A inscrição de Luís Gonzaga Pinto da Gama, um dos mais importantes abolicionistas brasileiros, entre os quadros da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), cerca de 133 anos após a sua morte, vai além da homenagem e do reconhecimento da sua obra humana: é o resgate da história de um dos personagens brasileiros mais importantes, tanto pelo seu legado de enfrentamento à escravidão, como pelo seu exemplo pessoal de superação e persistência.
É uma experiência de vida que vale ser lembrada. Gama foi vendido aos 10 anos de idade pelo seu próprio pai, um fidalgo português, após sua mãe, Luiza Mahin, — uma escrava livre — ser exilada por participar diretamente de várias revoltas e levantes ocorridos em Salvador, entre elas, a Revolta dos Malês, mobilização de escravos de origem islâmica que ocorreu na Bahia em 1835. O movimento, audaciosamente, tinha como plano tomar o governo, por fim ao catolicismo e assassinar e confiscar os bens de todos os brancos e mulatos.
Escravo, foi levado para o Rio de Janeiro e posteriormente para São Paulo. Aprendeu a ler e a escrever aos 17 anos. Filho de mãe livre, Luís sabia que sua escravidão era ilegal e resolveu fugir. Serviu ao Exército por seis anos.
Tentou freqüentar o curso da Faculdade de Direito do Largo do São Francisco, hoje da Universidade de São Paulo (USP), em 1850. Por ser negro, entretanto, foi impedido, mas continuou freqüentando as aulas como ouvinte. Com o conhecimento que adquiriu, conquistou judicialmente a sua própria liberdade. Apesar de ser um rábula (como eram chamados quem exercia a advocacia sem ser advogado), atuou na defesa jurídica de negros escravos, conseguindo alforriar mais de 500.
Ele foi um dos percussores da imprensa humorística paulistana ao fundar, em 1864, o jornal “Diabo Coxo”. Anos depois, montou o jornal Radical Paulistano, em 1869, junto com Rui Barbosa, grande intelectual do seu tempo.
As muitas batalhas que Luis Gama travou em sua vida — tendo passado, inclusive, pelo cativeiro — não o fez esmorecer. Pelo contrário; o enfrentamento a toda sorte de opressão fez dele um dos raros intelectuais negros do seu tempo, atuando como poeta, advogado e jornalista. E é justamente esse espírito de luta e perseverança que faz de Luís Gama um dos principais personagens da luta contra a escravidão e o preconceito. É com essa mesma postura que devemos encarar o preconceito racial ainda vigente no Brasil de hoje.
Luís Gama está entre os cinco maiores personagens históricos que mais admiro. Com este texto, também presto aqui a minha homenagem.