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ÁGUAS DE MARÇO, por Nicias Ribeiro

Nicias Ribeiro 3“Águas de março”, é uma das mais belas canções de Tom Jobim e que foi gravada na voz da insuperável Elis Regina, cuja interpretação, sem dúvida, é espetacular e inesquecível, principalmente para os amantes da MPB – a música popular brasileira.

É evidente que, com este texto inicial, o eventual leitor deve estar imaginando que vamos tratar de MPB, neste artigo, quando na verdade vamos falar das águas de março, não dá música do Tom Jobim, mas sim das chuvas torrenciais que caem no mês de março em todo Brasil, especialmente na Amazônia e que, inexplicavelmente, não ocorre, com a mesma intensidade, nas nascentes dos rios que abastecem os reservatórios das hidrelétricas que integram o Sistema Sudeste/Centro-Oeste, que, a rigor, respondem por 70% da capacidade de geração elétrica em nosso País.

Aliás, para que se tenha idéia da gravidade da situação, a usina de Itumbiara no rio Parnaíba, por exemplo, está com apenas 16,2% de água armazenada em seu reservatório. Já a usina de Furnas, no Rio Grande, está com 32,9% de armazenamento. Lembrando que, mesmo em 2001, quando ocorreu o racionamento de energia, houve melhora no nível dos reservatórios nos primeiros meses do ano, diferentemente de 2014 que só faz baixar esses níveis, mesmo contando com o funcionamento das termoelétricas.

O estranho, é que enquanto falta chuva no Sudeste e Centro-Oeste, especialmente nas nascentes dos rios que abastecem os reservatórios das hidrelétricas daquelas regiões, na Amazônia há excesso delas e os seus rios transbordam as suas águas para além de suas margens, invadindo a floresta e as cidades.

É o que está ocorrendo no rio Madeira, cujos rios que lhe são tributários, rio acima, nascem nas encostas das Cordilheiras dos Andes, na Bolívia e Perú, e que recebem as águas do degelo e das chuvas. E quando o Madeira quer desaguar no alto rio Amazonas, onde é conhecido como Solimões, este está cheio e represa as águas no rio Madeira.

No momento atual, o Amazonas está represando apenas o rio Madeira e os rios de sua proximidade, onde está cheio agora. Não está represando, ainda o Tapajós, nem o Xingú e muito menos o Tocantins, fato que vai ocorrer em breve, quando as águas do Solimões baixarem. Enquanto isso, está cheio o médio rio Tapajós, o médio rio Xingú e o médio rio Tocantins. Aliás, quinta-feira passada, 07/03/2014, o reservatório da hidrelétrica de Tucuruí já atingia a cota de 73,88 metros, quase atingindo o alerta de segurança que é de 74 metros. A fora isso, a água que está chegando ao reservatório é de 27.404 metros cúbicos por segundo, o que leva a hidrelétrica de Tucuruí a abrir todas as suas comportas e lançar rio abaixo, pelo vertedouro, todo o excedente de água, inundando as partes baixas da cidade de Tucuruí.

É esse excedente de água, que é lançado rio abaixo e que inunda a cidade de Tucuruí, que a Eletronorte quer aproveitar para gerar energia numa terceira casa de força, o que aumentará a potência instalada da hidrelétrica de Tucuruí em mais 2.000 Mwatt, transformando-se quase numa outra Belo Monte, uma vez que passaria a ter 10.370 Mwatt de potencia.
Por outro lado, se já tivesse sido construída a hidrelétrica de Marabá, no alto rio Tocantins, acima de Marabá; bem como a hidrelétrica de Santa Izabel do Araguaia, de 1.800 Mwatt, em Palestina do Pará, por certo que esse excesso de água que o reservatório de Tucuruí não comporta, estaria sendo represado lá em cima, no rio Tocantins e no rio Araguaia, e ainda gerando energia.
Como se vê, se as hidrelétricas de Marabá e Santa Izabel do Araguaia já estivessem prontas, além de gerar energia, com o excedente das águas que vai para Tucuruí, evitar-se-ia a inundação de Marabá e Tucuruí. Agora, imaginem se o Tocantins não tivesse várias outras hidrelétricas rio acima. Será que o reservatório de Tucuruí suportaria o volume de água desse portentoso rio, num inverno rigoroso como este?

E mais, ainda, o médio Xingú também está cheio, transbordou e inundou grande parte da cidade de Altamira. E não se diga que é por causa de Belo Monte, até porque essa usina ainda não está pronta. O mesmo acontece em Itaituba, onde não há nenhuma hidrelétrica, ainda. São apenas as águas de março, nesta Amazônia abençoada.

Nicias Ribeiro é Secretário de Estado de Energia do Pará e Presidente do Fórum Nacional de Energia

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