PSDB – ES

artigo

“Maioria e minoria na dinâmica democrática”, por Marcus Pestana

Foto Orlando Brito

Desde que o mundo é mundo, a sociedade busca a melhor forma de conduzir seus destinos. Para que a vida compartilhada por pessoas e segmentos sociais diferentes seja possível, é inevitável a construção de um conjunto de regras, instituições, práticas, ritos, consensos e pactos. Da Eclésia grega até a configuração das democracias contemporâneas, experimentamos as mais variadas formas de dirigir os assuntos e os negócios de Estado.

A grande ideia vitoriosa no século XXI é a da liberdade. A concepção de que a democracia é um valor permanente e universal consolidou-se como amplamente hegemônica.

A democracia, como invenção humana, é, por definição, imperfeita. Mas carrega uma dinâmica autocorretiva por meio de um contínuo processo de tentativa, erro, síntese e avanços.

Isso pressupõe um acordo em que múltiplos atores aceitam e legitimam a diversidade de visões e erguem um pacto de respeito mútuo e observância das regras do jogo. Portanto, democracia não é o governo da maioria eventual para seu exercício absoluto e ilimitado. É o governo da maioria que respeita e reconhece a minoria. Não pode existir espaço para que o jogo se assemelhe à ironia fina de Millôr Fernandes: “Democracia é quando eu mando em você, ditadura é quando você manda em mim”.

Dentro da dinâmica democrática, assumem centralidade a independência dos Poderes, a Constituição como lei maior, a alternância no poder e a liberdade como valor permanente, ela, sim, absoluta. E é no Congresso que pluralidade e diversidade se manifestam. Lá é a Casa onde maioria e minoria se encontram, dialogam, digladiam, polemizam, debatem e deliberam. Nenhum governo eleito pode tudo. Há limites constitucionais, legais e institucionais. E há limites políticos que demandam a formação de maioria parlamentar para as coisas avançarem.

No processo de formação da maioria necessária, vários caminhos se combinam: capacidade de liderança, clareza do rumo, persuasão, convencimento, cooptação, negociação, autoridade, habilidade, sensibilização e mobilização da opinião pública. Não há presidente da República ou primeiro-ministro que possa, na democracia, governar solitária e unilateralmente. No mais longo período democrático de nossa história (1985-2019) já ocorreram dois impeachments por falta de apoio parlamentar: Collor (1992) e Dilma (2016).

Ainda assim, a democracia brasileira se demonstra sólida e consolidada, exatamente em função da alternância no poder e do respeito e convivência entre os diferentes. Já tivemos a esquerda no poder (Lula e Dilma), em outros momentos governos de centro (Fernando Henrique Cardoso, José Sarney, Itamar Franco e Michel Temer), e agora um governo assumidamente de direita. E o país, mal ou bem, continua funcionando, as instituições estão fortalecidas, e a Constituição é a baliza. Como disse o ex-ministro Raul Jungmann certa vez: “Dentro da Constituição, tudo; fora dela, nada”.

Volto ao assunto na próxima semana. O jogo começou. O presidente Jair Bolsonaro tomou posse. Sua equipe começa a esboçar as primeiras propostas. Rodrigo Maia se elegeu, por larga maioria, presidente da Câmara dos Deputados. David Alcolumbre, em tumultuado processo, foi alçado à presidência do Senado Federal.

O sucesso ou o fracasso do projeto governamental dependerá de sua capacidade de formar maioria. E esta não é tarefa trivial e simples. Assunto para o próximo sábado.

Por Marcus Pestana

Primeiro Secretário da Executiva Nacional do PSDB e ex-deputado federal

Artigo publicado originalmente no jornal O Tempo na edição do dia 09 de fevereiro de 2019

Decifra-me ou te devoro

A semana que acabou ontem foi plena de tensão, demonstrando a quem não percebera antes a profundidade das dissensões que vêm de há muito tempo

FERNANDO HENRIQUE CARDOSO*, O Estado de S.Paulo

03 Junho 2018 | 03h00

A semana que acabou ontem foi plena de tensão, demonstrando a quem não percebera antes a profundidade das dissensões que vêm de há muito tempo. As incongruências da política econômica dos governos de Lula e Dilma, em sua fase final, já haviam levado a economia à paralisação e o sistema político a deixar de processar decisões. Daí o impeachment do último governo, ainda que baseado em arranhões de normas constitucionais.

Todo impeachment é traumático. Fui ministro de um governo que resultou de um impeachment, o do presidente Itamar Franco. Este, com sabedoria, percebeu logo que precisaria de um Ministério representativo do conjunto das forças políticas. Como o PT, que apoiara o impeachment do presidente Collor, se recusava a assumir responsabilidades de governo (com olho eleitoral), Itamar conseguiu a aceitação de uma pasta por Luiza Erundina, então no PT. Mesmo eu, eleito presidente por maioria absoluta no primeiro turno sem precisar buscar o apoio do PT, tive como um de meus ministros um ex-secretário-geral do PT.

De lá para cá os tempos mudaram. A possibilidade de algum tipo de convivência democrática, facilitada pela estabilização econômica graças ao Plano Real, que tornou a população menos antigoverno quando viu em marcha uma política econômica que beneficiaria a todos, foi substituída por um estilo de política baseado no “nós”, os supostamente bons, e “eles”, os maus. Isso somado ao descalabro das contas públicas herdado pelo governo atual, mais o desemprego facilitado pela desordem financeira governamental, levou a uma exacerbação das demandas e à desmoralização dos partidos. A Lava Jato, ao desnudar as bases apodrecidas do financiamento partidário pelo uso da máquina estatal em conivência com empresas para extrair dinheiro público em obras sobrefaturadas (além do enriquecimento pessoal), desconectou a sociedade das instituições políticas e desnudou a degenerescência em que o País vivia.

A dita “greve” dos caminhoneiros veio servir uma vez mais para ignição de algo que estava já com gasolina derramada: produziu um contágio com a sociedade, que, sem saber bem das causas e da razoabilidade ou não do protesto, aderiu, caladamente, à paralisação ocorrida. Só quando seus efeitos no abastecimento de combustíveis e de bens essenciais ao consumo e mesmo à vida, no caso dos hospitais, se tornaram patentes houve a aceitação, também tácita, da necessidade de uma ação mais enérgica para retomar a normalidade.

Mas que ninguém se engane: é uma normalidade aparente. As causas da insatisfação continuam, tanto as econômicas como as políticas, que levam na melhor das hipóteses à abstenção eleitoral e ao repúdio de “tudo o que aí está”. Portanto, o governo e as elites políticas, de esquerda, do centro ou da direita, que se cuidem, a crise é profunda. Assim como o governo Itamar buscou sinais de coesão política e deu resposta aos desafios econômicos do período, urge agora algo semelhante.

Dificilmente o governo atual, dada a sua origem e o encrespamento político havido, conseguirá pouco mais do que colocar esparadrapos nas feridas. Nada de significativo será alcançado sem que uma liderança embasada no voto e crente na democracia seja capaz de dar resposta aos atuais desafios econômicos e morais. Não há milagres, o sistema democrático-representativo não se baseia na “união política”, senão que na divergência dirimida pelas urnas. Só sairemos da enrascada se a nova liderança for capaz de apelar para o que possa unir a Nação: finanças públicas saudáveis e políticas adequadas, taxas razoáveis de crescimento que gerem emprego, confiança e decência na vida pública.

É por isso que há algum tempo venho pregando a união entre os setores progressistas (que entendam o mundo e a sociedade contemporâneos), que tenham uma inclinação popular (que saibam que, além do emprego, é preciso reduzir as desigualdades), que se deem conta de que o mundo não mais funciona top/down, mas que “os de baixo” são parte do conjunto que forma a Nação, e que, em vez de se proporem a “salvar a pátria”, devem conduzi-la no rumo que atenda, democraticamente, com liberdade, aos interesses do povo e do País.

Não se trata de formar uma aliança eleitoral apenas, muito menos de fortalecer o dito “centrão”, um conjunto de siglas que mais querem o poder para se assenhorearem de vantagens do que se unir por um programa para o País. Nas democracias é natural que os partidos divirjam quando as eleições majoritárias se dão em dois turnos, quando os “blocos sociais e políticos” podem ter mais de uma expressão partidária. Mas é preciso criar um clima que permita convergência. E, uma vez no caminho e no exercício do poder, quem represente esse “bloco” precisará ter a sensibilidade necessária para unir os que dele se aproximam e afastar o risco maior: o do populismo, principalmente quando já vem abertamente revestido de um formato autoritário.

Na quadra atual, entre o desemprego e a violência cada vez mais assustadora do crime organizado, a perda de confiança nas instituições é um incentivo ao autoritarismo. O bloco proposto deve se opor abertamente a isso. Não basta defender a democracia e as instituições, é preciso torná-las facilitadoras da obtenção das demandas do povo, saber governar, não ser leniente com a corrupção e entender que sem as novas tecnologias não há como atender às demandas populares crescentes. E, principalmente, criar um clima de confiança que permita investimento e difundir a noção de que num mundo globalizado de pouco vale dar as costas a ele.

Tudo isso requer liderança e “fulanização”. Quem, sem ser caudilho, será capaz de iluminar um caminho comum para os brasileiros? “Decifra-me ou te devoro”, como nos mitos antigos.

*SOCIÓLOGO, FOI PRESIDENTE DA REPÚBLICA

Águas de março

Por Ricardo Ferraço, senador da República pelo PSDB-ES

O Brasil vai deixando para trás a grave recessão econômica que tantos prejuízos causou aos capixabas e demais brasileiros. A renda per capita nacional acumulou queda de 11% em onze trimestres desde 2014, superando até os 7,5% da “década perdida” (1981 a 1992). Já o Espírito Santo, diferentemente da média dos demais Estados nos últimos anos, cuidou das contas públicas com enorme responsabilidade, seguramente sinalizando um 2018 muito positivo para as atividades pública e privada.

Enquanto a média dos Estados brasileiros está mergulhada em fortes desequilíbrios fiscais, o governo Paulo Hartung anuncia um ousado programa de investimentos da ordem de R$ 1 bilhão para este ano. Essa capacidade de caixa vai melhorar a vida dos capixabas em áreas vitais, aplicando recursos em infraestrutura, educação, segurança, atividades sociais e expansão de leitos hospitalares. Além de importante para resgatar assistência e bons serviços para os cidadãos, é um robusto programa gerador de empregos e oportunidades.

Depois de necessária reestruturação e de uma arrumação de casa em função da conjuntura adversa, o momento é de partilhar os ganhos coletivos e sociais. Afinal, cuidar das contas públicas é fundamental para quem quer cuidar das pessoas. Sem isso, não haveria recursos para investir nas necessidades do dia a dia. Além disso, é para lá de razoável e gratificante ver nossos funcionários públicos recebendo rigorosamente em dia, diferentemente de outros Estados. Governo que não cuida das contas não tem capacidade de investimento, gasta tudo o que arrecada para a sua manutenção.

Certamente, é preciso reconhecer os enormes desafios presentes em nosso Espírito Santo. São complexos e continuam a exigir de nós muito trabalho e esforço, mas isso não nos impede de comemorar a boa condição do Espírito Santo em relação aos demais entes federativos.

Para além das boas notícias no campo público, a boa governança do Executivo capixaba, a estabilidade fiscal e a segurança em relação a regras contratuais estimulam e motivam, neste ano, anúncio de grandes projetos também no segmento privado. São empreendimentos estratégicos, também geradores de emprego e renda.

Exemplos: a licença de instalação do Porto Central, o anúncio da expansão de Portocel em Aracruz e a retomada das atividades da Samarco. A capixaba Autoglass acaba de anunciar investimentos da ordem de R$ 226 milhões no Estado e abrirá mil vagas de emprego.

Finalmente, neste mês de março será inaugurado o novo aeroporto de Vitória, aguardado há anos. Além de dar suporte à nossa infraestrutura logística e ser instrumento de competitividade econômica, essa obra consolida o respeito aos capixabas diante da imensa contribuição do Espírito Santo ao desenvolvimento nacional.

Após três anos da mais dura seca dos últimos 80 anos, causadora de angústias e perdas aos agricultores, temos uma perspectiva de melhora, a partir da normalização do regime de chuvas em 2018. A previsão é de até 30% de crescimento da produção do café no Estado este ano. Essa retomada devolve empregos e maior distribuição de renda a um dos maiores arranjos produtivos e sociais do Estado.

Portanto, os resultados positivos nos motivam a continuar trabalhando por mais investimentos e realizações. Equilíbrio fiscal não é estatística, é devolver o Estado à sociedade, sua legítima dona.

*Publicado originalmente no jornal A Tribuna desta sexta (16)