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Do que nos livrou o Proer

Em clima de campanha eleitoral os candidatos que usarem o Proer para acusar o atual governo de ter ¥distribuído dinheiro para banqueiros¥ devem antes olhar para o que acontece hoje na Argentina e não se enfiar na própria armadilha de imaginar que o eleitor é burro, bobo, desinformado, ignorante e pode ser engrambelado por bandeiras políticas falsas e oportunistas. Causam repulsa e indignação as imagens dramáticas da tragédia argentina, de aposentados, jovens, mulheres, crianças, pobres e ricos todos os dias enfileirados em frente a agências bancárias, com bolsos vazios e dinheiro preso no banco. Em casa falta comida; no banco, a conta bloqueda.

É possível um país viver sem bancos? O que significa a perda de confiança da sociedade no sistema bancário? Na Argentina de hoje os banqueiros contam pouco, ou quase nada. O que conta mesmo é saber como conseguir dinheiro, porque os bancos faliram, estão desacreditados, são odiados, de lá não sai nada mesmo. E são eles que movimentam as operações financeiras da economia.

Não se trata de uma empresa qualquer, por trás deles há milhões de depositantes, pagamentos de serviços, operações de crédito, aplicações de poupança, trabalhadores recebendo salários, velhinhos com suas aposentadorias. É responsabilidade dos governos fiscalizá-los com rigor, garantir à população um sistema bancário saudável e suprimir ao máximo os riscos de calote no público.

Em proporção menor do que Argentina, é claro, o Brasil correu riscos reais de ter seu sistema bancário desacreditado e viver uma crise de graves dimensões. Foi em 1995, quando o Plano Real desarmou a mentira dos números e fez explodir rombos em três grandes bancos de varejo, onde gestões fraudulentas esconderam-se durante muitos anos sob o manto protetor da inflação descontrolada. Econômico, Nacional e Bamerindus guardavam dinheiro de milhares de depositantes, intermediavam operações entre milhares de empresas. Se quebrassem arrastavam junto centenas de milhares de brasileiros que neles confiaram e, da noite para o dia, perderiam seu dinheiro. Como na tragédia argentina.

¥O risco de contaminação da perda de confiança ficou claro depois da intervenção no Econômico, em agosto de 1995, quando passaram a acontecer graves perdas de depósitos em diversos outros bancos onde havia rumores de problemas. O sistema bancário passou a ser hostilizado e rejeitado pela sociedade¥, conta Gustavo Loyola, que presidiu o Banco Central nas crises dos três bancos de varejo. Preocupado com o crescimento da reação negativa do público, Loyola convocou para uma reunião, em São Paulo os principais banqueiros privados do País. Expôs a gravidade da situação, o risco do descrédito nos bancos e propôs que comprassem o Econômico para evitar o pior. Ouviu como resposta: deixa quebrar. ¥Tudo bem. Se é assim, vou abrir o mercado para bancos estrangeiros¥, devolveu Loyola. E começou a trabalhar nas regras da abertura, que viriam em seguida.

Em novembro de 95 o BC descobriu o rombo no Nacional. Era preciso fazer algo capaz de recuperar a confiança da população nos bancos, algo que evitasse ondas de saques de depósitos. Do contrário, o País viveria situações imprevisíveis, fora de controle. O BC já havia negociado com os bancos a criação de um fundo garantidor de crédito, que cobria riscos de depósitos até um limite equivalente a US$ 20 mil. Mas, com o surgimento do caso Nacional, isto mostrou-se insuficiente para convencer as pessoas a manter seu dinheiro nos bancos.

Foi quando o governo decidiu criar o Proer. Era novembro de 1995. ¥Cometemos dois erros na condução do Proer¥, lembra hoje Loyola. ¥O primeiro, de não ter envolvido o Congresso na sua aprovação. O aval do Legislativo aplacaria contestações políticas. Aliás, quem me alertou disso foi um deputado petista, o Luís Gushiken, de São Paulo.¥ Mas a situação de emergência exigia urgência e o programa foi criado por um ato do Executivo. ¥O segundo erro foi de comunicação, não soubemos explicar para a população que o Proer era inevitável¥, faz hoje Loyola o mea-culpa.

No vácuo da falha na comunicação, a oposição soube esbanjar oportunismo político, repetindo que ¥o Proer distribuiu dinheiro público para banqueiros¥. Esses políticos sabem muito bem que o dinheiro depositado nos bancos não pertence aos banqueiros, mas aos milhares de depositantes, que ali mantêm contas bancárias. Muito antes de o banco quebrar – esteja certo, leitor – o dinheiro do banqueiro já cruzou fronteiras, está protegido em algum paraíso fiscal. Mas os depositantes jamais verão a cor do seu. Como no drama vivido hoje pelos argentinos.

O Proer custou aos cofres públicos R$ 12,8 bilhões, mas nenhum depositante foi prejudicado, a onda de saques parou e a confiança nos bancos foi restabelecida. A CPI criada no Congresso, recentemente concluiu que o Proer evitou o pior e não encontrou nenhum registro de irregularidades. Certamente ele seria tragicamente aceito e entendido se o governo deixasse o Econômico quebrar e seus milhares de depositantes assistissem passivamente a seu dinheiro sumir da noite para o dia. A tragédia dessas pessoas certamente contaminaria o País. Aí a oposição acusaria o governo de omissão e cobraria a criação do Proer.

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