E 25 anos se passaram. Parece que foi ontem. Lembro que era vereador e presidente do PSDB de Juiz de Fora em 5 de outubro de 1988. Eram mais ou menos sete e meia da noite e, na avenida Rio Branco, artéria central de minha cidade, resolvi parar para um chope no balcão do bar de um amigo. A TV estava virada para mim e transmitia o discurso do “comandante” Ulysses Guimarães promulgando a “Constituição cidadã”.
“Não nos desencaminhamos na longa marcha, não nos desmoralizamos, não desertamos, não caímos no caminho”, disse Ulysses. “Traidor da Constituição é traidor da pátria, (…) promulgamos o estatuto do homem, da liberdade e da democracia, bradamos por imposição de sua honra: temos ódio à ditadura. Ódio e nojo. (…) A sociedade com Teotônio Vilela, na anistia, libertou e repatriou. A sociedade foi Rubens Paiva, não os facínoras que o mataram. (…) Foi a sociedade, mobilizada nos colossais comícios das Diretas Já, que, pela transição e pela mudança, derrotou o Estado usurpador. (…) A nação quer mudar. A nação deve mudar. A nação vai mudar. A Constituição pretende ser a voz, a letra, a vontade política da sociedade rumo à mudança. Que a promulgação seja o nosso grito”. Em tempos tão bicudos, que saudade, Ulysses!
As lágrimas do militante pela democracia, em pé, tomando chope, numa avenida do interior de Minas, foram inevitáveis. Chegávamos a bom porto numa etapa da utopia coletivamente construída tendo à frente nosso grande timoneiro.
Lembro quando entrei na vida pública, aos 16 anos, como líder estudantil ligado aos movimentos católicos inspirados pela Teologia da Libertação e, depois, à esquerda organizada. A frente democrática tinha um programa mínimo: anistia ampla, geral e irrestrita; constituinte livre e soberana; e eleições diretas para presidente da República. Essa era nossa agenda, essa era nossa utopia.
Vencemos. A duras penas e com o sacrifício de muitos, vencemos. A Constituição cidadã de 1988 e as eleições diretas em 1989 premiaram nosso esforço. A constituinte foi o estuário de nossas aspirações. Mais do que uma democracia adjetiva, conquistamos o maior e mais profundo ciclo de liberdade da história brasileira, os direitos coletivos materializados no SUS, no seguro desemprego, entre tantas outras conquistas.
Fui diretor do Comitê Brasileiro da Anistia, coordenador da Diretas Já e do Comitê por uma Constituinte Livre e Soberana, em minha cidade. O 5 de outubro, em seus 25 anos, não poderia passar em branco. Dizem que o Brasil é um país sem memória e onde até o passado é imprevisível.
A Constituição de 1988 tem suas distorções. Mas ao pensarmos em mudá-la, pensemos sempre na herança e no legado que nos deixaram Ulysses Guimarães, Mário Covas, Teotônio Villela, Franco Montoro e tantos outros protagonistas da redemocratização brasileira. Que saudade, vocês estão fazendo falta num país tão corroído pela corrupção e pela falta de amor à pátria.
Artigo publicado no jornal O Tempo em 14-10-13