29 de abril de 2005 (Ano I, Número 8)
Sem compostura – O presidente Lula perdeu o respeito pelo cargo que ocupa. Ao desrespeitar o cargo, deixou de se dar ao respeito. Mereceu, portanto, o festival de vulgaridades, deboche e revolta provocado por sua afirmação de que os juros são altos por culpa dos brasileiros, que se acomodam e “não tiram o traseiro da cadeira” para procurar bancos que cobrem taxas menores. Infantil em sua tentativa de transferir responsabilidades e grosseiro na forma, Lula mostra mais uma vez sua preocupante perda de contato com a realidade.
No país das maravilhas – Descolado há mais de duas décadas do cotidiano de um cidadão comum, mimado por seu partido e cercado de serviçais que resolvem os problemas do dia-a-dia, como pagar despesas e movimentar contas bancárias, Lula dá mostras de que vive em um mundo à parte. O Brasil dele é o das mordomias do poder. Seu governo atende aos companheiros do PT empregados em milhares de cargos de confiança. Banqueiros e grandes empresários continuam lucrando como sempre. Resta ao ex-líder sindical recorrer ao linguajar chulo para expor raciocínios primários e manter uma falsa identificação com a população mais humilde. Sem o discurso popularesco e despido do marketing do homem do povo que derrotou as elites, sobraria apenas o astuto político profissional, que há trinta anos deixou de ser operário e está feliz consigo mesmo por ter chegado onde chegou.
Lula não governa – Se de fato governasse, se despachasse diariamente com seus ministros, se lesse ao menos os resumos que sua equipe com certeza prepara sobre as ações de governo, não faria tantas declarações estapafúrdias de quem desconhece por completo questões básicas da administração pública. O despreparo e o desinteresse pela gestão do país fazem de Lula, hoje, pouco mais do que um relações públicas ou uma atração internacional sustentada pelo mito do operário-que-chegou-a-presidente. Com um projeto de governo e um ministério capaz de executá-lo, Lula poderia se dedicar em tempo integral a desempenhar esse papel de símbolo, sem maiores prejuízos ao país. Não é o caso. O governo não tem uma agenda. Ninguém sabe quais são suas prioridades. E o ator começa a acreditar que a personagem que interpreta é real.
Liderança e oba-oba – Ao descartar o script e improvisar suas falas – por achar que a intuição vale mais do que o conhecimento – Lula submete ministros e lideranças do PT no Congresso ao constrangimento permanente de ter que explicar, traduzir e consertar suas declarações impróprias, desastradas ou simplesmente erradas. Sem conseguir resultados convincentes e que atendam às expectativas populares criadas com sua eleição, Lula concentra seus esforços na obsessão de ser reconhecido como o grande líder dos pobres do mundo. Um suposto sucesso internacional compensaria as promessas não cumpridas e a mediocridade de seu governo e lhe daria discurso para sustentar o único projeto que ele e o PT parecem ter – o da reeleição em 2006.
Erro de cálculo – A estratégia tem tudo para dar errado. Com os juros na estratosfera, a economia crescendo menos e gerando menos empregos, o governo só tende a piorar. Não é razoável supor que o eleitor se dará por satisfeito em ter um presidente que corre o mundo e faz discursos vazios. As pesquisas de opinião mais recentes são unânimes em apontar a perda de popularidade de Lula. Há descontentamento crescente quanto ao desempenho do governo.
Avaliação em queda – A alardeada preocupação com os mais pobres não se traduz em ações efetivas. Pesquisa do Instituto Sensus, feita em abril para a Confederação Nacional dos Transportes, mostra que houve uma queda acentuada na avaliação sobre saúde, redução da pobreza e combate à violência. Para 44,9% dos eleitores, o atendimento à saúde piorou, nos últimos seis meses; apenas 22,7% acham que melhorou. A pobreza aumentou, na opinião de 64,6% dos entrevistados, e caiu para 8,1%. Cerca de 85% acreditam que a violência está maior e somente 4,3%, que diminuiu.
Discurso e prática – A realidade teima em contradizer os discursos presidenciais. Lula é bom de palanque. Mas o que ele diz é o contrário do que o governo dele faz. E cada vez mais gente começa a perceber isso. Lula está traindo os pobres que depositaram nele suas esperanças.