Não há, na letra fria da lei, razões para Aécio Neves estar afastado do Senado. Menos ainda justificativa para que ele seja preso, ao arrepio do que garante a Constituição do país
A Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal (STF) tem hoje uma importante decisão a tomar. A partir do que deliberarem os cinco ministros que a compõem, saberemos se continua valendo o que estabelece a nossa Constituição ou se estará aberta a porta para o cometimento de abusos contra direitos resguardados na lei magna.
O que estará em debate hoje é o pedido de prisão preventiva do senador Aécio Neves, feito pela Procuradoria-Geral da República (PGR).
Na mesma ocasião, os ministros vão se pronunciar sobre solicitação feita pela defesa do parlamentar para revogação da suspensão do exercício de seu mandato, determinada pelo ministro Edson Fachin há um mês.
Não há, na letra fria da lei, razões para Aécio estar afastado do Senado. Menos ainda, e este é ponto que merece maior atenção, justificativa para que ele seja preso.
Um parlamentar só pode ser preso em caso de flagrante e por crime inafiançável, conforme prevê o artigo 53 da Constituição.
Não é o caso do senador por Minas. As acusações que pesam contra ele são de corrupção passiva e tentativa de obstrução de Justiça. Nenhuma delas comprovada em fatos.
A base da acusação é uma gravação forjada por um criminoso que confessou nada menos que 240 condutas criminosas, que seriam capazes de lhe render mais de 2 mil anos de cadeia, mas foi premiado com liberdade e anistia total pela mesma PGR que ora acusa Aécio.
Mesmo aquela conversa não configura crime, muito menos flagrante. Nela, o senador tucano não trata de contrapartidas na forma de benefícios públicos, desvio de dinheiro do erário ou interferência indevida em decisões de governo. O diálogo teve caráter estritamente privado.
Ainda mais abusivo é acusar Aécio de obstrução de Justiça. Isso porque a base de tais acusações da PGR nada mais são do que atos, opiniões, palavras e votos inerentes ao exercício de mandato legislativo.
É a Constituição Federal que resguarda ao parlamentar o direito à livre manifestação, até como forma de garantir a não interferência e a superposição de um poder ao outro.
Na sua acusação, a PGR exorbita ao sustentar que é possível “flexibilizar” a proteção constitucional conferida aos parlamentares no exercício de mandato. É de se questionar: até onde estamos dispostos a ir em nome de uma vaga moralizadora que não admite limites nem na lei magna do país?
O julgamento desta tarde desperta interesse não apenas pelo objeto da matéria, mas, sobretudo, pelas consequências que a decisão dos cinco ministros que compõem a Primeira Turma do STF terá sobre a vida democrática do país.
A manutenção das sanções ao senador Aécio Neves e até sua eventual prisão, como insiste em pedir a Procuradoria-Geral da República, ou de qualquer parlamentar em idênticas circunstâncias, configura afronta direta e grave à Constituição Federal, ao princípio da separação dos poderes e ao sistema de freios e contrapesos, característicos do Estado de direito brasileiro.
Esse abuso não pode prosperar.