O Governo do Estado de Mato Grosso do Sul tem tomado uma série de providências para reduzir o contágio do COVID-19, como a suspensão das aulas na rede estadual e a determinação de teletrabalho para serviços não essenciais – e olhando também para as populações mais vulneráveis, o governador Reinaldo Azambuja (PSDB), determinou a ampliação do programa Vale Renda, autorizou a compra de 60mil cestas básicas, isentou ICMS das conta de luz das famílias de baixa renda, suspendeu o vencimento das prestações dos contratos de programas habitacionais, isentou do pagamento quem tem a tarifa social de água, entre outras medidas; enfim, é preciso promover o isolamento social, mas também é preciso reduzir o impacto financeiro que essa pandemia já está trazendo para a economia estadual, especialmente para o setor produtivo, visando a continuidade da produção e a garantia do abastecimento.
Mato Grosso do Sul não está – como nenhum outro estado brasileiro – preparado para enfrentar a pandemia. O sistema de saúde, público ou privado, não está preparado. O SARS-COV-2 é uma novidade que tem assolado países por onde passa, impondo mais um desafio para as políticas públicas e colocando em risco a vida das mulheres, pelo contágio ou pela violência doméstica, que já é um fenômeno epidêmico há décadas disseminado no mundo todo, avançando na América Latina e no Brasil.
O Secretário de Governo e Gestão Estratégica de Mato Grosso do Sul, Eduardo Riedel, acertadamente, colocou três principais desafios para a gestão do executivo estadual em tempos de COVID-19: reduzir o contágio do coronavírus, aumentar a capacidade de atendimento médico-hospitalar e proteger empresas e empregos.
Nós tomamos a liberdade de acrescentar mais um desafio: a proteção às mulheres em tempos de pandemia.
Com um olhar na perspectiva de gênero, somos a maioria da população sul-mato-grossense e também a maioria das vítimas do COVID-19 no Estado: das 10 mortes registradas até o momento, 7 são mulheres.
O Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos do Governo Federal divulgou recentemente que houve um aumento de 9% aos chamados do Ligue 180, serviço de orientações e denúncias de violência contra a mulher, comparando-se a segunda quinzena do mês março com os primeiros quinze dias do mês – exatamente quando o isolamento social começou a ser adotado nos estados.
Em Mato Grosso do Sul, de janeiro a março, foram registrados 8 feminicídios consumados e aproximadamente 4.500 boletins de ocorrência por violência doméstica – comparando-se com o mesmo período do ano passado, constata-se uma redução de 4,3% – o que provavelmente se dá em razão da ordem de isolamento social, com restrição de mobilidade e toque de recolher em muitos municípios. Na segunda quinzena de março e primeira quinzena de abril, a queda no registro de boletins de ocorrência foi sentida em diversas Delegacias de Atendimento à Mulher, o que se pode atribuir, numa primeira análise, à suspensão do transporte público, ao fechamento do comércio, à suspensão das aulas e ao toque de recolher. Sem uma desculpa para sair de casa, a mulher permanece calada, convivendo com a violência.
Contrariando esses números, estima-se que com o isolamento social e com a permanência das mulheres em casa, ao lado de seus agressores, a violência doméstica aumente e gere uma demanda reprimida, seguindo a tendência já vivenciada em outros países: em Singapura, o aumento foi de 30%; na França, de 32% e na Austrália, de 40%. Com a presença de crianças em razão da suspensão das creches e aulas, aumentam também os riscos de acidentes como quedas, queimaduras, afogamentos e intoxicações – por isso, importante guardar remédios e produtos de limpeza em locais mais altos ou trancados, cuidar as brincadeiras com água e fogo e manter vigilância redobrada, especialmente com os bebês e crianças de tenra idade.
A quarentena está trazendo novos desafios para toda a sociedade: é certo que estamos ansiosas, apreensivas e angustiadas, com as emoções a flor da pele, sem saber ao certo o que está por vir; estamos reaprendendo a nos comunicar sem reunir com os amigos para a roda de tereré ou para o happy-hour do fim de tarde; estamos mais afetivas, estreitando o diálogo com familiares, prestando mais atenção no outro; mas também é certo que para muitas mulheres ficar em casa está sendo mais difícil e cruel – seja pela sobrecarga das atividades domésticas e cuidados do lar, seja pela violência sofrida, num momento em que é obrigada a permanecer em isolamento, longe da rede de apoio, de amigas e de familiares que poderiam socorrê-la – o que aumenta o poder do agressor e potencializa o controle do abusador sobre as vontades da mulher, aumentando também a intensidade das violências.
Considerando essa situação delicada e imprevisível, o Governo do Estado de Mato Grosso do Sul reforça e mensagem para o isolamento social, mas reafirma o compromisso com o enfrentamento a todas as formas de violência contra mulheres e meninas – e como alternativa para discussão dos direitos das mulheres e das políticas públicas de enfrentamento à violência, lançou o site www.naosecale.ms.gov.br disponibilizando informações e orientações, esperando atingir especialmente as mulheres e meninas em situação de violência, para que tenham acesso aos programas, projetos, ações e leis existentes; para que se informem sobre os serviços existentes na rede estadual de atendimento ou para que peçam ajuda pelo atendimento online, pois nem sempre será possível sair de casa ou usar o telefone para formalizar a denúncia.
O acesso ao site se dá por meio de computadores e celulares, alcançando as mulheres de todos os 79 municípios sul-mato-grossenses inclusive nos assentamentos, nas aldeias indígenas e nas comunidades quilombolas; para as mulheres com deficiência visual e auditiva, o site disponibiliza vídeos em libras sobre violência doméstica e a aba de acessibilidade faz áudio-narração com leitura de tela e amplia tamanho de fontes; para as mulheres indígenas, traz mensagem nas línguas guarani e terena, uma vez que o Estado concentra a segunda maior população indígena do país, sendo estas as populações das duas maiores etnias. A informação chega, portanto, às mulheres urbanas e rurais, contemplando-as em sua diversidade.
O Governo do Estado disponibilizou também um canal para recebimento de denúncias online, pelo site da Polícia Civil (www.pc.ms.gov.br), onde é possível registrar violência doméstica contra a mulher, mas também contra crianças e contra pessoas idosas – de modo que se a mulher não puder falar pelo telefone para ligar 180 ou acionar o 190 em caso de urgência e emergência, poderá silenciosamente registrar a denúncia e aguardar o contato por parte das autoridades da segurança pública.
Mas, como o acesso à internet não é um direito assegurado a todas as famílias, a Polícia Militar reforçou as rondas nos bairros e nas periferias, nos municípios de pequeno e médio porte e, através das visitas técnicas promovidas por policiais do PROMUSE – Programa Mulher Segura, intensificou a fiscalização das medidas protetivas, promovendo a prisão do agressor em caso de descumprimento.
Isolamento social sim, violência não! Acesse o site: www.naosecale.ms.gov.br. O Governo do Estado de Mato Grosso do Sul está ao seu lado na luta pelo fim do coronavírus e da violência doméstica.
Luciana Azambuja, advogada, subsecretária estadual de Políticas Públicas para Mulheres