Gustavo Franco: O Brasil está correndo sérios riscos com a inflação

Ele alerta que “a economia está super-aquecida, por conta de excessos fiscais, e defende ações imediatas

Acompanhe - 29/04/2011

Ele alerta que “a economia está super-aquecida, por conta de excessos fiscais, e defende ações imediatas

Brasília (29) – Não há qualquer dúvida de que o Brasil está correndo “sérios riscos” em relação à inflação. A advertência é do ex-presidente do Banco Central e um dos formuladores do Plano Real, Gustavo Franco, que esperava, do novo governo, “uma iniciativa mais contundente” para domar o aumento de preços. Mas, ao contrário do que se esperava, ele diz que “paramos no tempo” e o que se tem visto é “muito silêncio”.

Em entrevista ao site do PSDB Nacional, Franco é mais uma voz a defender a “contração da despesa pública” na luta para conter a inflação pois, como lembra,  os custos econômicos e sociais derivados do descontrole inflacionário são “monumentais”.

1. A palavra inflação tinha sido esquecida pelos brasileiros. Muitos jovens sequer sabiam o que é aumento constante de preços. Em menos de 100 dias do governo Dilma a inflação não só reaparece como assusta a população. De quem é a culpa? Qual é ( ou são ) o motivo da inflação brasileira?

O ressurgimento da inflação preocupa pois nunca se poderá saber como um organismo como o nosso, traumatizado com essa experiência, irá reagir a novos “estímulos”. A inflação elevada ficou para trás, mas ainda existe uma memória vaga, e presente nos contratos e nas regras de indexação, que pode transformar este pequeno flerte com a inflação em um problema mais sério do que as autoridades parecem acreditar. Não há dúvida que estamos correndo riscos sérios nesse assunto.

2. O Brasil vive um retrocesso? O País não deveria estar discutindo outras coisas como as reformas, por exemplo?

Durante os primeiros 100 dias deste governo não houve nenhuma iniciativa contundente, nenhuma novidade, nada do que costuma acontecer no começo de uma nova administração, onde o novo líder aproveita este período de graça para definir sua marca, sua visão estratégica e sua percepção sobre o futuro das políticas públicas. Vimos, ao contrário, muito silêncio e muito esforço para que nada se modificasse relativamente ao que se passava. Com isso, paramos no tempo, como se estivéssemos com tudo em ordem, o que está longe de ser o caso.

3. Até há pouco tanto a presidente, quanto o ministro da Fazenda, Guido Mantega, atribuíam a alta dos preços a  fatores externos/globais. Eles demoraram a enxergar a aceleração da demanda interna?

Os fatores externos são favoráveis: os preços das nossas exportações nunca foram tão bons. Mas a percepção oficial é a de que isso é má notícia, pois produz inflação, especialmente se o governo se esforça para manter o câmbio semi-fixo. A economia está super-aquecida, e por conta de excessos fiscais, e será preciso lidar com este problema sem demora.
4. Qual o risco maior: conviver com a inflação crescente ou reduzir o crescimento? O ministro diz que não se pode matar a galinha dos ovos de ouro. Existe galinha dos ovos de ouro com inflação?

Acho correta a preocupação do ministro, mas não há almoço grátis, ou seja, as galinhas não colocam ovos de ouro. Para construirmos um crescimento elevado e sustentável é preciso haver contração da despesa pública – de consumo e de investimento – e não aumento, de modo a trazer para o processo o setor privado, que é o protagonista desse enredo.

5. Existe um “custo Dilma” na inflação por conta do aumento dos gastos do governo no período eleitoral?

Sim, os gastos aumentaram por conta do processo eleitoral, é o fenômeno conhecido como “ciclo político”, que se observa em vários países. Consta, todavia, que neste figurino, os gastos se contraem pesadamente no início de governo. E isso até agora não aconteceu. Declarações aconteceram, mas nada mais que isso.

6. As medidas adotadas até agora, como o aumento das taxas de juros, isolam o perigo da inflação no médio prazo, como espera o governo?

As opiniões divergem quanto à dosagem. O fato é que, mais uma vez, a política monetária terá que trabalhar em dobro para compensar o fato de que a política fiscal está turvada por excessos.

7. Qual o custo econômico e social da inflação para o País?

É monumental, pois a inflação é a marca de uma civilização que ainda não deixamos para trás por inteiro e que se caracteriza pela esperteza, pela idéia de “levar vantagem em tudo”, pela socialização de custos de privilégios concedidos a poucos, pela falta de ética na condução das políticas públicas, tudo isso sintetizado pelo fato de o governo não caber dentro de seus próprios limites.

8. O senhor teve alguma surpresa com a decisão do governo petista de privatizar os aeroportos?

Nenhuma. Há anos que se observa o mesmo padrão: as boas idéias não são deles, e são as que funcionam.

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29/04/2011