PSDB – PE

Turgot e nós

Muito antes de entrar no governo, em 1986, li esse texto que Turgot escrevera a Luiz XVI, quando convidado para ser seu ministro das Finanças. Encontrei-o, recentemente, repassando anotações e cópias de artigos lidos na minha época de USP: ¥… nesta oportunidade, Majestade, limito-me a lembrar-lhe esses três itens: evitar inadimplência; evitar aumento de impostos; evitar empréstimos. Para conseguir esses três objetivos só há um meio: reduzir os gastos aquém da receita e suficientemente abaixo para assegurar, a cada ano, um saldo a ser aplicado na amortização dos débitos já existentes.¥

Mais atual impossível! Tanto para o Brasil como para a Argentina, como para União Européia, como para qualquer outro país do mundo.

Deveríamos, com esse texto, ser capazes de convencer da disciplina fiscal os adversários, estruturais ou circunstanciais, e quem sabe também os ideologicamente comprometidos com a indisciplina. Mostrando-lhes que a responsabilidade nessa área sempre foi necessária. Se não por outras razões, foi e é necessária pelo fato de a sociedade sempre pagar a conta de qualquer desajuste. Quando muito, na História, os governos pagaram contas políticas dos desajustes fiscais.

Sempre foi assim mas não precisa continuar sendo. Estamos, no Brasil, vivendo uma excepcional mudança de comportamento dos governantes e da sociedade que cobra mais responsabilidade e que, cada vez mais, entende o significado que esses desajustes têm para si. Nesse ponto, temos razões para sermos – e sou um deles – otimistas.

Um ano se passou da sanção da Lei de Responsabilidade Fiscal, mas ainda temos de continuar trabalhando para completar essa mudança de comportamento. Nos dois lados: o da sociedade e o dos governantes, incluindo, evidentemente, as casas legislativas e o Judiciário dos três níveis de governo.

Exemplos claros do que ainda temos de trabalhar – formando opinião pública no sentindo da mudança – são vistos todos os dias. Diariamente, vemos as mesmas pessoas ou grupo de pessoas (sociais, setoriais ou regionais) defendendo propostas contraditórias. De um lado, fala-se de redução da carga tributária (por exemplo, a correção da tabela do IRPF); de elevação de renúncias (incentivos regionais ou setoriais); de isenção de contribuições para determinados cidadãos (por exemplo, inativos do setor público). De outro lado, defende-se o aumento dos gastos (para pessoal, para salário-mínimo etc.) ou a sua manutenção, além do limite possível!

Dessa forma, o ¥idiota da objetividade orçamentária¥, que pensa estar defendendo a sociedade mantendo a disciplina e resistindo às pressões populistas, vê-se acusado de praticar ¥terrorismo orçamentário¥.

Tenho dito que, mantida a carga tributária, temos de ¥suplementar o PIB¥, antes de suplementar as dotações orçamentárias. Tenho dito que, se queremos gastar mais, temos de combinar com os contribuintes, com a sociedade. O dinheiro não vai sair do bolso do presidente da República, nem do ministro da Fazenda, nem do ministro do Planejamento.

A discussão do Orçamento geral da União para 2002, que ora se inicia, tem de ser pautada por esses limites. Não pelos desejos, pelas vontades, pelas incoerências ou pela irresponsabilidade. Apesar de todos os avanços econômicos, sociais, culturais e tecnológicos, o mundo de hoje, nesse sentido, é igual ao mundo de Turgot.

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