O ato em defesa da Petrobras poderia ser replicado na Venezuela como um ato em defesa do PDVSA. Mas há uma grande diferença. Até que se prove o contrário, na Venezuela, a justiça e o ministério público não são livres para investigar e punir. Quem acredita em independência de poderes na Venezuela deve acreditar que coelhos começam a falar na páscoa e que existem duendes no Polo Norte fabricando brinquedos para o Natal.
Dito isso, o que me impressiona no ato de defesa da Petrobras é a tentativa rudimentar de esconder o uso da empresa por partidos politicos que deveriam estar, se inocentes, indignados com o uso politico que se fez da empresa. Se não estão é porque participaram ativamente do desvios de recursos públicos.
Se isso aconteceu antes de 2003 não entendo porque a direção da Petrobras que mudou, em 2003,não abriu sindicâncias internas e não pediu ajuda ao Ministério Público para investigar e punir os eventuais mal feitores que atuavam na estatal antes de 2003. Será que a partir de 2003 se deu uma nova dimensão a cobrança de propinas, tornando sistêmico algo que seria antes desvios de alguns? Não sei. Tudo isso merece ser investigado e um ato real em defesa da Petrobras deveria buscar a verdade e a punição dos culpados dentro e fora da empresa.
Mas o ato em defesa da Petrobras pareceu muito mais uma manifestação contra os tradicionais ‘fantasmas’ da elite que querem privatizar a empresa ou acabar com a soberania nacional. Um cortina de fumaça para esconder pessoas e partidos que usaram politicamente a empresa e que para salva-la poderá ser necessário mais um empréstimo bilionário do Tesouro (e logo aumento da divida bruta) com a nota paga por todos nós. Leiam aqui essa excelente coluna do colunista da Veja, Geraldo Samor, sobre o assunto.
O que me impressiona é ‘intelectuais’ entrarem nesta canoa furada. A defesa da Petrobras de ontem capitaneada por um partido politico diretamente envolvido nas denuncias de corrupção é o mesmo tipo de defesa a favor da democracia pelo Presidente Maduro e simpatizantes, na Venezuela, quando são as ações do próprio presidente Maduro o maior ato contra a democracia no seu país.
Sendo justo com a Petrobras e com o Brasil, corrupção existe em todos os países do mundo e é difícil encontrar uma empresa grande que não tenha alguns ou vários casos do que poderiam ser classificado como “corrupção”. Mas o que impressiona na Petrobras, além da relação espúria de partidos políticos com empreiteiras, é a extensão e a longevidade dos desvios de recursos públicos.
Em nenhum lugar do mundo é comum um funcionário do terceiro escalão de uma empresa grande devolver US$ 100 milhões de uma hora para outra. Digo mais. É impossível que apenas poucos funcionários estejam envolvidos. Nenhum diretor individual tem o poder de determinar projetos bilionários em uma grande empresa como a Petrobras que tem um Departamento Jurídico que olha as minúcias dos contratos.
Lembro de um projeto de pequisa que o IPEA fez com a Petrobras que levou mais de um ano para que o jurídico do IPEA e da Petrobras finalmente dessem o OK para assinatura. Foram dezenas de reuniões e viagens para que o contrato fosse aprovado pelos dois departamentos jurídicos. Se isso vale para um contrato que deve ter sido de pouco mais de R$ 2 milhões, o que podemos esperar de um projeto de R$ 10 bilhões ou mais? um contrato dessa magnitude deve ter passado por vários pareceres técnicos e jurídicos e nas mãos de diversas pessoas. Hoje está claro que a má gestão da empresa era uma forma planejada de promover desvios de recursos públicos.
Quem deveria de fato tomar à frente na defesa da Petrobras são os funcionários da empresa. Eles devem saber de diversas histórias de corredor ou do cafezinho que podem ajudar a Polícia Federal e o Ministério Público no processo de investigação e de salvamento da empresa. Mas não é isso que se viu ontem. Ao contrário, a defesa da Petrobras foi liderada por um ex-presidente da República que, na melhor das hipótese, foi apenas negligente.
A Petrobras está manchada bem como a imagem do Brasil. Investidores falam abertamente da “corrupção” no Brasil, muitos perguntam sobre a possibilidade de um impeachment, outros não enxergam atitudes fortes do governo para salvar a empresa e a incerteza sobre o destino da Petrobras vai contaminando diversas empresas e os esforços da nova equipe econômica para melhorar o horizonte de planejamento do setor privado.
Não se enganem. A situação é muito grave e a solução “mais fácil” para salvar a Petrobras e com uma nova mega empréstimo do Tesouro, o que significa deixar todos nós mais pobres (mais divida hoje significa mais carga tributária amanhã). O governo começou muito mal e ainda estamos em Fevereiro de 2015.