O Ministério do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Turismo (MDIC) consolidou os números de importações e exportações do complexo eletrônico, um dos itens mais sensíveis da balança comercial do País, e chegou a uma conclusão surpreendente. Nos três primeiros meses deste ano, o déficit setorial foi reduzido em US$ 1,2 bilhão, o que é um pouco mais do que todo o superávit comercial do País acumulado no período. De janeiro a março, as importações do complexo eletrônico foram de US$ 723 milhões, em comparação com US$ 1,919 bilhão no mesmo período de 2001. Isso não ocorreu por acaso, segundo o secretário-executivo do MDIC, Benjamin Sicsú.
¥Desde que a Lei de Informática foi promulgada pelo presidente da República, em setembro, há uma clara inversão da tendência de déficit no setor¥, diz Sicsú, para quem a vinculação entre uma coisa e outra é inseparável. ¥A certeza de que a lei entraria em vigor fez as empresas repensarem sua atuação.¥ O texto havia sido votado pelo Congresso em janeiro de 2001, ficou no limbo até setembro e, mesmo depois de promulgado, só em janeiro os projetos de enquadramento das empresas foram concluídos.
No vácuo, quando houve uma insistente briga entre a Zona Franca de Manaus e São Paulo em torno da regulamentação da lei, além da ameaça, afinal abortada, de uma liberação radical das importações de bens de informática, algumas multinacionais cogitaram cancelar seus investimentos no País. ¥Mas, desde que o presidente da República mandou implementar a lei, o humor no setor mudou¥, diz Sicsú. Ainda nesse período de vácuo legal, sem a lei e com uma tarifa de importação de apenas 2% – para equalizar as demais regiões do País com Manaus -, houve uma enxurrada de importações. Só entre janeiro e setembro de 2001, foram importados US$ 2,8 bilhões pelo segmento de telecomunicações, ou 33% de tudo o que o complexo eletrônico importou em 2001. As empresas estavam motivadas pela demanda aquecida das operadoras de telefonia, empenhadas em antecipar as metas de expansão do sistema, previstas nos contratos com a Anatel. ¥Com a lei, é inegável que houve uma acomodação, ao mesmo tempo em que avançou a substituição de importações no setor¥, afirma Sicsú.
No auge das importações, entre junho e setembro de 2001, a média móvel mensal das compras externas do complexo eletrônico ficou ligeiramente acima de US$ 820 milhões (ver gráfico). A partir daí, desce a curva das importações, mantêm-se estáveis as exportações e diminuem os rombos na balança. A média móvel do saldo negativo do setor, superior a US$ 600 milhões por mês, em setembro de 2001, caiu para US$ 550 milhões em novembro e vai ficar entre US$ 400 milhões e US$ 450 milhões no fim deste ano, prevê o secretário-executivo do Ministério do Desenvolvimento. ¥O importante é que a tendência, agora, é de diminuição gradativa do déficit.¥
Consistência – O secretário-executivo da Câmara de Comércio Exterior (Camex), Roberto Giannetti da Fonseca, reconhece o fato e não tem dúvidas: a Lei de Informática, diz ele, está possibilitando uma substituição competitiva de importações. Tal fato resulta de novos investimentos no setor, principalmente em peças e componentes que integram a cadeia produtiva. ¥Isso vem ocorrendo especialmente nos produtos mais dinâmicos, como o celular e os informatizados¥, aponta Giannetti. São inúmeros os exemplos de novos projetos e expansão da produção tanto no pólo de Manaus como no Sudeste brasileiro, diz ele. ¥Com isso, as exportações estão aumentando e as importações, diminuindo.¥
Um fato que se destaca nos números consolidados pelo MDIC é que as exportações do setor, embora ainda pequenas, vêm subindo consistentemente.
¥As importações explodiram, agora estão caindo, mas desde 1999 as exportações dobraram de tamanho¥, lembra Sicsú. Em números: a média móvel mensal das vendas externas, que era de US$ 100 milhões, está hoje em US$ 200 milhões. O que vem ocorrendo no setor de eletroeletrônicos é, na definição de Giannetti, ¥muito nítido¥ de como boas políticas setoriais devem se combinar com a busca do equilíbrio macroeconômico. ¥Também acontece fenômeno parecido no setor automotivo¥, completa.
Alguns argumentam, porém, que os megadéficits só não estão ocorrendo porque a indústria de equipamentos e as empresas de telecomunicações arrefeceram o ritmo de importações. Meia verdade, segundo Sicsú. ¥É só ver o que ocorre em informática, onde há uma importante substituição de importações em cinescópios para TVs e monitores de vídeo¥, afirma Sicsú. ¥Passamos em poucos anos de importações de US$ 500 milhões para exportações de US$ 200 milhões.¥
Mais importante, diz o secretário-executivo do MDIC, é olhar para a frente.
¥Com a Lei de Informática, vamos direcionar o novo boom de compra de equipamentos de telecomunicações, que deve começar em julho ou agosto, para fabricantes locais¥, explica. Com a infra-estrutura estabelecida, o próximo lance das operadoras será agregar valor a elas. Novos equipamentos serão necessários para oferecer os chamados serviços inteligentes, como caixa postal e chamada em espera.
Ajustes – O governo, explica Sicsú, não está parado aguardando esta nova onda de compras. ¥Faremos ajustes nas alíquotas de importação para estimular a montagem local dos equipamentos.¥ A gama de produtos não é extensa: cinco ou seis, no máximo, para fazer mudanças e reorientação de sinais múltiplos e complexos (são os multiplexadores e roteadores). ¥Temos mais de dez projetos aprovados de PPB (Processo Produtivo Básico) de empresas voltadas para esses equipamentos¥, completa Sicsú.
Ajuda também na redução do déficit o fato de que os chips vêm mudando no mundo todo. Estão ficando mais complexos, com softwares embarcados (os chamados SoCs – System on a Chip), sem que os preços aumentem muito. ¥Um chip faz a função de três¥, resume Sicsú.
¥O fato, comprovado matematicamente, é que a lei mostrou de maneira prática como uma boa política industrial setorial traz benefícios horizontais: na balança comercial, no emprego e ajuda no equilíbrio macroeconômico.¥
Contribuiu para tanto, diz Giannetti, a sintonia entre o MDIC e a Camex, hoje. ¥Há uma perfeita integração, não há dispersão de esforços.¥ Assim, acrescenta, é possível que a política para comércio exterior ande junto com a política industrial.