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Artigos e Entrevistas

Um governo ‘padrão Taiti’, análise do Instituto Teotônio Vilela

Fabio-Pozzebom-ABr-010713-300x199Dilma Rousseff continua em seu castelo, alheia à realidade. A única resposta que consegue formular ao clamor das ruas é um plebiscito que não resolve nada e, ao que tudo indica, não terá como prosperar no Congresso. A presidente acha que seu governo é “padrão Felipão”. Mais adequado, porém, é classificá-lo como de “padrão Taiti”, a seleção que tomou 24 gols em três jogos na Copa das Confederações.

Os atos de governo da presidente são o retrato acabado da ineficiência, a exemplo da inócua reunião ministerial realizada ontem – a terceira desde que tomou posse. Dilma juntou 36 dos seus 39 ministros no Palácio do Planalto. Provavelmente, sequer o nome de todos os presentes ela sabia. Muitos ali estavam vendo a chefe pessoalmente pela segunda ou terceira vez. Seleção que presta não joga assim.

Como era de se esperar, a sessão plenária não produziu nada de importante, além de arremedos de frases de efeito sopradas pelo marqueteiro que a presidente destilou em rara entrevista à imprensa. Ela anunciou que “não fará demagogia” e “não cortará cargos que não ocupa”. É a velha Dilma de sempre: pensamentos sem sentido, ações desconjuntadas, palavras ao vento e nenhuma ação que valha.

A presidente poderia largar de lado o blábláblá. Ninguém está propondo a ela que corte vento, mas simplesmente que tome as medidas certas. Um governo composto por 39 ministérios – algo só inferior ao Sri Lanka em todo o mundo – e 22 mil cargos de confiança – todos fartamente ocupados pelos apaniguados do poder – tem muita gordura para queimar.

Ao fim do governo Fernando Henrique, o país tinha 24 pastas e funcionava muitíssimo bem. Lula deu início ao inchaço, criando 11 ministérios. Dilma já espetou mais quatro órgãos na Esplanada. Tudo leva a crer que o governo funcionaria bem melhor com metade do tamanho que tem hoje.

Apenas na Presidência da República estão penduradas 14 secretarias e lotados algo como 4 mil comissionados. Para carregar esta máquina paquidérmica, o governo gasta R$ 192,8 bilhões por ano somente para pagar o salário de quase 1 milhão de servidores, mostrou O Globo ontem. Quando se consideram todas as despesas de custeio, o gasto anual do Executivo sobe para R$ 611 bilhões.

A execução orçamentária que interessa o governo petista não consegue fazer. Na atual gestão, os dispêndios com saúde, educação, segurança e mobilidade são, sistematicamente, menores que os do governo Lula. O caso mais gritante é o dos transportes, em que apenas 8% do orçado desde 2011 foi investido.

O Valor Econômico mostra hoje que, neste ano, foram gastos R$ 3 bilhões de um total de R$ 13 bilhões em obras pelo Dnit, frustrando a promessa feita pelo governo de que este seria “o ano” para os investimentos públicos no setor. Como se vê, com o PT o que era ruim pode ficar ainda pior.

Ontem, mais uma vez, Dilma sinalizou que pretende viabilizar investimentos e, para tanto, pensa em fazer “ajustes” nas contas do governo. Não disse como, mas na sua balofa e derrotada seleção parece que não será. Seu ministro da Fazenda, contudo, já indicou quem é que vai pagar a conta: o meu, o seu, o nosso dinheiro de contribuinte.

Em entrevista publicada por O Globo no domingo, Guido Mantega disse que pode aumentar impostos para bancar as novas despesas que vêm sendo criadas. Isso depois de o governo petista distribuir pencas de benesses tributárias para setores eleitos e conceder empréstimos em condições camaradas a empresas amigas. Deve ser porque o PT não tem lá muito apreço pela classe média, como vocalizou Marilena Chauí recentemente…

Dilma Rousseff pode continuar sonhando em ver sua equipe de governo jogando o futebol-arte que a seleção de Felipão pôs em campo na Copa das Confederações. Mas, com um time formado por 39 cabeças de bagre, o mais provável é que ela continue perdendo de goleada, num padrão capaz de deixar o Taiti no chinelo.

“O confisco da esperança”, análise do Instituto Teotônio Vilela

Dilma-Foto-Antonio-Cruz-ABr2-300x208Dilma Rousseff está pagando o preço pela forma como conduziu o país até hoje. Durante dois anos e meio de mandato, a presidente acreditou que a alta popularidade lhe serviria de salvo-conduto para não tomar as medidas corretas, delongar-se em decisões importantes e tratar com arrogância as críticas. Fará um bom serviço ao país se pelo menos impedir que as coisas continuem a piorar tanto.

Pesquisas de opinião publicadas no fim de semana trouxeram um duro choque de realidade para a presidente: o povo que foi para as ruas demonstra uma insatisfação disseminada, antes difusa, mas agora amplamente manifesta. Dilma perdeu popularidade e também capital eleitoral. Seu futuro político turvou-se.

A avaliação positiva do governo da presidente caiu pela metade, considerada a margem de erro do Datafolha, em apenas 20 dias: era de 65% em março, desceu a 57% no início de junho e desabou para 30% agora.

Foi a mais rápida queda de popularidade de um presidente da República desde que Fernando Collor de Mello confiscou a poupança dos brasileiros, em 1990. Dilma parece ter feito pior: confiscou a esperança do povo.

A desaprovação a Dilma se expressa de forma específica e concreta. Os brasileiros estão vendo com crescente ceticismo o futuro, as perspectivas da economia e as chances de que a vida melhore. A avaliação positiva da gestão econômica caiu de 49% para 27%. Mais pessoas acham que a inflação e o desemprego vão subir e o poder de compra dos salários vai cair.

Ao resultado da pesquisa sobre a avaliação do governo, publicada no sábado, se somou o de intenção de voto na eleição presidencial do ano que vem, conhecido ontem. Nesta, Dilma perdeu 21 pontos: os que dizem pretender votar pela reeleição dela somam hoje apenas 30%, ante 51% somente 20 dias antes.

Tudo considerado, temos uma demonstração inconteste de que a população percebeu que está diante de um governo fantasma. Falta solidez à gestão de Dilma, são rarefeitas as perspectivas positivas em razão do pouco que a presidente conseguiu construir nestes 30 meses até agora. O percentual dos que consideram sua gestão “ruim” ou “péssima” passou de 7% em março para 9% no início de junho e quase triplicou agora, para 25%.

Quem parar para pensar vai ver que este é um governo que praticamente não existiu. Dilma foi eleita vestida na fantasia de competente gestora que iria fazer e acontecer. Sua experiência pregressa como “mãe do PAC” não fornecia razões para acreditar em tamanha fabulação, mas o marketing excessivo cuidou de resolver as coisas.

Já no cargo, a presidente deixou de lado a fantasia e encampou um novo figurino: o de “faxineira” da ética. Gastou seu primeiro ano pondo nada menos que sete ministros para correr, varrendo para debaixo do tapete a sujeira que recebera de herança de Lula e com a qual ela mesma colaborara, ainda na condição de ministra-chefe da Casa Civil.

O segundo ano foi de intenso bate-cabeça, com a presidente tomando decisões e logo voltando atrás, fazendo e desfazendo. Ministérios importantes como o dos Transportes simplesmente travaram. Até deliberações corretas, como a das privatizações de infraestrutura, consumiram meses de titubeio. Por isso, até hoje continuam sem sair do papel.

Na gestão da economia, Dilma deixou corroer a credibilidade que o país passara anos construindo. Permitiu o desmonte da política fiscal responsável, liberou a criatividade da equipe econômica e, pior de tudo, tratou a inflação como bichinho de estimação.

Quando os problemas começaram a se revelar, Dilma simplesmente lançou-se em sua campanha reeleitoral, acreditando que poderia empurrá-los com a barriga até que o segundo mandato estivesse no papo. Fiava-se nos seus altos patamares de popularidade.

Constata-se que Dilma gastou tempo precioso do país num projeto vazio. Cuidou, tão somente, de tentar preservar seu capital eleitoral, sem dedicar-se a resolver os problemas da população. Mostrou, sentada na cadeira da presidência da República, o pouco ou nenhum tino que possuiu para lidar com um país com as dimensões do Brasil.

A petista ainda tem um ano e meio pela frente. Se pelo menos dedicar-se a evitar que a situação do país se degringole ainda mais, já prestará um grande serviço aos brasileiros. Se continuar agindo como agiu até hoje, Dilma Rousseff arrisca-se a passar para a história como a presidente que mais mal fez ao Brasil. O país do futuro ficará atado ao passado.

“Classe média”, por Aécio Neves

Aecio-Neves-Foto-George-Gianni-21-300x199Se os partidos brasileiros, sem exceção, saem politicamente abalados do saudável vendaval de passeatas no país, um deles certamente se ressente mais: o PT.

A presença maciça da classe média no movimento de protesto coloca em xeque, com mais ênfase, as contradições do partido.

Pressionado a oferecer respostas ao país, o governo federal improvisou uma constituinte restrita, rapidamente abandonada, e busca, por meio da proposta de um plebiscito de complexa elaboração, aprovar uma agenda que interessa muito mais ao PT do que ao Brasil.

Assim, o governo federal patrocina manobras que visam tirar o foco das legítimas reivindicações apresentadas pela população, oferecendo justamente mais daquilo de que os brasileiros demonstram estar fartos: desrespeito.

No recente evento dos dez anos do PT, a filósofa petista Marilena Chaui afirmou, sob aplausos, que odiava a classe média. E explicou: “A classe média é estupidez. É o que tem de reacionário, conservador, ignorante, petulante, arrogante, terrorista. É uma abominação política, porque ela é fascista, uma abominação ética, porque ela é violenta, e é uma abominação cognitiva, porque ela é ignorante”.

O leitor ficou chocado? O vídeo está no YouTube. Juntando-se essa fala raivosa e os protestos nas ruas, a conclusão é inevitável: o PT não gosta da classe média e por ela parece estar sendo correspondido na rejeição.

Os jovens questionam a forma tradicional de fazer política quando gritam: “O povo unido governa sem partido”. A grande maioria deles nada tem de fascistas ou reacionários. Estão apenas expressando suas compreensíveis frustrações. Os manifestantes se insurgem contra os aproveitadores que viraram políticos, políticos que se elegeram governantes, governantes que se esbaldaram na corrupção, corrupção que impede a melhoria do transporte, da saúde e da educação. Uma ciranda como no poema de Drummond cujo nome é “Quadrilha”, muito a propósito.

Um bom contraponto à intolerância de Marilena Chaui é um texto do ex-presidenteFernando Henrique Cardoso, de 2011. Nele, foi enfatizada a necessidade de maior diálogo com a classe média: “O caminho não se constrói apenas por partidos políticos, nem se limita ao jogo institucional. Ele brota também da sociedade, de seus blogs, tuítes, redes sociais, da mídia, das organizações da sociedade civil, enfim, é um processo coletivo. Não existe só uma oposição, a da arena institucional; existem vários focos de oposição, nas várias dimensões da sociedade”.

Com 82 anos de idade, Fernando Henrique com certeza faria bonito na avenida Paulista, na Rio Branco ou na Afonso Pena dos dias de hoje.

“Baratas tontas”, análise do Instituto Teotônio Vilela

Dilma-Foto-Antonio-Cruz-ABr2-300x199Dilma Rousseff está completando dois anos e meio no cargo. Nunca antes se mostrou tão inapta para a cadeira que ocupa. Nunca antes exibiu tamanha ignorância quanto ao que fazer, tanta indefinição a respeito de quais rumos tomar. Nunca antes o país pareceu tanto estar sendo governado por uma equipe formada por tantas baratas tontas.

Fazer e desfazer medidas, tomar decisões e logo voltar atrás tornou-se uma lastimável rotina na gestão da petista. Em muitas ocasiões, a inépcia foi relevada, numa espécie de gesto de boa vontade com a presidente. Mas isso torna-se simplesmente inaceitável quando acontece no momento em que o país está em crise, mergulhado em protestos e envolto em insatisfação generalizada.

Dilma voltou ontem atrás na esdrúxula proposta de convocar uma constituinte para fazer uma reforma política, lançada por ela apenas um dia antes. Resta a pergunta: a constituinte com cheiro de golpe bolivariano foi apenas uma tentativa de desviar o foco da pressão das ruas ou foi, na realidade, a mais rematada comprovação de que a presidente não sabe o que faz?

O bater de cabeças no governo dela é sonoro. As propostas para enfrentar a crise, se é que podem ser chamadas assim, passam longe do que a população realmente clama para enfrentar suas dificuldades cotidianas. A impressão que fica é de uma gestão devotada à empulhação: Surgiu um problema? Desvie-se a atenção, quem sabe ele desaparece?
Depois que a lambança da constituinte foi ampla, geral e irrestritamente rechaçada, os ministros mais próximos à presidente tentaram empurrar ao distinto público a história de que Dilma não disse o que disse. Pelo jeito, 120 milhões de pessoas estavam erradas e só ela e seus sábios estavam certos…

O recuo teria sido, segundo gente como Aloizio Mercadante e José Eduardo Cardozo, resultado de uma “má interpretação” das palavras – sempre clarividentes, aliás – de Dilma. O vice-presidente Michel Temer chegou a afirmar que tudo não passou de um “problema redacional”. Quer dizer que a presidente da República também não lê o que assina? Fala sério!

Dilma é habituée em expressar-se mal. Suas frases são desconexas; suas palavras, imprecisas; suas reais intenções, uma incógnita. Enquanto foi apenas uma questão de má comunicação, muita patacoada dela foi perdoada. Mas o problema ganha outra dimensão quando se constata que tais fragilidades exprimem e sintetizam a total incapacidade de Dilma para o exercício do cargo de presidente da República.

No afã de desvencilhar-se do beco sem saída em que sua gestão enfiou o país, e para o qual o Brasil agora acordou, Dilma e seus auxiliares lançam mão da primeira ideia que lhes vem à cabeça. É a política do “se colar, colou”. E é, também, uma velha prática do PT: mudar de assunto para tentar se livrar dos abacaxis, como aconteceu na época do mensalão. A questão é que, na dura vida real, problemas não somem com passes de mágica ou truques de marketing.

A proposta da constituinte – para a qual Mercadante ontem se deu conta de que “não há tempo hábil” e o próprio vice-presidente considerou “rompimento da ordem jurídica” – deu em nada. Mas o governo petista insistirá em seu arremedo de democracia direta: a ideia agora é fazer a reforma política por meio de plebiscito. Por quanto tempo a nova tese irá perdurar?

O que é preciso deixar claro é que qualquer reforma política, por melhor que seja, não resolverá o que, cobertos de razão, os brasileiros pedem nas ruas. Não acabará com a corrupção – a derrubada da PEC 37 é apenas um bom começo – e com a má gestão do dinheiro público, marcas indeléveis da gestão Dilma. Não melhorará os serviços de saúde, a qualidade da nossa educação, a precariedade da segurança pública.

A presidente faz o país perder tempo precioso discutindo o que não é o mais relevante. Reforma política é até importante, mas não é a panaceia na qual o PT quer, desesperadamente, transformá-la, a fim de fugir dos protestos e das reivindicações oriundas das ruas. Uma coisa é certa: tratar um assunto quase incompreensível para o grosso da população – que inclui, entre outros temas, adoção de voto distrital e voto em lista – por meio de plebiscito está longe de ser a forma adequada de enfrentar os graves problemas do país.

“Se fosse perguntar num plebiscito se as pessoas querem ou não reforma política, muitas iriam dizer que apoiam sem entender do que se trata. O plebiscito não se aplica. É uma questão muito séria, da qualidade do voto, para ser tratada dessa forma”, comenta Maria Celina d’Araújo n’O Globo. “O povo nas ruas não está falando de constituinte.”

Em poucas horas, Dilma Rousseff conseguiu uma façanha: piorar muito o que já parecia ter chegado ao limite do insuportável. Apresentou uma proposta que, no fim das contas, visava mesmo era ludibriar o desejo de participação popular expresso pelos brasileiros nas últimas semanas. Conseguiu, assim, produzir um atestado de que seu governo, além de ser composto por um monte de baratas tontas, é um verdadeiro barata-voa.

“Dilma em sua fantasia de manifestante”, análise do Instituto Teotônio Vilela

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“Numa época em que as ações se desenrolam na alucinante velocidade das redes sociais, a presidente demorou uma eternidade para dizer a que veio”

Dilma Rousseff chegou à presidência da República vestida de gerente. Logo em seu primeiro ano de governo, foi obrigada a trocar a indumentária pelo figurino de faxineira empenhada em varrer a corrupção – ainda que para debaixo do tapete. Agora, ela apela para a fantasia de manifestante que, como os milhares que ocupam as ruas, também quer mudar o Brasil. A quem pensa que engana?

Na sexta-feira, depois de quase duas semanas de manifestações, a presidente convocou cadeia nacional de rádio e televisão para se pronunciar sobre os protestos que estão fazendo o Brasil tremer. Finalmente deu ao instrumento – do qual abusa para fins eleitoreiros – o uso devido. Mas, numa época em que as ações se desenrolam na alucinante velocidade das redes sociais, Dilma demorou uma eternidade para dizer a que veio. E disse muito pouco.

Seu pronunciamento de dez minutos usou o velho estratagema petista de confundir e não explicar. Sempre que se vê em apuros, o PT transmuta-se em pêndulo: é governo, mas parece oposição. No poder, tem a responsabilidade de resolver problemas, mas dá um jeito de aparecer cobrando, como quem não dispõe da caneta. É oportunismo puro e da pior espécie.

Dilma diz que, ouvindo o clamor das ruas, é possível fazer “melhor e mais rápido muita coisa que o Brasil ainda não conseguiu realizar por causa de limitações políticas e econômicas”. Primeiro: as ruas não querem apenas algo melhor; querem também, e principalmente, algo que seja diferente do que aí está.

Há reivindicações pontuais que funcionaram como estopim dos protestos, como a redução do preço das passagens de ônibus. Mas há demandas mais gerais que indicam a exaustão de uma rota, a rejeição de um jeito de fazer política, o clamor por uma forma mais honesta, correta e eficiente de cuidar das necessidades dos cidadãos e bem aplicar o dinheiro que eles pagam de imposto.

Segundo: um partido que caminha para completar seu 11° ano no poder tem como falar que não teve como fazer as melhorias que o país quer? Para início de conversa, estamos há anos sem ver o poder central propor uma reforma sequer de vulto para o país. De remendo em remendo, chegamos onde estamos. Dilma desperdiçou todo o seu capital político sem ousar nada, mudar nada, avançar nada.

O pronunciamento também veio recheado de mistificações. Dilma disse que não abre mão do mesmo “combate sistemático à corrupção e ao desvio de recursos públicos” que as ruas reclamam. O que ela tem a dizer sobre os muitos ex-faxinados que foram, pouco a pouco, reocupando seus espaços nos ministérios transformados em feudos partidários?

Dilma fala em transparência no mesmo momento em que seu governo torna sigilosa a divulgação de gastos da comitiva presidencial em nababescas viagens internacionais. Fala em reforma política, quando seu partido tenta fechar as portas para novas siglas no Congresso, sua base parlamentar busca manietar o Ministério Público e sujeitar decisões do Supremo à chancela do Legislativo.

A presidente promete melhoria na prestação de serviços públicos, mas o máximo que consegue é forjar mais medidas inócuas e sem a mínima capacidade de responder aos reais anseios da população, como a importação de médicos.

Para a melhoria do transporte urbano, propõe a elaboração de um “plano nacional”, a partir de um “grande pacto” com governadores e prefeitos. Para embromar de vez, só faltou criar um grupo de trabalho, mas nem seria necessário: o tal programa já está previsto no PAC, mas de 167 obras previstas concluiu apenas duas até hoje, mostra hoje o Valor Econômico.

Além de mistificações, a fala da presidente contém mentiras, como quando afirma que não há dinheiro público nas obras da Copa. “Segundo o próprio ministério [do Esporte], a previsão é que os investimentos para o Mundial alcancem R$ 33 bilhões, com os governos federal, estaduais e municipais custeando 85,5% das obras”, informou a Folha de S.Paulo na semana passada.

Nesta segunda-feira, a fim de tentar mostrar que está agindo, a presidente receberá governadores e prefeitos de grandes cidades. Provavelmente, tentará dividir com eles a fatura da crise, transformando-os também em vidraça. Na hora dos louros, o governo petista apresenta-se absoluto; na hora do apuro, socializa os prejuízos.

Antes, Dilma conversará com a moçada do Movimento Passe Livre, provavelmente tentando dar um sinal de que dialoga com “os líderes das manifestações pacíficas, os representantes das organizações de jovens, das entidades sindicais, dos movimentos de trabalhadores, das associações populares”. A presidente talvez ignore que este é um movimento cujo principal traço é justamente rechaçar quaisquer lideranças. Ao Planalto, só acorrerão os movimentos que o PT domesticou com anos de mesada.

Em seu pronunciamento à nação, a presidente pelo menos acertou ao defender a preservação da ordem e a garantia de manifestação dos que protestam pacífica e democraticamente. Sua resposta, porém, não está à altura do clamor por mudanças que a imensa maioria dos que estão indo às ruas quer. Dilma Rousseff continua a encenar fantasias. Mas o único figurino que não consegue vestir é o de governante capaz de construir um país melhor.

Alvaro Dias comenta pronunciamento da presidente Dilma Rousseff

O senador Alvaro Dias (PSDB-PR) comentou o pronunciamento que a presidente Dilma Rousseff realizou na noite de sexta-feira (21). Leia abaixo as declarações do parlamentar.

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Álvaro Dias / foto: George Gianni

Esse modelo de discurso levou o povo às ruas. Palavras soltas ao vento, promessas não cumpridas e mentiras reiteradas no discurso ufanista de um governo espetaculoso ao anunciar e péssimo ao executar é causa da indignação maior dos brasileiros que protestam e escrevem nas ruas o manifesto da mudança. Dilma foi a mesma de sempre. Perdeu a oportunidade de obedecer a Nação anunciando reformas. Deveria anunciar: “Na próxima semana enviarei ao Congresso projeto de Reforma Política para oferecer ao Brasil, modelo político compatível com a realidade nacional, Farei isso porque no presidencialismo forte que nos governa as grandes reformas só ocorrem com o patrocínio da Presidência da República. Esse novo modelo político vai reduzir os índices de corrupção na administração pública. Iniciarei já na segunda feira a Reforma Administrativa. Reconheço ser impossível governar com 39 ministérios, secretarias, diretorias, departamentos, empresas, e milhares de cargos comissionados, que satisfazem os chupins da Republica mas esgotam a capacidade de investir do Estado, além de puxar para baixo a qualidade da administração. Vou promover já a Reforma do Ministério. Reconheço que não está a altura do Brasil. É sofrível. Foi composto no balcão de negócios para atender o apetite fisiológico dos aliados.Estou determinando auditoria para investigar desvios do dinheiro publico nas obras da COPA. O país tem o direito de saber porque vamos gastar mais do que gastaram nas ultimas três copas somadas”. Paro por aqui, embora pudesse ir além. A Presidente falou em transparência. Como pode falar, se nas últimas semanas determinou que os gastos com viagens ao exterior serão sigilosos a exemplo do que ocorre com despesas com cartões corporativos da presidência, além de impor a tarja de secretos aos empréstimos concedidos a Cuba e Angola? Isso é transparência? Faltou com a verdade ao afirmar que empréstimos do BNDES não se constituem em dinheiro público. Como não? São efetuados com recursos do tesouro transferidos ao Banco para empréstimos a clubes e empreiteiras com taxas de juros subsidiados. A mentira dos últimos anos alimentou a revolta de hoje, mas a Presidente não aprendeu e deve ser condenada pela reincidência desrespeitosa.

A velha política e o novo Brasil, por Aécio Neves

Aecio-300x200Por Aécio Neves, presidente nacional do PSDB e senador (MG)

O pronunciamento da presidente Dilma Rousseff contém erros e acertos.

A Presidente acertou ao convocar, mesmo que com atraso, a rede nacional de rádio e TV – a primeira realmente necessária em sua administração – para apresentar à população e ao mundo a palavra do governo brasileiro sobre os últimos acontecimentos.

Errou, no entanto, no conteúdo. Reproduziu exatamente o tipo de ação política que está sendo rechaçada nas ruas de todo o país. Fez um discurso dissociado da verdade, reforçando a política como território distante de valores e da própria realidade.

A presidente perdeu uma oportunidade única de se conectar com a população. Para isso, precisaria ter reconhecido erros e responsabilidades para, em seguida, ter a legitimidade de transformar essa extraordinária manifestação por desejo de mudanças em combustível para uma verdadeira transformação no e do país.

No entanto, escolheu fazer um discurso que reproduz o tradicional jeitinho de fazer política no Brasil: empurrando os problemas para debaixo do tapete, fingindo que não tem nada a ver com o que está acontecendo, que é tudo responsabilidade dos outros, que só não fez melhor porque não foi permitido.

Fez, assim, um discurso como se a população brasileira fosse formada por alienados e desinformados. Ela está nas ruas justamente mostrando que não é.

A presidente falou no seu compromisso com a transparência e com a luta contra a corrupção. Enquanto isso, no Brasil real, a mesma presidente proíbe a divulgação dos gastos das suas viagens ao exterior e, pensando nas eleições, abriga novamente no governo a influência de pessoas que ela mesma havia afastado sob suspeita de desvios.

Como forma de tentar demonstrar compromisso com a saúde, a presidente disse que os investimentos federais nesta área vêm aumentando, quando todo o país sabe que a participação do governo federal nos gastos nacionais do setor vem caindo de forma acentuada há 10 anos, desde que o PT assumiu o governo. Quando todo o país sabe que o governo se empenhou especialmente para impedir que a regulamentação da Emenda 29 fixasse patamar mínimo de 10% de investimento no setor para a esfera federal.

Com o foco das manifestações no transporte coletivo, a presidente diz agora que enfim discutirá o assunto. Nenhuma palavra para o fato do seu governo agir exatamente no sentido oposto: faz desonerações isoladas para atender lógicas e interesses específicos, estimulando a aquisição de veículos individuais e defendendo projetos mirabolantes, como o trem bala, em detrimento de investimento em metrôs das grandes cidades.

Depois de gastar milhões em publicidade para colocar o governo federal à frente das obras dos estádios, agora, candidamente, a presidente diz que nada tem a ver com isso, resumindo os recursos empregados a financiamentos a serem pagos por estados e empresas. Nenhuma palavra sobre os recursos de Tesouro Nacional que estão abastecendo os cofres do BNDES. Nenhuma observação sobre a óbvia constatação de que os recursos que estão financiando estádios poderiam estar financiando metrôs, estradas e hospitais.

Mas há, nessa afirmação da presidente, um aspecto positivo.

É a primeira vez que o governo reconhece que obras realizadas por meio de financiamentos não devem ser consideradas obras federais, já que são recursos que serão pagos pelos tomadores. Registra-se, assim, uma nova e mais justa leitura sobre programas como o Luz Para Todos e o PAC, nos quais as obras realizadas com os financiamentos – que serão integralmente pagos por empresas, estados e municípios – têm sido apresentadas – sem nenhuma cerimônia, como obras da União.

Ao invés de dizer ao país que o governo não investiu na Copa – como se alguém pudesse acreditar nisso – não seria mais honesto mostrar as razões que levaram o governo a lutar pela oportunidade de realizá-la e depois investir nela?

Não seria mais respeitoso com os milhões de brasileiros que estão nas ruas reconhecer a parcela de responsabilidade do seu governo – que, registre-se, não é só dele – com os problemas enfrentados hoje pela população?

Ao invés de oferecer aos brasileiros mais uma vaga carta de intenções, não teria feito melhor a presidente se tivesse se comprometido com medidas concretas? Se tivesse dito que orientaria o seu partido no Congresso a desistir de retirar poderes do Ministério Publico e de impedir a criação de novos partidos? Ou, como bem disse o Senador Agripino Maia, se dissesse que procuraria o presidente do STF para manifestar apoio à conclusão do processo do mensalão?

Quem ouviu a pronunciamento da Presidente da República ficou com a impressão de que se tratava de um governo começando agora e não de uma gestão que responde pelo que foi – e não foi – feito no país nos último 10 anos.

Através da voz da presidente, a velha política falou ao novo Brasil que está nas ruas. Pena.

“Onde está a presidente?”, análise do Instituto Teotônio Vilela

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Foto: Antonio Cruz/Abr

As imagens na TV não deixavam dúvida: o país estava tomado, de norte a sul, por manifestações, protestos e, infelizmente, também por muitas depredações. Com o povo ocupando as ruas, o poder mostrou-se ausente. Foi como se o país tivesse ficado sem comando.

Tanto ontem, num dos mais conflagrados dos 14 dias desde que a onda de revolta começou, quanto nos demais dias, a presidente da República praticamente desapareceu. Onde está Dilma Rousseff? A impressão é de que estamos num país à deriva, num dos momentos mais tensos e convulsionados por aqui em décadas.

A presidente mostra-se atônita, inepta, perdida. Desde o começo dos protestos, manifestou-se apenas uma única vez, em meio a uma solenidade dedicada a tratar de marcos legais para a exploração mineral. De resto, mudez total.

Naquela ocasião, Dilma enfiou em seu discurso palavras vazias, meras “vacinas” para tentar transmutar-se de vidraça em estilingue. Não foi suficiente e a presidente teve que correr para escorar-se nos seus conselheiros de toda hora – ou melhor seria dizer nos governantes de fato?

Ontem, com Brasília tomada por manifestações, ameaça de invasão do Congresso e do Palácio do Planalto, depredações ao Itamaraty e à Catedral, Dilma resolveu agir. Convocou para esta manhã uma reunião de sábios. Pela composição da turma reunida, de lá boa coisa não sairá: José Eduardo Cardozo, Gleisi Hoffmann, Gilberto Carvalho, Aloizio Mercadante e Ideli Salvatti.

A presidente tomou providências: cancelou viagens ao Japão e a Salvador. Quanto às manifestações, que ontem reuniram mais de 1 milhão de pessoas (há quem fale em 1,4 milhão) em 388 cidades diferentes do país segundo O Estado de S.Paulo, nenhuma palavra, nenhum gesto, nenhuma iniciativa da chefe da nação.

Diz-se que Dilma – tão pródiga no hábito, que usa sem pejo quando há fitos eleitoreiros – pode convocar para hoje cadeia nacional de rádio e televisão para pronunciar-se. Será que, enfim, o país poderá voltar a ter a sensação de que tem alguém no comando da República? Tudo indica que não.

A preocupação do Planalto passa longe disso. Com o país conflagrado e clamando por respostas, as cúpulas do governo e do PT ainda avaliam se a chefe da nação deve ou não pronunciar-se porque temem “trazer para dentro do Planalto a responsabilidade pelos tumultos no país” e porque a ordem é “evitar excesso de exposição pública”, segundo a Folha de S.Paulo.

Mas, afinal, para que Dilma quis a cadeira presidencial e luta, de forma tão extemporânea e indevida, para lá permanecer por mais quatro anos? Por que, se nas horas em que a presença de uma liderança é mais demandada, ela simplesmente corre para o colo de Lula e de seu marqueteiro?

É também contra uma governante tão apequenada e incapaz que a voz das ruas se levanta. “As principais cidades estão com suas vidas semiparalisadas há quase duas semanas. Haverá prejuízos econômicos. Dilma não sabe qual resposta oferecer”, ainda consegue espantar-se Fernando Rodrigues na Folha.

Neste seu desnorteio, Dilma acena com pacotes de bondades para a juventude. É um claro sinal de que nem ela, nem seu governo estão entendendo patavina. É a boca entortada pelo velho cachimbo: o PT acha que basta pôr sua política de cooptação em marcha – como fez com a UNE, o MST e assemelhados – para as coisas se acomodarem. Com a moçada que está nas ruas, não há chance de colar.

As multidões não querem migalhas. Querem, como comprovou pesquisa feita pela comunidade Avaaz, que o dinheiro público seja bem empregado, que a corrupção do poder seja extirpada e que as liberdades não sejam cerceadas – como ameaçam a PEC 37, que tenta manietar o Ministério Público, e o projeto de lei que tenta vedar novos partidos.

Dilma e os petistas parecem não ter entendido nada. Como ficou claro no repúdio que os manifestantes exerceram à tentativa de gente como Rui Falcão e José Dirceu de transformar o movimento nacional pela cidadania, pela restauração de valores e pela reconquista de direitos numa “onda vermelha”. Parece até que os capa-pretas do PT se inspiraram na malfadada estratégia de Collor em 1992…

O que se viu foram petistas sendo rechaçados. Agora até Lula teme passeata e cancela aparições públicas. O povo não é bobo e não tolera mais estas tentativas de manipulação de fatos, de intenções, de desejos. Como o partido que governa o país há mais de dez anos quer se fazer parte de movimentos que reivindicam justamente a mudança do que aí está? Os petistas podem, sim, ir para a rua, mas só se for para gritar: “Abaixo nós”.

Espera-se que quando, e se, agir, Dilma Rousseff não venha com mais uma tentativa de ludibriar os cidadãos à base de pronunciamentos ocos, edulcorados pelo seu marketing manipulador. O que o Brasil cobra é que ela exerça as funções para as quais foi eleita. Que se porte, pelo menos uma vez, como presidente de uma nação que está mostrando nas ruas que merece muito mais do que lhe tem sido oferecido.

“Nem velho de restelo, nem Pollyana”, artigo de Alberto Goldman

Artigo do vice-presidente do PSDB, Alberto Goldman

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Foto: George Gianni

A presidente Dilma lançou hoje um programa. Para aqueles que já têm contrato de compra de um imóvel pelo “minha casa, minha vida”, vai ser possível obter mais um financiamento, no limite de R$ 5.000, para a compra de móveis, eletrodomésticos ou equipamentos de informática. Porque só para os que compraram esses imóveis, só Deus sabe. A pergunta é: como ficam aqueles que não têm nem o imóvel, nem os móveis, vivem em um barraco ou num imóvel alugado? Vai lá, é mais uma dessas jogadas de marketing eleitoral, dá pra entender.

Mas ela deu de falar sobre os pessimistas, aqueles que não estão vendo as maravilhas desse governo, que enxergam a inflação comendo os salários, que acham que nem tudo é tão róseo. E resolveu citar, mais uma vez, a figura do “velho do restelo”, um personagem criado por Luis de Camões na sua obra ” Os Lusíadas”, que simbolizava os pessimistas que não acreditavam no sucesso das expedições portuguesas que finalizaram com as conhecidas descobertas.

Ela ainda pensa que vai esconder os seus insucessos com alguns móveis e eletrodomésticos.

Enquanto ela falava eu lembrei da obra “Polyanna”, de Eleanor H. Porter, considerado um clássico da literatura infanto-juvenil, cuja protagonista via tudo pelo lado otimista, e inventou o “jogo do contente”. É o que ela está fazendo, o jogo do contente.

Nem velho do restelo, nem pollyana, o que precisamos é de seriedade e de realismo, para enfrentar o difícil quadro econômico em que estamos metidos. Não será com esses programas superficiais que vamos fazer a indústria retomar o seu dinamismo, nem voltar a crescer para um desenvolvimento sustentado.

Mediocridade e demagogia é o que resta à nossa presidente?

“Minha casa, minha caixa-preta”, análise do Instituto Teotônio Vilela

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Foto: George Gianni

*Análise do Instituto Teotônio Vilela

O Minha Casa, Minha Vida é um excelente programa. Ficará melhor ainda quando entregar o que promete. Poderá tornar-se quase perfeito se disser de onde vem o dinheiro que financia suas obras. Será louvado se deixar de ser usado como mera peça de campanha publicitária. Tal como existe hoje, é uma caixa-preta.

O programa foi lançado há pouco mais de quatro anos. Inicialmente, tinha como objetivo entregar 1 milhão de moradias. Com Dilma Rousseff já na presidência, a meta dobrou. O governo afiança que a maior parte (60%) destina-se a famílias com renda de até três salários-mínimos, em que se concentra o grosso do déficit habitacional do país.

A despeito de ainda não ter cumprido o compromisso ao qual se propôs, o governo petista segue inflando suas metas. Os números parecem ganhar vida própria e vão surgindo aos borbotões. Agora, a promessa da presidente é fazer 3,75 milhões de habitações, conforme disse anteontem em Brasília. Ela só não explicou como fará.

É meritório que intenções nobres como possibilitar a quem não tem teto adquirir sua casa própria cresçam e se multipliquem. O problema é quando tais pretensões se restringem a meros números vazios. No Minha Casa, Minha Vida, as contas não fecham. Sobra saliva e falta areia, concreto e brita.

Para inflar seu desempenho, o governo limita-se, na maior parte dos casos, a informar o número de unidades habitacionais “contratadas” e não as efetivamente “construídas”. Como entre contratação, construção e ocupação vai muito cimento, a realidade acaba sendo bem distinta, e bem pior, que a expressa no discurso oficial.

São parcos os balanços sobre o programa e opaca a sua contabilidade. A partir da “Mensagem ao Congresso Nacional” enviada pela Presidência da República em fevereiro, fica-se sabendo que 1,05 milhão de unidades foram finalizadas. Destas, menos de um terço destinam-se às famílias mais pobres: das 1,2 milhão de unidades prometidas para esta faixa de renda, só 291 mil foram entregues.

Este é apenas um dos problemas. Outro, que afeta muito mais gente, é a origem dos recursos que estão sendo usados para bancar as obras. O governo está simplesmente metendo a mão no FGTS dos trabalhadores para financiar as moradias, sem, contudo, ressarcir o fundo como deveria. Desde 2011 tem sido assim – nos dois anos anteriores, o ressarcimento foi apenas parcial.

As dívidas do Tesouro com o FGTS já ultrapassam R$ 4,8 bilhões, em valores atualizados. Em 2012, do R$ 1,8 bilhão que o Tesouro deveria ressarcir, nada foi pago, mostrou O Globo anteontem. Além disso, desde abril do ano passado a União deixou de repassar ao fundo os recursos da contribuição extra de 10% paga pelas empresas em casos de demissões sem justa causa: só aí foram tungados mais R$ 2,8 bilhões, utilizados para ajudar a maquiar os resultados fiscais de 2012.

Agora, o dinheiro do trabalhador também poderá vir a ser usado para financiar a compra de eletrodomésticos e mobiliário a juros camaradas. O governo não explica de onde virá a maior parte dos R$ 18,7 bilhões anunciados anteontem. Diz apenas que injetará mais R$ 8 bilhões na Caixa e, “enquanto durarem as operações”, abrirá mão da maior parte de seus dividendos no banco – que renderam R$ 7,7 bilhões ao Tesouro no ano passado, segundo o Valor Econômico.

Além de gatunar o FGTS do trabalhador e ajudar o governo petista a inflar artificialmente o superávit fiscal, o Minha Casa, Minha Vida também é útil para anabolizar os resultados do Programa de Aceleração do Crescimento e tornar menos anêmicos os números relativos ao investimento público.

Dos R$ 557 bilhões que a gestão federal diz ter aplicado no PAC até hoje, 32% referem-se a financiamentos habitacionais concedidos no âmbito do programa. A continuar assim, é possível que as prestações que os mutuários pagarão às Casas Bahia para ter um fogão novo e uma TV digital logo, logo estarão engordando a contabilidade oficial da gestão Dilma…

O Minha Casa, Minha Vida é uma boa ideia que o governo do PT, infelizmente, tem se mostrado capaz de desvirtuar. O programa habitacional é uma verdadeira caixa-preta, sobre a qual não se sabe ao certo quantas famílias estão sendo beneficiadas, quantas moradias foram efetivamente construídas, de onde estão vindo os recursos, nem em quais condições. É mais uma boa intenção das quais o inferno está lotado.