Filha de agricultor, nascida no município de Carpina, na Zona da Mata Norte de Pernambuco, Judite Botafogo sempre acompanhou o pai nas empreitadas políticas. O velho Botafogo atuava como voluntário, movido pelo interesse em juntar os trabalhadores dos engenhos para votar naquele em que ele acreditava que mudaria a vida da cidade.
Dentre os doze filhos, Judite foi a primeira a se envolver com a política, mas antes rompeu todas as dificuldades para se tornar professora. Começou ensinando os trabalhadores do engenho e, em 1990, veio a primeira participação na linha de frente da política na luta pela emancipação do então distrito de Carpina, em Lagoa do Carro.
A participação efetiva em uma campanha política veio 1993 quando ajudou a eleger o primeiro prefeito de Lagoa. Com a experiência de secretária de Educação, em 1996, surgiu o convite para se candidatar à sucessão do então prefeito. Sob o lema “Com lápis ou caneta, voto na preta” – Judite entrou na briga não apenas para se eleger, mas no enfrentamento aos preconceitos por ser mulher e negra.
Disparada nas intenções de voto, virou alvo de manobras políticas que a forçaram sair da disputa e ser substituída pelo irmão, Manoel Botafogo, um homem simples, pedreiro, que mesmo há 13 anos fora da cidade conquistou a confiança da população e se elegeu prefeito. Em parceria com o irmão, à frente da secretaria de Governo e depois da gerência regional de Educação, Judite Botafogo chegou aonde queria: à prefeitura de sua terra natal, posto que disputa mais uma vez nas eleições municipais deste ano.
Nessa entrevista ao portal PSDB-PE, Judite Botafogo fala das muitas barreiras que as mulheres ainda enfrentam para se fazerem representadas politicamente. Hoje, quando se celebra os 84 anos do voto feminino no Brasil, ela acredita que se tem muito a comemorar, sim. O direito à voz, vez e voto conquistado pelas mulheres é um estímulo a se continuar lutando por um caminho que, acredita Judite, ser o único capaz de levar as mulheres a novas conquistas: o caminho da formação. Abaixo, íntegra da entrevista:
Portal PSDB-PE: 84 anos de voto feminino no Brasil, é uma data para se comemorar?
Judite Botafogo – Sim, sem dúvida. Nascemos numa sociedade patriarcal, onde o machismo predominou por centenas de anos. Comemorar 84 anos de direito ao voto, a vez, e a voz da mulher nos espaços de poder e decisão em diversas esferas é um ganho para a sociedade, considerando a importância da mulher nos cenários político, social e humano. E é também um estímulo a continuarmos lutando com a certeza de que essas barreiras não são intransponíveis.
Portal PSDB-PE – A baixíssima representatividade da mulher na política ainda se deve à falta de empenho dos partidos?
Judite Botafogo – Não só dos partidos, mas da sociedade em si, das barreiras criadas por muitos homens que ainda subestimam as mulheres e das desigualdades financeiras. O poder aquisitivo ainda impera nas mãos dos homens. As melhores posições no mercado de trabalho ainda são deles. Quando encontramos mulheres ousadas, que se dispõem a participar politicamente, isso causa grande admiração. É bem verdade que a posição e empenho dos partidos influem e muito no encorajamento das mulheres. É necessário investimento na formação política e não só chamá-las a participar. Já tivemos algumas conquistas, com muito esforço, claro: a lei de cotas, os 5% do fundo partidário, as inserções na propaganda eleitoral, são avanços consideráveis. Mas ainda é muito pouco, podemos mais.
Portal PSDB-PE – A primeira gestão presidencial feminina, marcada por políticas equivocadas da presidente Dilma Rousseff que levaram o país a viver uma grava crise política e econômica, abala a confiança do eleitorado no voto feminino?
Judite Botafogo – Em parte, sim. Escuto dizer: a mulher não sabe governar, é a vergonha do país, etc. É preciso estar atualizado politicamente para rebater esses argumentos. O problema não é a figura da mulher, e sim quem é a mulher, de onde ela veio, sua formação, o meio em que vive, os homens que a cercam, que a assessoram… Não podemos permitir que a imagem feminina seja maculada politicamente por essa referência que não nos representa. É bem verdade que por tudo isso que o Brasil vive, o desafio da mulher se tornou ainda maior. Mas temos nossa força, garra e bravura e vamos a luta!
Portal PSDB-PE – Como mulher, negra e pré-candidata a um cargo executivo nas eleições deste ano, como você é recebida pelos eleitores? Ainda há algum tipo de preconceito por uma dessas condições?
Judite Botafogo – Em meu município, minha história já é bastante familiar. Afinal, são mais de cinquenta anos de vivência. Mas não estou livre dos preconceitos e discriminações. Hoje, por exemplo, a maior barreira que enfrento é o vasto poder financeiro do atual gestor que, descaradamente, vem barganhando lideranças e ou aliados. E há aqueles que gritam nos quatro cantos da cidade: ela não vai ganhar por que não tem dinheiro. Esse é o desafio maior. Eu e os que me seguem precisamos ser contundentes contra esse tipo de prática para conscientizar as pessoas das consequências decorrentes dessa prática eleitoreira. Isso não é fácil, mas é necessário para a sobrevivência política dos bons costumes.
Portal PSDB-PE – O que poderia ser feito pelos partidos para animar o eleitor a votar mais nas mulheres? Essa é uma tarefa dos partidos ou as próprias mulheres deveriam adotar uma postura mais incisiva em defesa do voto feminino?
Judite Botafogo – De ambos. Dos partidos, porque eles detêm o tempo de rádio e TV, os fundos partidários que poderiam ser melhor distribuídos, o poder de negociação nos espaços de poder, etc. Mas também das mulheres porque elas precisam ter coragem para resistir às mudanças, não se renderem aos preconceitos e mostrarem que podem mais. Não se pode esquecer que a formação e a convivência social são decisivas nessas escolhas. Investir na formação das mulheres é o caminho.