*Editorial do jornal O Estado de S. Paulo deste sábado (6/5)
A Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania (CCJ) da Câmara dos Deputados aprovou, na quarta-feira passada, a proposta de reforma política de autoria dos senadores Aécio Neves (MG) e Ricardo Ferraço (ES), ambos do PSDB. O placar foi contundente: 37 votos a favor e 14 contrários.
A Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 282/16, aprovada pelo Senado no final do ano passado, estabelece a chamada cláusula de desempenho, se possível para valer já para a eleição do ano que vem, e acaba com as coligações de partidos políticos para as eleições proporcionais – deputados (federais, estaduais e distritais) e vereadores – a partir de 2020.
Cabe agora ao presidente da Câmara, deputado Rodrigo Maia (DEM-RJ), criar uma comissão especial para analisar o mérito da proposta, antes de seu envio ao plenário.
A proposta precisa ser aprovada na Câmara dos Deputados por 3/5 dos parlamentares, em dois turnos de votação.
Sua aprovação pela CCJ da Câmara foi o primeiro passo, naquela Casa legislativa, na direção do saneamento do sistema político-partidário brasileiro, amplamente fragmentado e custoso.
É fato que o projeto em questão trata apenas de duas das muitas medidas que precisam ser implementadas para que distorções do sistema político-partidário, acumuladas em décadas, possam ser corrigidas.
Mas a cláusula de desempenho e o fim das coligações partidárias para as eleições proporcionais são precisamente as duas medidas que figuram como as mais urgentes nos diagnósticos feitos por especialistas que têm se debruçado sobre o tema da reforma política.
Pela proposta, a partir de 2018, apenas os partidos que obtiverem 2% dos votos válidos em pelo menos 14 Estados terão direito aos recursos do Fundo Partidário, à propaganda eleitoral nas redes de rádio e televisão e ao uso da estrutura funcional da Câmara e do Senado.
A partir de 2022, a linha de corte sobe para 3% dos votos válidos, também distribuídos em pelo menos 14 Estados, com um mínimo de 2% dos votos válidos em cada um deles.
A cláusula de desempenho não é uma novidade no nosso sistema eleitoral.
A Lei 9.096/95 já estabelecia o índice mínimo de votos para que os partidos pudessem ter direito ao funcionamento parlamentar, mas o Supremo Tribunal Federal (STF) declarou a inconstitucionalidade dessa regra em 2006, o que levou os senadores a propor a emenda à Constituição agora em exame.
Evidentemente, num contexto em que muitos partidos tendem a se aproximar mais de uma organização empresarial, tendo como objetivo a arrecadação de recursos financeiros e não o legítimo meio de representação política de segmentos da sociedade, a aprovação da proposta pela CCJ recebeu críticas.
“A consequência prática dessa PEC é restringir a atuação partidária para apenas 11 legendas. O fundamento da Constituição é justamente o pluralismo político”, argumentou o deputado Rubens Pereira Júnior (PCdoB-MA).
Com 35 partidos em funcionamento e mais 57 aguardando homologação pelo Tribunal Superior Eleitoral, difícil será explicar ao contribuinte que financia a farra partidária onde há espaço no espectro ideológico para tanto “pluralismo político”.
Não menos importante será o fim das coligações partidárias em eleições proporcionais.
Grande parte da frustração e do desalento dos eleitores diante da pobreza da atual representação congressual advém justamente dos parlamentares que chegam ao Congresso eleitos a reboque de candidatos que, estes sim, receberam votações mais expressivas.
Graças às coligações, o eleitor pode eleger um candidato, embora tenha votado em outro.
Não é por acaso que hoje tanto se fala em uma profunda crise de representatividade.
A PEC 282/16 não extingue partidos políticos ou impede que setores da sociedade se organizem em novas legendas partidárias, se assim lhes aprouver.
A emenda à Constituição apenas dará o peso de lei a uma obviedade: um partido político legítimo, para funcionar efetivamente no Parlamento, precisa ser respaldado pelos votos daqueles que pretende representar.