É profundamente triste presenciamos ainda hoje, cinco anos após a sanção da Lei Berenice Piana, casos envolvendo homicídios e tentativas de suicídio entre famílias de autistas – tamanho desespero e dor causados pela falta de amparo.

No Brasil afora, ainda é comum encontrarmos depósitos humanos onde autistas são abandonados por famílias extremamente vulneráveis. Essas pessoas são enclausuradas em celas e tratadas de forma subumana. Isso ocorre em 2019, quando temos duas legislações robustas que reconhecem os direitos dessas pessoas que são, sim, brasileiros e merecem e devem exercer cidadania.

A Lei Berenice Piana e Lei Brasileira de Inclusão são frutos de uma luta de muitas décadas. São legislações construídas pela sociedade civil, que arregaçou as mangas para mudar realidades esquecidas, olhando para segmentos à margem das políticas públicas. E como relatora de ambas as matérias, muito me entristece e frustra presenciar tamanha negligência do Estado.

Abril, mês em que celebramos o Dia Mundial de Conscientização sobre o autismo, cabe lembrarmos que o Brasil atual discute o futuro de gerações, mas ainda não olha para quem precisa hoje do mínimo existencial para viver.

Por Mara Gabrilli

Senadora (SP), publicitária, psicóloga, foi secretária da Pessoa com Deficiência da capital paulista e vereadora por São Paulo. Em 1997, após sofrer um acidente de carro que a deixou tetraplégica, fundou uma ONG para apoiar o paradesporto, fomentar pesquisas cientificas e promover a inclusão social em comunidades carentes

Artigo publicado originalmente no Jornal O Estado de S. Paulo, na edição de 1º de abril de 2019.

Menos juros, mais desenvolvimento

Por José Serra 

Não é novidade afirmar que elevados níveis de juros dificultam ou, no melhor dos casos, não facilitam o desenvolvimento econômico e social em nosso país e em qualquer outra parte do mundo. Juros altos como os brasileiros desestimulam o investimento produtivo e tornam a dívida pública excessivamente custosa em termos fiscais. Para se ter uma ideia, apenas em 2018 a despesa dos juros para a sociedade (setor público consolidado) ficou na casa dos R$ 380 bilhões – 5,5% do nosso PIB.

Para a maioria dos analistas econômicos, a mudança para melhor dessa situação exige compromisso efetivo com as reformas econômicas estruturais da economia brasileira. Os objetivos principais seriam, no limite, o reequilíbrio da dívida como proporção do PIB e a ampliação de um quadro de previsibilidade e confiança dos agentes econômicos no governo e no Congresso.

Precisamos de um tripé de reformas, feitas com calma, lucidez e firmeza. Leve-se em conta que a política econômica depende da qualificação dos seus executores e de expectativas favoráveis da sociedade e dos agentes econômicos. O que as pessoas acham e pensam – e não apenas suas decisões a posteriori – afetam o quadro econômico antes que os fatos se concretizem.

A mera apreensão quanto a uma determinada conjuntura ou decisão pode levar a taxa de câmbio, a inflação ou os juros a um quadro de movimentos bruscos, prejudiciais à economia. Quando o mercado prevê tempos nebulosos e incertos, esses riscos são precificados nos diferentes ativos financeiros, a exemplo dos títulos da dívida pública, exigindo pagamento de juros mais elevados pelo governo. Este, por sua vez, aceita pagar taxas mais altas nos títulos que emite para financiar o déficit público. Quando as nuvens se dissipam e o horizonte fica mais claro, se dá o oposto: fica mais fácil e barato financiar as políticas públicas.

Os juros brasileiros já foram bem mais altos em relação aos padrões atuais. A chamada taxa Selic, o juro básico da economia, está em 6,5% ao ano. Antes das quedas recentemente promovidas com maestria pelo Banco Central (BC), a Selic estava em 14,25% ao ano.

Tomando a expectativa dos agentes econômicos para os juros 12 meses à frente e descontando a inflação esperada para esse mesmo período, os juros reais brasileiros estão hoje em 2,3%. No ranking mundial estamos na sétima colocação, conforme dados da Infinity Asset Managment e do portal MoneYou. Perdemos apenas para Turquia, Argentina, México, Rússia, Indonésia e Índia.

O fato é que a taxa de juros depende das condições macroeconômicas do País. Juros elevados são consequência de déficit e dívida elevados, dentre outros fatores. E há mais questões em jogo, como o difícil tópico das operações compromissadas, uma espécie de dívida pública sob responsabilidade do BC.

O peso do crédito público também explica uma parte do problema, porque os juros subsidiados podem afetar o custo do crédito total, uma vez que a política monetária tem menor poder na presença de dinheiro carimbado. Não custa lembrar que a política monetária nada mais é do que a atuação do BC que procura tornar o dinheiro mais caro ou mais barato, mais ou menos disponível, aumentando ou contraindo os recursos em circulação na economia e, assim, atingindo este ou aquele nível de inflação.

O déficit público nominal (ou agregado, como prefiro chamar) encerrou 2018 em 7,1% do PIB e os pagamentos de juros sobre a dívida pública corresponderam a 5,5% do PIB. O restante (menos de 2 pontos de porcentagem do PIB) equivale ao déficit chamado primário. Para a dívida pública parar de crescer, considerando que já atingiu nível muito próximo de 80% do PIB, a Instituição Fiscal Independente do Senado calcula que seria necessário um superávit primário de 1,7% do PIB anual. Em dinheiro, estamos falando de mais de três centenas de bilhões de reais de esforço.

Outras ações precisam ser tomadas, como, por exemplo, enfrentar a excessiva concentração bancária, fator explicativo de parte dos juros elevados na ponta, como se diz. Para além da Selic, os juros que o brasileiro enfrenta são siderais. Vejam-se alguns exemplos: cartão de crédito, 56,9% e cheque especial a 312,6% anuais, além de crédito pessoal de 41,7% ao ano. Alguém vai nos dizer que esses juros descomunais são fruto apenas de indisciplina fiscal ou incompetência das autoridades monetárias?

Quem dá conta de enfrentar a fatura política e econômica dos juros ao consumidor? Registre-se que o Banco Central já avançou em algumas medidas importantes na área. O impedimento de que as pessoas fiquem por mais de um mês no chamado crédito rotativo do cartão de crédito derrubou a taxa de juros significativamente em relação a 2016, quando ultrapassava os 110% anuais.

É hora de o Congresso aprofundar as discussões e aprovar as reformas da Previdência, tributária e política. De aprofundar as discussões sobre os efeitos fiscais da política monetária. A reforma da Previdência ajudará a reequilibrar as contas primárias do governo federal, enquanto a tributária dará mais racionalidade ao sistema e reduzirá os custos das empresas para recolhimento de impostos, melhorando o ambiente de negócios. A reforma política, por sua vez, nos moldes do meu projeto para instituir o voto distrital, aumentaria a representatividade e favoreceria a governabilidade, reduzindo o custo econômico e político de decisões importantes para o País.

Esse conjunto de mudanças ajudaria a destravar o crescimento econômico, impondo nova dinâmica ao mercado de trabalho e aos setores produtivos. Os custos financeiros declinariam como causa e consequência desse cenário mais benigno. Retomaríamos um novo ciclo de desenvolvimento, com expansão do bem-estar social e redução das desigualdades sociais. Começaríamos, assim, a absorver de maneira justa e solidária a bilionária fatura dos juros e de desperdício no Brasil.

“Maioria e minoria na dinâmica democrática”, por Marcus Pestana

Foto Orlando Brito

Desde que o mundo é mundo, a sociedade busca a melhor forma de conduzir seus destinos. Para que a vida compartilhada por pessoas e segmentos sociais diferentes seja possível, é inevitável a construção de um conjunto de regras, instituições, práticas, ritos, consensos e pactos. Da Eclésia grega até a configuração das democracias contemporâneas, experimentamos as mais variadas formas de dirigir os assuntos e os negócios de Estado.

A grande ideia vitoriosa no século XXI é a da liberdade. A concepção de que a democracia é um valor permanente e universal consolidou-se como amplamente hegemônica.

A democracia, como invenção humana, é, por definição, imperfeita. Mas carrega uma dinâmica autocorretiva por meio de um contínuo processo de tentativa, erro, síntese e avanços.

Isso pressupõe um acordo em que múltiplos atores aceitam e legitimam a diversidade de visões e erguem um pacto de respeito mútuo e observância das regras do jogo. Portanto, democracia não é o governo da maioria eventual para seu exercício absoluto e ilimitado. É o governo da maioria que respeita e reconhece a minoria. Não pode existir espaço para que o jogo se assemelhe à ironia fina de Millôr Fernandes: “Democracia é quando eu mando em você, ditadura é quando você manda em mim”.

Dentro da dinâmica democrática, assumem centralidade a independência dos Poderes, a Constituição como lei maior, a alternância no poder e a liberdade como valor permanente, ela, sim, absoluta. E é no Congresso que pluralidade e diversidade se manifestam. Lá é a Casa onde maioria e minoria se encontram, dialogam, digladiam, polemizam, debatem e deliberam. Nenhum governo eleito pode tudo. Há limites constitucionais, legais e institucionais. E há limites políticos que demandam a formação de maioria parlamentar para as coisas avançarem.

No processo de formação da maioria necessária, vários caminhos se combinam: capacidade de liderança, clareza do rumo, persuasão, convencimento, cooptação, negociação, autoridade, habilidade, sensibilização e mobilização da opinião pública. Não há presidente da República ou primeiro-ministro que possa, na democracia, governar solitária e unilateralmente. No mais longo período democrático de nossa história (1985-2019) já ocorreram dois impeachments por falta de apoio parlamentar: Collor (1992) e Dilma (2016).

Ainda assim, a democracia brasileira se demonstra sólida e consolidada, exatamente em função da alternância no poder e do respeito e convivência entre os diferentes. Já tivemos a esquerda no poder (Lula e Dilma), em outros momentos governos de centro (Fernando Henrique Cardoso, José Sarney, Itamar Franco e Michel Temer), e agora um governo assumidamente de direita. E o país, mal ou bem, continua funcionando, as instituições estão fortalecidas, e a Constituição é a baliza. Como disse o ex-ministro Raul Jungmann certa vez: “Dentro da Constituição, tudo; fora dela, nada”.

Volto ao assunto na próxima semana. O jogo começou. O presidente Jair Bolsonaro tomou posse. Sua equipe começa a esboçar as primeiras propostas. Rodrigo Maia se elegeu, por larga maioria, presidente da Câmara dos Deputados. David Alcolumbre, em tumultuado processo, foi alçado à presidência do Senado Federal.

O sucesso ou o fracasso do projeto governamental dependerá de sua capacidade de formar maioria. E esta não é tarefa trivial e simples. Assunto para o próximo sábado.

Por Marcus Pestana

Primeiro Secretário da Executiva Nacional do PSDB e ex-deputado federal

Artigo publicado originalmente no jornal O Tempo na edição do dia 09 de fevereiro de 2019

A agenda social-democrata sempre esteve em pauta

Social democracia não está apenas no nome do PSDB, mas em seu DNA. É por este modelo que o partido acredita que o país sairá das várias crises em que se meteu. Nosso candidato a presidente, o ex-governador de São Paulo, Geraldo Alckmin, que teve amplo palanque no Espírito Santo, teceu sua estratégia com base em propostas sólidas e realistas de desenvolvimento. Contudo, o eleitor é soberano e escolheu outro caminho. E é importantíssimo respeitar esta decisão.

Alckmin apresentou aos brasileiros boas propostas, incluindo as reformas político-eleitoral, da previdência e bancária. Na segurança, defendeu maior atuação da polícia federal nos estados e municípios, e para a educação firmou seus pilares na primeira infância e na juventude. Ideias com as quais sempre compactuei.

Geraldo Alckmin foi o meu candidato a presidente e para ele trabalhei incansavelmente ao organizar duas visitas ao Espírito Santo, com direito a uma das maiores reuniões que o então candidato participou em todo o país. O partido viabilizou ainda a visita da senadora Ana Amélia, que concorreu como vice na chapa tucana.

O candidato a presidente pelo PSDB ganhou no Espírito Santo não só o apoio do partido, mas de outros importantes políticos capixabas, como o governador Paulo Hartung. Portanto, não há que se falar em falta de empenho na sua campanha. Novamente, é da democracia ganhar e perder eleições e vale destacar o que disse o próprio Alckmin após o pleito: “Nosso mais absoluto respeito às urnas, o resultado das urnas, à manifestação dos eleitores”.

Voltando as atenções para as campanhas do PSDB no Espírito Santo, reforçamos que não faltou empenho da direção no apoio a seus candidatos. O partido forneceu a todos material de campanha, produção para televisão, assessoria jurídica e contábil.

E o resultado disso foram os três candidatos à Assembleia Legislativa eleitos o deputado reeleito Marcos Mansur, o novato Emílio Mameri e o ex-secretário de Estado da Ciência e Tecnologia Vandinho Leite. Contudo antes mesmo do período eleitoral, alguns atores do partido, após a vitória do nosso grupo na disputa pela direção estadual, decidiram percorrer outro caminho e nós, como democratas, respeitamos esta decisão.

César Colnago é presidente do PSDB no Espírito Santo

*Publicado em A Gazeta do dia 22/10/2018

Barreiras comerciais causam US$ 1 bi de prejuízo por ano à economia do Brasil

Embora muitas vezes a adoção da prática vise a proteção dos cidadãos em setores como saúde, segurança e meio ambiente, as barreiras comerciais contra produtos de consumo acabam gerando sérios prejuízos para a economia de países exportadores. No caso do Brasil, as medidas de protecionismo impostas por outras nações à produção nacional geram um custo de quase US$ 1 bilhão por ano. Essa é a conclusão de um relatório produzido pela Confederação Nacional da Indústria (CNI).

Realizada a pedido do jornal O Globo, a análise da CNI considerou o comportamento das exportações brasileiras a partir de 13 medidas de defesa comercial aplicadas entre 2015 e 2017 e divididas em antidumping (quando o produto é vendido a um preço inferior ou igual ao país de origem, causando danos à indústria exportadora), compensatórias (ajuda do Estado ao exportador do país, como recursos e incentivos fiscais) e salvaguardas (quando são criadas barreiras, como elevação de tarifas, para proteger a indústria).

O levantamento aponta o número de proteções subindo de forma acelerada. Em 2015, eram apenas duas ações. O número passou para seis em 2016 e fechou nove no ano passado. As importações de metais (oito medidas), papel (três medidas) e açúcar (duas medidas) são as mais afetadas. Os Estados Unidos são o autor da maioria das barreiras, enquanto, em valor, a China foi quem deu mais prejuízo com a adoção de salvaguardas ao açúcar, fazendo a exportação do produto cair de US$ 757,5 milhões para US$ 54,9 milhões.

Em média, ainda de acordo com a CNI, quando uma medida é aplicada contra um produto brasileiro, as vendas desse bem para o exterior caem 86% ao longo de um período de 12 meses. Em agosto deste ano, quando foram identificadas 20 barreiras de todos os tipos, a entidade formou um grupo para debater maneiras de derrubar as medidas de protecionismo impostas por outros países ao comércio exterior do Brasil.

Para o deputado federal Otávio Leite (PSDB-RJ), os últimos governos do PT têm grande influência no fechamento dos mercados de comércio exterior ao país. “A política internacional feita pelo PT atrapalhou demais nesse ponto e no desenvolvimento e abertura de novos mercados comerciais. O acerto de acordos bilaterais fez com que o Brasil, nos últimos tempos, fosse vítima de muitas barreiras que impedem a exportação aos nossos produtos”, ressaltou.

Assim como a CNI na conclusão do estudo, o parlamentar tucano ressaltou a necessidade de gerar mais formas de apoio aos exportadores locais para mudar o panorama atual. “É preciso um esforço brutal para a renegociação de parâmetros bilaterais para facilitar o escoamento da nossa produção. Por outro lado, toda a atividade econômica que possibilite exportação de produtos e serviços merece ter um incentivo a mais, considerando que são importantes para reaquecer nossas economias internas”, indicou.

Hauly cobra ação do MDIC

Já para o deputado Luiz Carlos Hauly (PSDB-PR), o Brasil precisa adotar o princípio da reciprocidade. O parlamentar paranaense destacou a necessidade de forte posicionamento por parte do Ministério da Indústria, Comércio Exterior e Serviços (MDIC) nos casos de barreiras comerciais. Para ele, a cada nova restrição de exportação criada aos produtos brasileiros, o país precisa se impor de forma firme para que a economia nacional, já em crise, não fique ainda mais fragilizada.

O tucano salientou que o Brasil tem poder econômico suficiente para atacar as medidas desta maneira. “Chumbo trocado não dói. As barreiras econômicas tributáveis precisam ser combatidas desta forma. O Brasil tem que se posicionar no seu comércio exterior e ser muito forte na reciprocidade a esses países A cada restrição, tem que impor outra de igual intensidade com a nação que está criando a barreira para os nossos produtos e serviços”, ratificou.

Reportagem Danilo Queiroz

Educação é o desenvolvimento social que os nossos jovens precisam, por Giuseppe Vecci

Foto: Alexssandro Loyola

 

A educação em todo o país sempre foi e será um fator importante para o processo de desenvolvimento social, econômico e principalmente, pessoal. Seja ela como for, é um fator que consegue melhorar o índice de qualidade de vida de qualquer região, e nos últimos 4 anos o Estado do Goiás vem se transformando. Com maiores investimentos e uma dinamização econômica com a preocupação social, a educação é um setor que avançou consideravelmente, em relação a outros Estados do Brasil.

Para continuar tendo bons resultados na área educacional, nós precisamos assumir algumas posições por um bem maior, que é a educação dos nossos jovens. Criar oportunidades, com base para ações efetivas que possam mudar a realidade do brasileiro. Com uma boa gestão, recursos, capacitação e integração entre os meios, o rumo da educação só tende a crescer e ter mais qualidade. Mas além disso, precisamos dar continuidade no segmento e no trabalho diário.

Devemos fazer política para ajudar as pessoas, e para isso, necessitamos de gente compromissadas em trabalhar pela educação, para auxiliar outras pessoas a se desenvolverem e aumentem suas chances de conquistar sucesso profissional. Outro detalhe importante desse processo é garantir que os jovens saibam de seus compromissos com suas profissões e carreiras, baseada na ética e integridade como profissional. Mas também que tenham consciência das áreas que estão nascendo, crescendo e também das que estão acabando.

Segundo a pesquisa “Carreiras do Futuro”, realizada pelo Programa de Estudos do Futuro (Pró futuro), as profissões promissoras de nossos jovens se baseiam nas áreas de infraestrutura, sustentabilidade, saúde e qualidade de vida, direito, marketing e tecnologia da informação. Por isso, temos que incentivar, arregaçar as mangas e criar oportunidades nessas novas áreas de estudo e trabalho.

*Giuseppe Vecci é deputado federal pelo PSDB-GO.

O exemplo da África do Sul

Já pensou em viajar para a África do Sul? Este destino, que há uma década era praticamente desconhecido, tem figurado entre as principais opções mundiais, inclusive entre os turistas do Brasil. Em 2017, nosso país fechou o ano levando mais de 67 mil brasileiros ao país sul-africano, um número histórico, representando um aumento de 74,7% em relação ao ano anterior.

Os atrativos do país são inúmeros: uma natureza selvagem que pode ser vista de perto durante os safáris feitos de carro, pelo mar ou em pequenos aviões, metrópoles vibrantes e gastronomia internacional. Ainda é possível curtir um belo pôr-do-sol em um passeio de balão, apreciar exposições de moda e arte, saltar de bungee jump de uma ponte, fazer passeios históricos que contam a história do país e a trajetória de Nelson Mandela, além de conhecer as vinícolas e degustar bons rótulos ou apreciar o encontro dos oceanos Atlântico e Índico.

A diversidade cultural é outro ponto positivo para os turistas, os mais diversos tipos de shows, teatros e espetáculos são frequentes nas principais cidades. Na África do Sul, a cultura nativa e a europeia convivem diariamente, ainda que de maneira conturbada devido às heranças do Apartheid. Para os brasileiros, outra vantagem é não precisar de visto para turismo e voos diretos saindo de São Paulo.

Mas, como um país com altos índices de pobreza e criminalidade, infraestrutura precária e diversos conflitos recentes conseguiu atrair turistas e tornar o turismo uma atividade lucrativa? Atualmente, o turismo é responsável por aproximadamente 7% do Produto Interno Bruto (PIB) da África do Sul, além de empregar cerca de 3% da população sul-africana.

Pode parecer uma resposta simples, mas não passou de estratégia e investimento. O país aproveitou toda a visibilidade de sediar a Copa do Mundo em 2010 para apresentar um cenário atrativo para além de seus problemas estruturais. Somaram a isso o investimento em infraestrutura turística e a diversificação dos roteiros, com opções para todos os públicos. Por fim, mostrou outros diferenciais como preços atrativos em relação à Europa e seu povo acolhedor e hospitaleiro, características que transformaram a África do Sul em um destino único.

Por aqui, já tivemos Copa do Mundo e Olimpíadas, mas ainda não conseguimos ajustar o Custo Brasil. Somos o país com a maior biodiversidade do mundo, um litoral paradisíaco, centros urbanos agitados e uma culinária diversificada, mas precisamos fazer o dever de casa. Não podemos continuar pagando mais barato em passagens para o exterior do que para conhecer Belém, por exemplo, porque as empresas aéreas pagam ICMS de querosene para voos internos e não são cobradas em voos internacionais, num flagrante “colonialismo tributário”.

A realidade política e econômica do Brasil é favorável para que o modelo sul-africano seja seguido, enfatizando os aspectos positivos e melhorando a infraestrutura dos destinos brasileiros. É hora de ter estratégia e investimento. A cadeia turística nacional precisa se engajar na busca por melhorias e os Governos devem apresentar medidas que valorizem a atividade. Acreditar no turismo é ter a certeza de retorno exponencial, com aumento de receita e geração de empregos, como vemos hoje na África do Sul.

Nerleo Caus de Souza
Empresário e Ex Secretário de Turismo do Estado.

Bendita crise, soluções

 

É fato consolidado: o Brasil passa por uma das suas piores crises, tanto na área econômica como política. Os números não são atrativos e as projeções para os próximos meses não trazem boas perspectivas. Mas, este é o momento para olhar além do cenário desenhado. Afinal, não adianta chorar pelo que já aconteceu. É preciso reagir para mudar o que ainda está por vir.

Para isso, é temos que enxergar este momento como uma janela de oportunidades. É hora de parar, pensar e encontrar soluções criativas que coloquem municípios, estados e o país em outro patamar econômico, num futuro que se espera esteja próximo. Não é reinventar a roda, mas ter ousadia e audácia para vencer a crise.

Se olharmos para fora, é possível encontrar diversos lugares, que ao invés de dramatizar o momento econômico difícil no qual se encontravam, foram para a ação e geraram soluções. Um exemplo histórico vem dos EUA, que com série de programas implementados entre 1933 e 1937, o conhecido New Deal, conseguiram se recuperar da Grande Depressão, fortalecer a economia e recolocar o país em seu patamar de liderança.

Na história recente também não nos faltam modelos inspiradores. O governo de Israel está investindo em startups para ser referência mundial em inovação e tecnologia. A Irlanda reduziu salários dos funcionários públicos, restringiu benefícios sociais e aumentou o imposto sobre valor agregado, assim como Portugal. A França, que evitou a austeridade fiscal, ajustes e reformas, ativou a economia com medidas simples como a abertura de comércios nos domingos e feriados.

No Brasil, precisamos aumentar nossa capacidade de reação e reconhecer que vivemos além das nossas possibilidades. É necessário regressar ao nível básico para que os problemas, que já são estruturais, não se tornem ainda mais graves. Para recomeçar, nada melhor do que resgatar a ética no trato da coisa pública. É partindo de princípios morais básicos que conseguiremos compartilhar oportunidades e promover, por exemplo, a tão necessária reinserção da classe média na economia do país.

São essas famílias que puxam o consumo. É dando espaço para elas que passa a nossa “revolução” econômica. Caminhos nós temos. Fim de privilégios, igualdade de oportunidades, educação de qualidade que será revertida em produtividade, estimulação ao empreendedorismo. Precisamos, sem demora, é transformar a crise em soluções.

Nerleo Caus de Souza