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“A abolição da Lei Áurea”, análise do ITV

cuba3O tráfico de escravos foi proibido no Brasil em 1850. Não está mais. A escravidão foi abolida no país em 1888. Não está mais. Esta iníqua condição foi ressuscitada com o tratamento dispensado pelo governo brasileiro a cubanos trazidos pelo programa Mais Médicos. Eles deveriam ser acolhidos com a dignidade que merecem e não tratados como mera mercadoria de exportação da ilha.

Não há quem discorde de iniciativas voltadas a aumentar a oferta de médicos para atender a população brasileira. É conhecida a dificuldade de atrair profissionais para áreas mais inóspitas e longínquas de um país com dimensões, distâncias e diferenças continentais. É mais sabida ainda a dificuldade de exercer a medicina sem condições mínimas de estrutura, como se observa em boa parte do nosso sistema público de saúde.

O Mais Médicos foi anunciado como forma de superar estes obstáculos. Inicialmente, previa recrutar 15.460 profissionais, com primazia de brasileiros, e espalhá-los por 3.511 municípios.

Porém, as sucessivas chamadas públicas lançadas pelo Ministério da Saúde foram mal sucedidas e o governo lançou mão daquela que sempre foi sua proposta inicial: importar médicos formados no exterior, mais especificamente de Cuba, alternativa discutida de antemão e com bastante antecedência com o regime castrista.

Até agora, ao todo 6.658 profissionais estão em atividade no Mais Médicos – o que dá 43% do prometido em julho do ano passado, quando o programa foi lançado. São 2.166 as cidades atendidas, segundo balanço mais recente publicado pelo Ministério da Saúde. Destes médicos, 5.378 são cubanos, o que dá mais de 80% do total. É aí que começa o problema: o tratamento que o governo brasileiro dispensa a estes profissionais é análogo à escravidão.

Os cubanos são recrutados com a chancela da Organização Pan-Americana de Saúde (Opas), mas sua contratação é feita por uma sociedade mercantil sediada em Havana, a Comercializadora de Servicios Médicos Cubanos S.A. O contrato entre as partes impõe condições leoninas ao “profissional de saúde cubano”, como eles são nominados no documento, admitido.

Em suas seis páginas, o termo “consagra a escravidão laboral, não admitida no Brasil”, conforme dissecou Ives Gandra Martins em artigo publicado na edição de segunda-feira da Folha de S.Paulo. Direitos elementares garantidos a qualquer trabalhador que atue no país desde a Consolidação das Leis do Trabalho, de 1943, são negados aos médicos cubanos. O programa subverte relações de trabalho sacramentadas no país e avilta os profissionais.

O contrato intermediado pela firma mercantil de Havana vai ainda mais longe: também cerceia a liberdade de movimentação e expressão dos cubanos no Brasil, veta atividades extras e até mesmo relacionamentos amorosos durante os três anos de permanência dos profissionais no país. Trata-se de documento típico de ditaduras, e abençoado pelo governo brasileiro.

Os passos dos cubanos no Brasil são monitorados amiúde, inclusive sob a vigilância de uma plenipotenciária “Direção da Brigada Médica Cubana no Brasil”. O governo brasileiro também colabora na patrulha: na semana passada, o Ministério da Saúde baixou portaria determinando que órgãos de segurança sejam avisados caso os médicos do programa se ausentem por mais de 48 horas sem se justificar.

Além desta série de restrições, os cubanos contratados pelo Mais Médicos também são submetidos a salários aviltantes. Enquanto o governo brasileiro paga R$ 10 mil a cada médico recrutado pelo programa, os cubanos recebem US$ 400 aqui no Brasil e têm outros US$ 600 depositados em conta bancária em Cuba. Em miúdos, trabalham por menos de R$ 1 mil mensais. “Estou vivendo mal. Ganho menos que uma enfermeira e teve dia de ir comer na casa de amigo”, resignou-se um cubano que atua no interior de Pernambuco.

Todo o restante do dinheiro pago pelo governo Dilma – estima-se que neste primeiro ano o Mais Médicos custará mais de R$ 1 bilhão – vai para a ditadura comandada há 50 anos pelos irmãos Castro. Trata-se da mais clássica mais-valia, teorizada pelo principal filósofo da ideologia que sustenta o regime comunista cubano: Karl Marx. É que em Cuba pode… Estima-se que a “exportação” de médicos cubanos renda cerca de US$ 6 bilhões anuais à ilha, mais que todas as suas cada vez mais minguadas vendas ao exterior, segundo a Folha de S.Paulo.

Não é de surpreender que cubanos comecem a debandar do Mais Médicos. O primeiro caso, divulgado há duas semanas, foi o de Ramona Rodriguez. Depois, o próprio governo passou a se antecipar e revelou que mais um tanto de médicos, incluindo brasileiros, já tinham abandonado o barco. É claro que o número não deverá ser volumoso a ponto de comprometer o programa, mas será suficiente para manchar sua imagem.

Atitude correta é advogar tratamento justo, digno e equânime para os médicos que se dispõem a melhorar o atendimento de saúde para a população brasileira. Sem exceção. Não há profissionais de primeira ou de segunda categoria, cubanos ou não cubanos. Há, sobretudo, seres humanos devotados a uma das mais belas profissões. Tudo o que eles não merecem é serem tratados como mão de obra escrava. Esta deplorável injustiça o Brasil não aceita ver ressuscitada.

“O silêncio do Brasil”, por José Aníbal

anibal-300x209Eu entendo que este governo nutra pela Venezuela chavista boa dose de admiração, além de respeitosa lealdade. Também compreendo as afinidades existentes entre os dois. Mas a condescendência do Estado brasileiro com a degeneração institucional da Venezuela e com a escalada da violência política atenta contra a nossa história e tradição diplomática.

Com relatos de truculência e prisões arbitrárias, lá se vão 15 dias de protestos ininterruptos. O maior deles, há uma semana, terminou com três mortos e quase 30 feridos. Milícias têm atuado contra adversários e manifestantes sob os bigodes do Estado. A imprensa foi dobrada. A oposição protesta contra a omissão de organismos multilaterais e de vizinhos, Brasil à frente.

O presidente Nicolás Maduro reagiu como de costume: criando factoides. Denunciou uma conspiração golpista e expulsou diplomatas americanos. Criminalizou os partidos de oposição e prendeu inimigos. Convocou e insuflou partidários para enfrentar os manifestantes. Por fim, solicitou aos governos amigos na região que fizessem vista grossa e que se calassem. E foi atendido.

O voluntarismo messiânico dessa escola política parece ser incapaz de entender e de tolerar o sistema de contrapesos da democracia. Se o governo é ruim, como é o da Venezuela, o sistema republicano não perdoa. À mercê de estruturas mentais superadas e portador de um heroísmo fraudulento e autoritário, Nicolás Maduro não é mais do que uma figura patética.

Que ele fale com Chávez por meio de passarinhos, é um problema do povo venezuelano. Que o Brasil abandone seus princípios e enxovalhe sua trajetória diplomática, é um problema nosso. Foi o nosso multilateralismo e a vocação para a resolução pacífica de controvérsias que fez de nós líderes do continente. Quando a gente acha que este governo não pode mais se rebaixar, ele se supera.

*José Aníbal é economista, deputado federal licenciado e ex-presidente do PSDB

“Amizade com ditaduras”, análise do ITV

venezuela2-300x199A Venezuela está em pé de guerra. Este poderia ser um assunto que pouco diz respeito ao Brasil, mas nosso governo tornou-se um dos arrimos dos descalabros que, desde Hugo Chávez, se perpetuam no país vizinho. Por meios oficiais, nossa diplomacia também tem hipotecado apoio à truculenta repressão posta em marcha pelo governo de Nicolás Maduro e passado ao largo da defesa de princípios democráticos.

A onda de protestos na Venezuela teve início no último dia 4 e desde então vem crescendo. Ontem, dezenas de milhares de venezuelanos foram às ruas. Parte – não há estimativas oficiais precisas – protestava contra o governo bolivariano e manifestava apoio ao líder oposicionista Leopoldo López, dirigente da Vontade Popular detido ontem. Parte defendia Maduro.

O governo brasileiro entrou nesta história pela porta dos fundos. Na última segunda-feira, endossou comunicado oficial emitido pelo Mercosul em que expressa apoio irrestrito ao governo chavista: “Rejeitamos as ações criminosas de grupos violentos que querem disseminar a intolerância e o ódio na República Bolivariana da Venezuela, como instrumento de luta política”, diz um dos trechos da nota.

Hoje, o Mercosul é presidido temporariamente pela Venezuela, finalmente admitida no bloco em agosto de 2012, com total beneplácito da diplomacia companheira. Dele também fazem parte o Brasil, a Argentina, o Uruguai e o Paraguai – estes membros desde a origem, em 1991, quando foi assinado o Tratado de Assunção. Não é difícil ver que estamos atados ao que há de mais atrasado no continente…

O comunicado emitido anteontem foi chancelado por todos os países-membros do Mercosul e, segundo informam os jornais, foi feito sob estrita orientação de Caracas. Por isso, não traz nenhuma palavra sobre a escalada de violência que assola a Venezuela, sobre a truculenta repressão do governo Maduro aos meios de comunicação, sobre a desconstrução cotidiana da economia do país e nem sobre a penúria em que se transformou viver ali desde o governo Chávez. Nenhuma defesa, ademais, de princípios e valores democráticos.

Isoladamente, o Itamaraty não emitiu posição oficial. Mas, segundo a Folha de S.Paulo, endossou os termos dos comunicados do Mercosul e da Unasul, ambos de apoio a Maduro. Foi, portanto, conivente com posicionamentos que desconhecem a legitimidade da manifestação democrática de milhares de venezuelanos descontentes com um governo que já nasceu sob a suspeita de ter fraudado a eleição que elegeu Maduro em abril do ano passado.

“Demoramos dez anos para construir um pensamento sobre democracia no Mercosul, e o bloco exige uma democracia representativa e respeito aos direitos humanos. A Venezuela não cumpre estas exigências, e o Mercosul está ignorando dez anos de trabalho”, sintetizou um ex-diretor da Secretaria do Mercosul ouvido por O Globo.

Motivos para a insatisfação os venezuelanos têm de sobra. O país é hoje quase um pária no concerto geral das nações. Tem a mais alta inflação do mundo (56% ao ano) e a mais baixa taxa de crescimento do continente (1,1%). Por esta razão, seus cidadãos não dispõem sequer de itens de primeira necessidade, como papel higiênico, disponíveis nos supermercados, hoje completamente desabastecidos.

A taxa de câmbio é galopante – no oficial, um dólar vale 6,3 bolívares, enquanto no paralelo chega a 84. Isso torna dramática a vida num país que importa 70% do que consome e onde 95% da renda recebida pelo governo vem da estatal do petróleo, a PDVSA, arruinada pela exploração política, como relata a Foreign Policy.

O apoio ao chavismo é apenas mais um capítulo da triste saga que a diplomacia brasileira vem escrevendo sob as orientações do petismo. O viés ideológico imposto à nossa política externa nos últimos anos está isolando o Brasil do mundo e nos alinhando ao que há de mais atrasado e retrógrado. Demos as costas para nações democráticas e abraçamos regimes de inclinação autoritária, como é o caso da Venezuela de Nicolás Maduro. Tudo em flagrante contraste com as melhores práticas da nossa tradição diplomática.

“Inflação represada”, por Celso Ming

precosO governo Dilma parece pouco consciente do potencial desestabilizador da economia produzido pelo forte represamento dos preços administrados – os que dependem de autorização do governo.

Nesse campeonato, o Brasil ainda não virou uma Argentina, mas está no caminho. Na entrevista publicada no Estadão no domingo, o ex-secretário de Política Econômica do Ministério da Fazenda Nelson Barbosa advertiu que “a inflação não cede porque há incertezas sobre se e sobre quando os preços de produtos como gasolina e energia serão reajustados”. Ou seja, a economia atua armada porque a qualquer hora podem vir reajustes que puxam todos os preços para cima. Barbosa não é um desses críticos inconsequentes de que a presidente Dilma se queixa. Até junho de 2013, era dos mais taludos da equipe econômica.

Para não ir muito atrás, no ano passado, a inflação dos preços livres saltou para 7,27%. Enquanto isso, a evolução dos preços administrados, correspondentes a 25% da cesta de consumo, não passou de 1,52%. O governo entende que, não fosse esse represamento, a inflação teria transbordado a barragem.

A contenção artificial dos preços administrados produz o efeito cocaína. O governo segura os preços para evitar inflação achando que um pouquinho só não faz mal e, depois, o pouquinho é seguido por outros pouquinhos que, somados, se transformam em poucão e aí a economia já está viciada e exige doses maiores de represamento para não criar nova crise.

A Argentina, por exemplo, está superviciada, o investimento mergulhou porque o empresário não quer mais produzir quase de graça e, se não forem reajustados de acordo com a inflação real passada, assalariados e aposentados mobilizam panelaços. Ou seja, a crise econômica tem potencial para virar crise política e aí é esperar por um salvador ou, simplesmente, pela internação.

Não está claro como o governo federal lidará com este problema neste ano de eleições. O governo do Rio, por exemplo, mesmo correndo o risco de novas manifestações, optou por reajustar as tarifas do transporte público em 9%. O acionamento das termoelétricas a gás, que operam a custos muito mais altos, pode aumentar a conta da energia elétrica em até de R$ 10 bilhões, dependendo do regime das águas.

O Banco Central do Brasil não espera pela normalização. Na última Ata do Copom avisou que, neste ano, trabalha com uma evolução dos preços administrados de 4,5%. O mercado espera 4,06%. São números que aumentam o problema porque não tiram o atraso anterior e não dão cobertura suficiente para o futuro. A inflação esperada é agora de 5,93%, como aparece na Pesquisa Focus, do Banco Central, divulgada nesta segunda-feira.

O represamento dos preços dos combustíveis e da energia elétrica já produziu distorções. Esmerilhou as finanças da Petrobrás e das concessionárias de energia elétrica, corroeu o setor produtor de açúcar e etanol e, como disse o ex-secretário Nelson Barbosa, antecipa remarcações defensivas do setor privado. Ou seja, uma política montada para reduzir a inflação está produzindo efeito contrário: está criando inflação.

Band-aid contra enfarte. De que adianta o presidente do BNDES, Luciano Coutinho, prometer recursos para melhora da tecnologia da produção do etanol, como fez nesta segunda, se não contribui para reverter o sucateamento do setor?

Cadê você? Por onde anda o ministro Guido Mantega? Sempre tão falante, de repente emudeceu. Vai que está mergulhado na meta de produção de um superávit crível das contas públicas…

*Celso Ming é colunista

*Coluna publicada no jornal O Estado de S.Paulo – 18-02-14

“Bandeira eleitoral em frangalhos”, análise do ITV

Politica-intervencionista-do-governo-federal-afasta-investidores-para-energia-Foto-Divulgacao--300x200O governo até tenta. Mas ainda não chegou o dia em que mágicas tiradas da cartola conseguem suplantar a dura realidade. É o que irá acontecer com as tarifas de energia, prestes a sofrer forte aumento, que pode chegar a 15% neste ano. A redução forçada das contas de luz não durou nem um verão, mas deixou um rastro de destruição num dos mais importantes setores da economia.

Em setembro de 2012, Dilma Rousseff ocupou cadeia nacional de rádio e televisão. Sob pretexto de discorrer sobre o Dia da Independência, anunciou uma bombástica redução nas contas de energia, que chegaria a 16% no caso das residências e até 28% para as indústrias. A presidente transformou a temerária iniciativa numa vistosa bandeira eleitoral.

O resultado mágico seria alcançado com uma arbitrária renovação dos contratos de concessão das empresas do setor. Quem não aderisse, perderia direito à prorrogação. Poucas companhias disseram não e a maior parte foi forçada a acatar as novas regras. Foi como o beijo da morte: as condições impostas às concessionárias praticamente inviabilizaram o negócio de energia no Brasil.

Desde então, os desequilíbrios se acumulam, agravados por um regime de chuvas pouco pródigo, com baixíssimo volume de chuvas nos últimos anos. O governo preferiu brincar com a sorte e dobrou a aposta. Incentivou o consumo na mesma medida em que os reservatórios secavam e a energia tornava-se mais escassa. Resultado: o setor entrou em colapso.

O país está à beira de um racionamento e às portas de um tarifaço de energia, sem o qual as contas públicas desabarão e a própria solvência do país ver-se-á comprometida. Ou seja, encontra-se entre a cruz e a caldeirinha. Uma lambança e tanto produzida em curto espaço de tempo pela irresponsável decisão de Dilma de transformar uma discussão que deveria ser eminentemente técnica em moeda eleitoral.

Só no ano passado, a barbeiragem já custou R$ 9,8 bilhões ao Tesouro, que, por ora, matou a conta no peito, mas logo, logo começará a repassá-la aos consumidores de energia. Se não repassar, quem pagará são os contribuintes. Neste ano, a fatura deve chegar a R$ 18 bilhões, porque o país queima todo o óleo que tem para manter as usinas térmicas produzindo a pleno vapor. O problema é que o dinheiro para cobri-la simplesmente acabou.

Suportar novamente a conta do desajuste que ele próprio instalou no setor elétrico levaria o governo a implodir de vez os resultados fiscais. Nenhuma meta de superávit – que deve ser anunciada hoje ou, no mais tardar, até quinta-feira – parará em pé e a pouca credibilidade que a gestão fiscal ainda dispõe virará pó em questão de dias.

O governo se viu, então, diante da necessidade de voltar atrás e recompor as tarifas de energia para remediar o estrago. Estima-se que o tarifaço represente uma alta de até 15% nas contas de luz neste ano, como informa hoje o Valor Econômico. Isso se o Tesouro ainda bancar metade da conta deste ano.

O percentual cobriria o reajuste anual de praxe, os gastos extras com acionamento das térmicas, despesas com subsídios e o pagamento de indenizações às concessionárias do setor por conta da malsinada renovação contratual.

Desta maneira, o benefício obtido com a mágica da renovação truculenta dos contratos de concessão será praticamente zerado, apenas um ano depois de anunciado. Ainda ficará faltando, porém, compensar os gastos extras de 2013, o que significa que novas altas estão contratadas para 2015 em diante. Cai por terra, portanto, a fábula da tarifa de luz baratinha.

A redução forçada das tarifas de energia até ajudou a conter a inflação no ano passado. Estima-se que, sem ela, o IPCA teria furado o teto da meta. Agora ocorrerá o inverso. Se todo o custo de acionamento das térmicas for repassado para os consumidores, o impacto no índice de preços será de 0,6 ponto percentual, segundo O Globo. Mais uma indicação de que, quando a solução é artificial, a conta sempre chega, e mais salgada.

Para completar, o país convive hoje com risco considerável de racionar energia. Até o governo já admite que a hidrologia é pior até do que em 2001, quando foram adotadas medidas de contenção de consumo. Tecnicamente, a situação já indicaria um corte de 5% na oferta de energia, segundo o ONS, uma vez que os custos de produzir eletricidade no país alcançaram patamar proibitivo.

A redução das tarifas de energia foi transformada numa bandeira eleitoral por um governo que precocemente se lançou na disputa por um novo mandato. A reversão precoce dos cortes nas contas de luz mostra como medidas artificiais são insustentáveis, assim como governos que se ancoram apenas no marketing também não conseguem ficar de pé por muito tempo.

“Em banho-maria”, por Ruben Figueiró

*Ruben Figueiró

Plenário do SenadoEsta primeira quinzena de fevereiro, simbolicamente marcada pela reabertura dos trabalhos legislativos do Congresso Nacional, das Assembleias estaduais e Câmaras Municipais, das grandes metrópoles aos dos mais singelos grotões de nosso país continental, dos Tribunais Superiores, não trouxe as alvíssaras ansiosamente aguardadas pela população, sobretudo do que se esperava da esfera Federal.

Veja-se: Não pela ordem de valor, mas pelo calor das preocupações: tumores da violência urbana supuraram em Brasília, em razão, sobretudo, da paralisia operacional de suas polícias; tumultos na cidade maravilhosa com a ação baderneira dos black blocs, sob a alegação do aumento nas tarifas de transporte urbano; explosão de ânimos da população paulistana, motivada pelo blecaute do sistema de metrô; ameaça de desequilíbrio hídrico nos mananciais que abastecem os grandes centros urbanos, com perspectiva preocupante de um racionamento na distribuição do precioso líquido – a água; ameaça, cada vez mais tenebrosa, da falência do sistema energético, denunciada pelos apagões derivados do anacrônico complexo de distribuição, neste momento o calcanhar de Aquiles da senhora presidente Dilma. Nesse setor, ultraimportante para o equilíbrio social e econômico do país, quão o inevitável prejuízo a pretensões político eleitorais para o governo, surge o fantasma cruel da eminente carência na produção de energia elétrica, naturalmente pelo esgotamento hídrico das bacias de represamento das usinas.

Para não alongar, outros itens preocupantes circulam pelos céus da Pátria. Já se esperavam que tal ocorresse e veio agora a público o affair dos médicos cubanos, um imenso abacaxi para o governo. Como apontou a experiente colunista Eliane Catanhêde, da Folha de São Paulo, “criou-se um imbróglio diplomático”, cuja solução terá de ser digerida, embora indigesta para o governo: se extraditar a médica cubana, se ela conseguir asilo nos Estados Unidos e se der a ela o status de refugiada, como soluções possíveis, qualquer delas provocará uma gritaria danada.

Como diz a sabedoria popular e também bíblica: quem pariu Mateus ….

Tudo e tudo em razão das ações continuadamente erráticas do governo federal. Está ele vivendo dias infernais. A panela de pressão popular está em seu limite máximo e pode explodir, mas o governo encara tudo com a sua leniência de um banho-maria.

 

*Ruben Figueiró é senador pelo PSDB-MS

“Democracia”, por Aécio Neves

aecio-neves-280813-george-gianni-300x200A morte estúpida do cinegrafista Santiago Andrade, vítima de um ato inconsequente em pleno exercício de seu trabalho, deve inspirar uma profunda reflexão em todos nós, especialmente em quem tem responsabilidade com as decisões que definem os rumos do país.

A verdade é que o Brasil mudou. O país de hoje, com mais de 160 milhões de pessoas vivendo nas cidades, é um imenso território de contradições e desafios, onde antigas mazelas permanecem intocadas e insanáveis.

Fruto de políticas sociais implementadas há pelo menos duas décadas, milhões de brasileiros tiveram inegável melhoria em suas condições de vida. No entanto, a ascensão social alcançada ainda mantém inalterada uma estrutura secular de desigualdade.

A cada dia, desde o último ano, fica claro que uma crescente intolerância vem se instalando entre nós. De um lado, a intolerância com o outro –são exemplos disso as inaceitáveis perseguições às minorias sociais e as ações dos grupos de justiçamento. Na outra ponta, a intolerância no discurso virulento contra as instituições democráticas do país, presente com assiduidade espantosa nas redes sociais, muitas vezes em espaços sob o patrocínio direto de verbas públicas federais.

A hostilidade parece insuflada por um sectarismo que identifica inimigos onde deveria enxergar apenas a diferença e mina o equilíbrio democrático, que pressupõe, fundamentalmente, o respeito ao direito e às ideias do outro.

Devemos dizer “não” a este estado de coisas. A legitimidade das manifestações populares deve ser respeitada, mas é fundamental que seja garantida a integridade física das pessoas e do patrimônio público. Assim, precisa ser investigada com rigor a denúncia de que partidos políticos estariam financiando atos de violência que colocam em risco a segurança da população.

Limite não é sinônimo de autoritarismo. Muitas vezes significa compromisso com a sociedade democrática.

Democracia implica instituições sólidas, estáveis; Legislativo e Executivo eleitos de forma direta e no pleno exercício das suas responsabilidades; Judiciário independente; imprensa livre e partidos políticos representativos de ideias e princípios de grupos sociais. Essas são conquistas das quais não podemos abdicar.

Ouso dizer que, nos 30 anos das Diretas-Já e nos quase 50 anos do golpe militar, mais do que nunca, precisamos estar vigilantes e mobilizados em defesa do Estado de direito. Em defesa do respeito às leis e às instituições.

Só os valores democráticos são capazes de apontar o caminho a uma sociedade em crise de confiança, frustrada em seus sonhos e insegura com o seu futuro. E, principalmente, indignada com a realidade que vivencia.

*Aécio Neves é presidente nacional do PSDB, senador por Minas Gerais, foi governador também por MG e deputado federal

**O artigo acima foi publicado na Folha de S. Paulo – 17 -02-2014

“O Brasil vai ficando para trás”, análise do ITV

Dinheiro-Foto-Divulgacao--300x199A economia brasileira encontra-se em estado de quase letargia. E isso não é de agora. Já há algum tempo temos crescido menos que países com características similares à nossa. É como se, numa corrida de longa distância, estejamos ficando cada vez mais para trás.

Na sexta-feira, saiu a primeira prévia do comportamento da economia brasileira em 2013. Segundo o IBC-Br, calculado pelo Banco Central, o PIB do país caiu 0,17% entre outubro e dezembro, depois de já ter recuado 0,21% entre julho e setembro. No ano, houve expansão de 2,52%.

Tecnicamente, pelos números do BC, o país terá atravessado uma recessão no segundo semestre de 2013, com dois trimestres seguidos de PIB negativo. Mas a maior parte dos analistas é cautelosa em chancelar esta avaliação, uma vez que o IBC-Br costuma destoar dos números oficiais do IBGE, que só serão conhecidos no próximo dia 27.

De todo modo, é voz corrente que setores importantes da economia vão muito mal, em especial a indústria. Os números finais do segmento em 2013 já foram conhecidos, com alta de apenas 1,2% no ano, insuficiente para compensar sequer metade da queda registrada em 2012 (2,5%). O parque industrial brasileiro segue, portanto, enferrujando.

O comércio também perdeu vigor. Também na semana passada, o IBGE informou que o setor cresceu 4,3% em 2013. Parece bom? Não foi. Trata-se do pior desempenho em dez anos. Na comparação com 2012, o ritmo de alta da atividade comercial – que funcionou como motor importante da economia nos últimos anos – caiu praticamente à metade.

Se o fim de 2013 não foi nem um pouco alvissareiro, as perspectivas para os meses vindouros têm se mostrado menos ainda. Alguns fatores – internos e externos – colaboram para isso. Aqui, temos a seca e a onda de calor, que afetaram a produção agrícola, encareceram a energia e levaram fábricas a parar de produzir para lucrar com a venda de eletricidade.

Lá fora, há a debacle da Argentina, país para onde se dirige 8% das nossas exportações. Há quem estime que as vendas brasileiras para o vizinho cairão cerca de 20% neste ano em função das dificuldades econômicas crescentes do lado de lá da fronteira, afetando ainda mais nossa já combalida balança comercial.

Além disso, há o desfecho imprevisível do enxugamento monetário americano, que tende a detonar uma fuga de capitais dos mercados emergentes – um dos quais, o Brasil, foi classificado pelo Fed, o banco central dos EUA, como o segundo mais frágil do mundo. Tem ainda as dúvidas sobre o ritmo de expansão chinês.

Tudo considerado, as previsões para o crescimento da economia brasileira vão murchando a cada dia. Depois da divulgação do IBC-Br, dos resultados finais da indústria e do comércio em 2013 e das estimativas sobre os efeitos da seca na economia, a maior parte dos prognósticos aponta para uma alta de apenas 1,5% em 2014. Em razão do calor, há quem fale em expansão de apenas 1%, segundo a edição de hoje d’O Globo.

Se a maior parte dos prognósticos se confirmar, e considerando que o PIB tenha tido alta de 2,5% no ano passado, Dilma Rousseff terá produzido crescimento médio abaixo de 2% ao longo de seu mandato. Entre todos os presidente da República, apenas Floriano Peixoto e Fernando Collor de Mello conseguiram algo tão ruim – e ambos em condições particularmente bem mais desfavoráveis.

Mas o Brasil não vai mal apenas em comparação consigo mesmo. Vai pior ainda quando cotejado a economias com características similares à nossa. Estamos sempre na rabeira dos rankings, perdendo até para países cujos mercados são bem menos expressivos que o brasileiro. Assim tem sido desde o início da gestão Dilma.

Em 2011, em toda a América Latina, o Brasil só cresceu mais que El Salvador. Em 2012, superou apenas o Paraguai. Em 2013, só se saiu melhor que El Salvador, México e Venezuela, conforme estimativas da Cepal. Em 2014, a previsão – também da Cepal – é de que o Brasil só cresça mais que a Venezuela.

Resta claro que a presidente Dilma Rousseff não merece críticas apenas pelos resultados recentes produzidos pela nefasta condução que ela e sua equipe fazem da nossa economia. Em todo o seu mandato, o desempenho é sofrível. Visto desta maneira, o conjunto da obra é digno de imediata reprovação, antes que continuemos a cair e passemos a ser os lanternas do crescimento no continente.

“O novo olhar do sol nascente”, por Solange Jurema

solange-jurema-foto-george-gianni-300x199O mundo se surpreendeu com a inusitada decisão do primeiro-ministro japonês, Shinzo Abe, de abrir mais 250 mil vagas em creches para que as mulheres do país do sol nascente possam matricular seus filhos e consigam manter uma vida profissional. A medida faz parte do programa japonês de reativação da economia. O objetivo dele é claro: criar condições básicas para que a mulher japonesa possa ingressar no mercado de trabalho.

Uma medida que, envolta em outras de cunho “econômico”, ganharam importância maior porque revelou a capacidade do governante japonês de enxergar com “outros olhos” a importância e o papel da mulher na sociedade e na economia de um país.

Mais do que isso, mostrou sua sensibilidade em ousar a adotar um nova ótica de governo em relação a mulher. O plano de gestão de Shinzo Abe determina a extensão do direito a creches para todas as mulheres – mães solteiras, as que trabalham apenas meio período, as que  procuram emprego e as universitárias. É uma quebra dos tabus locais.

Para estimular ainda mais a presença feminina nas empresas nipônicas, Abe a partir desta medida quer estimular as empresas a definir como meta a inclusão de pelo menos uma mulher na lista de integrantes da direção executiva da companhia. Também está no programa a ampliação da licença maternidade de um para três anos. Mas essa última proposta esbarra em resistências das empresas.

Essas ações governamentais pretendem fazer com a mulher japonesa seja inserida no mercado de trabalho de maneira mais rápida e eficiente. Atualmente  menos da metade delas participa do mercado de trabalho, enquanto 83% dos homens fazem parte da força de trabalho.

Abe define esses gestos como uma imperiosa necessidade econômica e uma otimização da extraordinária capacidade intelectual japonesa que está sendo desperdiçada por conta de preconceitos seculares –  nos cálculos oficiais, a incorporação desse segmento pode fazer com que o Produto Interno Bruto (PIB) do Japão cresça de 9% a 15% a mais.

No Brasil, as mulheres ainda convivem com a ausência de políticas públicas que lhes proteja no mercado de trabalho ou mesmo que lhes crie condições de acessá-lo com tranquilidade, disponibilizando creches em quantidade e de qualidade.

Aqui, cerca de 10 milhões de crianças de zero a três anos estão fora das creches, sem abrigo e sem carinho, bem ao contrário que apregoa o governo em seu programa “Brasil Carinhoso”.

O governo precisaria construir cerca de 12 mil novas creches, tarefa inalcançável para uma gestão que em quatro anos não construiu mil unidades, apesar da promessa de campanha eleitoral de 6,5 mil novas creches no período 2010/2014.

Se existissem, de fato, políticas públicas que favorecessem a mulher brasileira a participar em melhores condições no mercado de trabalho, o resultado econômico também se faria presente.

Assim como no Japão, a estimativa é que o incremento de sua participação no PIB seria de 9% se elas tivessem o mesmo nível de emprego dos homens – o hiato é de 23 pontos percentuais, ainda muito alto.

O que falta aqui para abrirmos nossos olhos é o discernimento, a ousadia e a visão de longo prazo para se perceber, com clareza, o que Abe já identificou: a mulher é o pilar mais importante e estratégico no pleno desenvolvimento político, econômico e social de uma Nação.

*Solange Jurema é presidente nacional do PSDB-Mulher

“Genéricos: 15 anos de uma conquista”, análise do ITV

genericosNesta semana, completam-se 15 anos da introdução dos medicamentos genéricos no país.  Trata-se de uma das políticas públicas mais exitosas da nossa história recente, seja pelos significativos efeitos sociais que gera, na forma de ampliação do acesso da população a tratamentos de saúde, seja pelos relevantes impactos econômicos.

Os genéricos ingressaram no país depois de longa batalha, que teve nos laboratórios já estabelecidos seus maiores opositores. A lei (n° 9.787) só foi finalmente aprovada pelos parlamentares em fevereiro de 1999, numa ampla articulação entre governo, sociedade e
Congresso, liderada pelo então ministro da Saúde, José Serra.

O difícil acesso a medicamentos era, até então, um forte entrave para o sucesso dos tratamentos de saúde no país. Barateá-los, preservando a garantia de qualidade, surgia como imperativo para impulsionar a eficácia das políticas de saúde e, também, como medida de largo alcance social.

O Brasil adota as mais avançadas práticas e normas mundiais no que se refere aos genéricos. Nossa regulamentação garante que eles sejam cópias fidelíssimas dos medicamentos originais de marca (ou, tecnicamente falando, “de referência”). Ou seja, o consumidor paga menos por um produto que tem a mesma eficácia e mesmo efeito no organismo.

Por lei, os genéricos têm de custar no mínimo 35% menos que os medicamentos de referência de que são originados. Mas, na prática, acabam sendo ainda mais baratos. Segundo estimativas da PróGenéricos, associação que reúne os fabricantes de genéricos no Brasil, os
preços mais em conta permitiram uma economia de R$ 48 bilhões aos brasileiros ao longo destes 15 anos.

Já é possível tratar a maioria das doenças conhecidas com medicamentos genéricos – são 436 substâncias ativas registradas no país. Hoje os genéricos respondem por 30% do mercado nacional. Mas dá para ir bem mais longe. Em mercados em que a participação destes
medicamentos é mais antiga e consolidada, o percentual é bem maior: nos EUA, por exemplo, o índice chega perto de 80%, segundo a PróGenéricos.

Os genéricos também acabaram se revelando uma exitosa política de incentivo à indústria nacional. Se, 15 anos atrás, o mercado era dominado pelas multinacionais do setor, atualmente metade das dez maiores empresas farmacêuticas que atuam no país são brasileiras. Todas elas produzem genéricos. Há, no total, 115 laboratórios fabricantes no país, segundo a Anvisa.

Instrumento fundamental para a disseminação dos genéricos é a participação do poder público no esclarecimento da população. Passados 15 anos, ainda são muitos os brasileiros que desconhecem a existência de alternativas mais baratas para seus tratamentos de saúde.

E muitos os que ainda desconfiam de sua eficácia. Informá-los é iniciativa de grande alcance social.

Ocorre que, há muitos anos, os genéricos passaram a ser relegados pelo governo federal e perderam prioridade na política de saúde petista. Por que será?

Será apenas por que foram adotados no Brasil à época do governo Fernando Henrique? Será por que os genéricos representaram um duro golpe, na forma de concorrência salutar, no poder de mercado dos grandes laboratórios farmacêuticos?

Fato é que, na era petista, o governo federal escanteou os genéricos. Nestes últimos 11 anos jamais se viu campanha de esclarecimento da população e de incentivo ao consumo de uma alternativa mais barata e igualmente eficaz de tratamento de saúde. Na realidade, o PT faz o
contrário: confunde a população.

No início do ano, a Anvisa anunciou que, agora, os medicamentos similares também poderão substituir os remédios de marca (ou “de referência”). Para tanto, terão de passar pelos mesmos testes que os genéricos e serão particularmente identificados na embalagem com um símbolo – igualzinho se fez com os genéricos.

A pergunta que fica é: por que, ao invés de criar uma nova categoria, o governo simplesmente não incentivou a transformação dos similares em genéricos, cobrando-lhes o mesmo rigor?

Mais: por que, nos últimos anos, o governo federal, por meio da Anvisa, simplesmente dificultou os registros de genéricos, tornando os procedimentos mais morosos e os trâmites mais demorados?

Contudo, à revelia das resistências de uma visão apequenada do que é servir a população, os medicamentos genéricos se impuseram e ajudaram milhões de brasileiros a ter um padrão de saúde mais digno e uma vida melhor. É raro quando se pode comemorar uma conquista tão importante para a população e inconcebível que algo tão positivo seja alvo de sabotagem.