Dilma Rousseff conseguiu produzir mais lambanças do que se poderia imaginar no périplo que fez por vários países mundo afora nos últimos dias. Foi a Davos e não cumpriu o prometido; em Lisboa, protagonizou uma escala ruidosa e caríssima para os cofres públicos e, em Cuba, deu aos companheiros, com dinheiro brasileiro, o que no Brasil seu governo não consegue entregar. Foram rolezinhos de amargar.
O escândalo da hora envolve a “escala técnica” que a presidente da República e sua numerosa comitiva fizeram na capital portuguesa entre sábado e domingo. Foram apenas 15 horas, mas suficientes para render muito pano para manga, em meio a diárias de hotéis luxuosos e caríssimos e rega-bofes em restaurantes estrelados.
Segundo a versão oficial, a escala em Lisboa fez-se necessária em função da insuficiente autonomia do avião presidencial para vencer, de um fôlego só, toda a distância entre a Suíça, de onde Dilma e sua comitiva partiram, e Cuba, onde continuaram sua agenda internacional nos braços da ditadura castrista. A outra opção, alega-se, seria enfrentar o atualmente instável clima americano e sua possibilidade de nevascas.
A parada em Portugal teria sido decidida na última hora e, por esta razão, foi omitida dos comunicados oficiais que rotineiramente informam a agenda da presidente da República. O Planalto só divulgou a passagem da presidente por Lisboa quando Dilma já havia partido de lá e estava voando para Havana, ou seja, só depois que a notícia vazara, sábado à tarde, no O Estado de S.Paulo.
Soube-se ontem, porém, que a escala lisboeta já estava nos planos oficiais pelo menos desde quinta-feira, quando o pessoal do governo brasileiro já avisara o gabinete português e também já providenciara reservas no restaurante Eleven, o único da cidade a ostentar estrelas em famosos guias mundiais de gastronomia.
Ou seja, a história, que começou com uma omissão, resvalou para uma mentira deslavada. As emendas só pioraram os sonetos. O governo petista terá agora chance de explicar o enrosco na Procuradoria-Geral da República e no Conselho de Ética da Presidência, conforme representações apresentadas ontem pelo PSDB.
O problema maior do episódio é a falta de transparência com que o gabinete presidencial trata assuntos de Estado. A agenda oficial de Dilma deve ser pública, porque envolve gastos públicos e, muitas vezes, interesses que devem ser públicos. Mas já se tornou tradicional nas gestões petistas impor sigilo ao que deveria ser obrigatoriamente de conhecimento dos cidadãos.
*Desde o ano passado, os gastos com as viagens presidenciais são tratados como segredos de Estado, protegidos por espessa confidencialidade. Por quê? Em geral, envolvem despesas altas, incorridas em hospedagens geralmente luxuosas e, muitas vezes, em procedimentos excessivos – em março do ano passado, por exemplo, o governo petista alugou 30 veículos da Rome Vip Limousine para que Dilma acompanhasse uma missa no Vaticano, informou O Globo.
O sigilo imposto aos gastos realizados nas viagens da presidente não nos permitirá saber, por exemplo, se o conforto de Dilma em Portugal custou mesmo R$ 27 mil, gastos na luxuosa suíte do Four Season Ritz. Não nos deixará averiguar por quanto saíram os 45 quartos ocupados pela comitiva presidencial na rápida estadia em Lisboa. Não nos possibilitará comprovar que o jantar no Eleven não foi mesmo pago com cartões corporativos, ou seja, com dinheiro público, como afiançou ontem a presidente.
Porta-vozes oficiais dizem hoje nos jornais que, vez ou outra, Dilma faz paradinhas fora do script simplesmente para tentar se livrar do assédio da imprensa e espairecer um pouco –foi assim em Granada em março e também em Marrakesh em dezembro de 2012. Por esta versão, não haveria nada de mal nisso. Há, sim!
Primeiro porque se trata de agendas de homens e mulheres públicas e que, portanto, devem ser de conhecimento público. Segundo porque envolvem gastos bancados por recursos públicos. Os rolezinhos das comitivas presidenciais costumam sair caro: paradas de Dilma em Atenas e Granada, além de preparativos para uma visita a Praga que acabou cancelada, custaram R$ 433 mil, mostra hoje a Folha de S.Paulo.
Se quer que seus rolezinhos não se transformem em escândalos, a presidente deveria tornar já transparentes, e ao alcance de qualquer consulta, os gastos que seus deslocamentos pelo mundo incorrem aos cofres públicos. Mas, se prefere viver sob o manto do sigilo, seu lugar só pode ser um: fora da vida pública.