Discussões em torno da importância do planejamento e da capacidade de gestão dos governos tendem a ser consideradas áridas e distantes dos interesses da população. No entanto, são cruciais e a atual crise do sistema de energia é um exemplo concreto da falta que fazem ao país.
A semana começa sem resposta para mais um apagão que deixou às escuras 6 milhões de pessoas em 13 estados brasileiros.
Para efeito de análise de conjuntura, mais importante que o fator pontual, específico, que justifique a interrupção, é constatar a evidente vulnerabilidade do sistema, exposto à pressão das altas temperaturas registradas, ao declínio dos níveis dos reservatórios e à alta do consumo.
A demanda média do período está 8% acima das previsões feitas pelo Operador Nacional do Sistema Elétrico. Para se ter uma ideia mais clara do quadro, 75% da nossa produção energética vêm de fonte hidráulica e os reservatórios do Sudeste/Centro-Oeste terminarão
fevereiro com menos de 40% da capacidade.
Não pode ser simplesmente negligenciado ou reduzido a uma mera coincidência o fato de que, na terça-feira, o Sul atingiu seu recorde de carga apenas três minutos antes da falha no sistema de transmissão que causou o apagão.
Sintoma que expõe, em princípio, a hipótese de estar começando a haver desequilíbrio estrutural entre a capacidade de oferta e a demanda de energia no país, que o governo, a todo custo, tenta descartar, fazendo piadas diversionistas com descargas elétricas, ou sugerindo mais terceirização de responsabilidades.
Como parece ser menos provável que haja problema de geração, tudo converge para uma eventual precariedade das linhas de transmissão. Mais de dois terços das que estão em construção sofrem atrasos (média de 13,5 meses) e pode estar havendo investimento muito menor que o previsto na manutenção, em face da atabalhoada mudança de regulação, que provocou incertezas, desconfianças e -quem sabe- até um investimento menor que o necessário.
Poderíamos estar contando com os parques eólicos para compensar os problemas no segmento hidroelétrico. Infelizmente isso também não é possível, porque simplesmente não foram concluídas até hoje as respectivas linhas de transmissão.
Para o governo, o espaço para manobras vai se reduzindo e restam poucas alternativas: se reajustar tarifas, alimenta a inflação; se subsidiar ainda mais o custo, amplia o deficit nas contas públicas.
No geral, são erros imperdoáveis, para quem passou praticamente uma década inteira à frente do sistema energético nacional, advogando a excelência da gestão.
A realidade sempre cobra o seu preço. Pena que, mais uma vez, a conta pelo improviso seja paga pelos brasileiros.
*Aécio Neves é presidente nacional do PSDB, senador, foi governador de Minas Gerais e deputado federal
*Artigo publicado na Folha de S. Paulo – 10-02-2014