O Ministério da Educação inicia amanhã mais uma campanha Tempo de Leitura – Vamos fazer do Brasil um país de leitores.
A grande novidade neste ano é o projeto Literatura em Minha Casa: a distribuição, para 8,5 milhões de alunos de quarta e quinta séries do ensino fundamental, de 61 milhões de livros que compõem coleções com títulos de autores brasileiros, de gêneros diversos -conto, poesia, romance e teatro, além de uma obra clássica da literatura universal. Esses livros serão de propriedade dos alunos, que poderão levá-los às suas casas, emprestá-los, trocá-los com seus colegas, iniciando assim uma vida de companheirismo com os livros.
Em que momento de nossa história a escola pública pôde desfrutar de semelhante atendimento? Quando autores puderam dispor de tão numeroso e promissor público?
O objetivo da campanha que se inicia é implementar ações de incentivo ao hábito de ler, estimulando atividades dentro e fora da escola. Os professores e diretores de escolas públicas foram incentivados a convidar escritores, contadores de história, pais e personalidades para que, junto com os alunos, promovam atividades diversas que intensifiquem a prática de leitura.
A leitura é fundamental para que a pessoa desenvolva o raciocínio, sua capacidade de pensar e argumentar. Quanto mais o aluno lê, mais domínio tem sobre o texto escrito. Até há pouco tempo, a escola brasileira, mesmo a pública, tinha como clientela a população das camadas altas e médias mais escolarizadas. Assim, boa parte do estímulo à leitura, bem como do acesso à literatura, fazia-se mais no âmbito dos outros círculos da convivência social -especialmente a família- que no ambiente escolar. E muito pouco se fazia em favor do restante da população, em sua maioria precocemente evadida ou excluída da escola.
O grande desafio da escola pública brasileira, uma vez atingida a universalização do atendimento à população em idade escolar, é o de definir ações, currículos e programas capazes de efetivamente atingir os novos alunos, majoritariamente oriundos das camadas populares.
É para esse novo público que o Ministério da Educação destina, para além dos livros didáticos e dicionários distribuídos gratuitamente, os livros do Programa Nacional Biblioteca da Escola. As bibliotecas de escolas públicas foram contempladas, inicialmente, com dois acervos distintos -um deles de literatura infanto-juvenil-, para viabilizar uma diversificação das fontes de informação utilizadas nas escolas públicas, possibilitando o acesso a obras necessárias à formação de leitores.
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O trabalho pela qualidade do ensino passa pelo hábito da leitura. Toda a sociedade deve participar ——————————————————————————–
Foram colocadas bibliotecas em 56 mil escolas públicas do país. Entre os autores, Machado de Assis, José Lins do Rego, Érico Veríssimo, Graciliano Ramos, Antonio Callado, Ana Maria Machado, Ruth Rocha e muitos outros, além de grandes historiadores, como Sérgio Buarque de Holanda, Raymundo Faoro e José Murilo de Carvalho. Todos os municípios foram beneficiados com pelo menos um acervo, totalizando mais de 8 milhões de livros.
É também às demandas desse mesmo público que os Parâmetros Curriculares Nacionais, no que diz respeito à organização de currículos, pretendem atender. Trazem perspectivas inovadoras e, no âmbito da educação pública nacional, inéditas, tanto para a leitura quanto para a literatura. Não se trata mais de deixar a leitura e a experiência com o texto literário por conta da família e de sua herança cultural. Trata-se de garantir ao aluno o direito à leitura e a um contato pessoal com a especificidade do texto literário.
Os Parâmetros Curriculares de Língua Portuguesa reconhecem a necessidade de trabalhar na escola com uma gama variada de textos, representativos da heterogeneidade da nossa cultura. Isso quer dizer que as escolas devem prever, em seu projeto pedagógico e em sua organização curricular, um lugar e um tratamento especiais para a leitura e a literatura.
Essas iniciativas propiciaram o surgimento de inovações na forma de tratar a literatura nas escolas do país. Como a que vem fazendo uma escola de São Fidélis (RJ), ao emprestar as obras literárias de sua biblioteca à comunidade. Quem quiser ler vai à escola, faz o cadastro e pega o livro emprestado. Outro exemplo é o da Secretaria de Educação do Rio Grande do Sul, que repassa recursos para a aquisição de mais livros, enriquecendo o acervo de obras para alunos, professores e a comunidade.
No Município de Itaberaba (BA) ainda há pouca oferta de literatura, mas isso não desanima os munícipes. Os professores aproveitam viagens de amigos a Feira de Santana e Salvador para comprar livros a fim de incrementar sua biblioteca e disponibilizá-los a seus alunos. Nasceu, dessa forma, o Festival de Leitura dos alunos do ensino médio de Itaberaba.
O trabalho pela qualidade do ensino passa pelo hábito da leitura. Toda a sociedade deve participar. A mãe de família que dedica algumas horas a contar histórias para as crianças na escola do seu bairro está contribuindo para o gosto e a capacidade de leitura tanto quanto o especialista que colaborou na definição da área de linguagem dos Parâmetros Curriculares.
Convidamos os diretores e professores para transformarem essas ações em efetivos instrumentos pedagógicos. Assim poderemos lograr, de fato, levar nossos alunos ao prazer do texto e ao entendimento do que a literatura pode significar para a escola e para a cultura.
Paulo Renato Souza, 56, economista, é ministro da Educação. Foi reitor da Unicamp de 1986 a 1990 e secretário da Educação do Estado de São Paulo (governo Montoro).